Uma vez, apresentei um evento que tinha como estrela principal o então presidente Lula. Era a inauguração de uma fábrica perto de Porto Alegre. Cheguei cedo, passei pelo credenciamento, pelo controle de segurança, me colaram um adesivo que dava direito a circular pelos bastidores.
Desde que entrei, fui marcado sob pressão por um diplomata do Itamaraty. Ele transmitia uma série de recomendações. E as repetia. De novo. E de novo.
Lula estava no auge da sua popularidade. Seria o último a entrar no palco. Todo o resto era aquecimento. O diplomata insistia: "Espere eu lhe dar o sinal." Escutei a orientação umas cinco ou seis vezes. "O presidente só vai entrar depois que você chamar, não se preocupe."
Acostumado com eventos, me dei conta de que o timing estava desencontrado. Me sentia inseguro.
Chegou a hora. O diplomata ali, me olhando e olhando para a antessala, onde Lula protagonizava o seu show particular. Com o canto do olho, eu via o presidente cercado por um bolo de gente. Uma espécie de santo milagreiro, distribuindo bênçãos e usando o toque como poder de cura.
Eu vi Lula saindo do bolo, caminhando. Olhei para o diplomata. Ele me olhava. E nada do sinal. De repente, uma explosão de aplausos. Lula havia subido ao palco. Abanava e sacudia os braços. E eu ali, com cara de tacho. Olhei para o diplomata. Sua expressão era a de quem tentava disfarçar uma certa vergonha. Fui para o improviso e berrei. "Com vocês, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva." A gritaria da multidão era tanta, que ninguém ouviu. E ninguém notou.
Ele era o presidente. Ele era o cara.
Ele era instinto, poder e glória. Os olhos de todos estavam fixos em uma única direção. Na dele. O mundo poderia estar caindo em volta.
Ninguém notaria.