A inteligência humana não vem pronta. Ela é construída. Como? Quando um bebê, com dez meses, olha para um objeto, agarra-o, leva-o à boca, chacoalha-o, bate com ele na mesa, joga-o ao chão para saber o que é, como funciona e que efeitos produz, seu cérebro organiza respostas mediante conexões neuronais com as quais ele não nasceu. Com dois anos de idade, já construiu capacidades – noção de objeto, espaço, tempo e relação causal – de enorme complexidade, com as quais tornou-se capaz de simbolizar: brincar de faz de conta, imitar na ausência do modelo, constituir imagem mental e, na extensão delas, falar. Esse processo tem início com o nascimento e, por volta dos 15/16 anos, já permitiu a construção de instrumentos cerebrais/mentais com os quais se torna capaz de ingressar na vida adulta. Tudo na dependência do entorno, físico ou social.
Freud disse que educar é uma profissão impossível. Se educar é ajudar a construir conhecimento – a capacidade fundamental dos humanos para viver neste mundo globalizado – e construir conhecimento é fornecer condições para que o cérebro crie organizações cada vez mais complexas, para resolver problemas sempre mais complexos, os educadores, sejam eles pais, professores ou outros, enfrentarão a impossível tarefa de educar. Por que impossível? Piaget responderia que é impossível porque depende de duas condições: das capacidades já construídas até o momento e do desejo de aprender. Se o sujeito não construiu capacidades pertinentes, ele não sentirá necessidade de aprender determinado conteúdo. Ninguém consegue ensinar para quem não construiu capacidades para aprender; ou, o que dá no mesmo, ninguém consegue ensinar um conteúdo para quem não sente necessidade de aprendê-lo.
Vigora a crença de que para aprender basta ensinar. A respeito, Piaget já lembrava que a criança pequena ignora soberbamente as mensagens verbais dos adultos. Essa crença perversa produz resultados ainda mais perversos; confira-se o currículo do Ensino Médio. Está congestionado de disciplinas e de conteúdos, impossíveis de serem aprendidos com as capacidades até então construídas e com o tempo destinado à sua aprendizagem. Tudo isso porque se pensa que é suficiente ensinar para aprender.
Pode-se dar 100 aulas de aritmética para um chimpanzé que ele não vai aprender a somar; dar 200 aulas para uma criança de três anos e ela não saberá subtrair. Faltam, a ambos, capacidades cerebrais; o primeiro nunca
a terá, a segunda poderá construí-la. E isso não é apenas questão de maturação, como se costuma pensar.
Se a autonomia é o objetivo maior da escola, e a adolescência é o período crítico para construí-la, o Ensino Médio precisa urgentemente enxugar seu currículo e mudar seus procedimentos. Feynman, ganhador de Nobel, ao visitar o Brasil, surpreendeu-se com o tamanho do currículo de Física que, segundo ele, era o maior que já tinha visto; surpreendeu-se também com o pouco conhecimento de Física dos estudantes brasileiros. O caminho é transformar a escola num grande laboratório e diminuir o auditório. O adolescente deve ir à escola para trabalhar e não para se entediar com aulas cujos conteúdos e práticas não o ajudam a viver o seu tempo. Insisto, mais laboratório e menos auditório.