Ganha contornos emocionais indesejáveis o debate em torno do tratamento para câncer por meio da fosfoetanolamina sintética. Desenvolvida por pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP), a substância tem sua eficácia questionada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), por não ter vencido todas as etapas necessárias para ser reconhecida como medicamento. É compreensível que pacientes e familiares procurem apostar em todas as alternativas disponíveis para enfrentar a doença. Os profissionais da medicina, porém, têm o dever de alertar para os riscos de produtos anunciados como "milagrosos".
A polêmica criada em torno da droga, cujos efeitos colaterais sequer são conhecidos, evidencia também os equívocos da judicialização da medicina. Ao conceder liminar para pacientes interessados em usar a substância, o Judiciário complicou ainda mais o debate. Obrigada a produzir uma substância ilegal e a distribuí-la para o tratamento de doentes, a USP alega não ter condições de atender à demanda. Mas o primeiro erro foi da própria universidade, que perdeu o controle sobre seu laboratório e sobre seus pesquisadores.
A história recente demonstra o quanto o açodamento na liberação de drogas para uso em seres humanos, sem o cumprimento de etapas rígidas, acabou muitas vezes provocando efeitos desastrosos. Pacientes em busca de cura têm todo o direito de tentar tratamentos experimentais, submetendo-se aos respectivos protocolos. Mas é preocupante quando leigos bem ou mal-intencionados interferem numa área que exige profundo conhecimento específico.