Pelo menos seis pessoas são investigadas no Rio Grande do Sul por envolvimento direto na fraude do financiamento do Programa Nacional de Desenvolvimento da Agricultura Familiar (Pronaf). Em comum, todas tiveram incompatibilidade entre rendimentos declarados e a movimentação financeira.
Segundo o relatório da Polícia Federal, todos receberam dinheiro da Aspac, embora não tenham exercido nenhuma atividade remunerada entre 2007 e 2012, período de andamento da suposta fraude.
Em um dos casos, uma investigada teve movimentação financeira mais de 320 vezes superior ao total de seus rendimentos, quando movimentou R$ 147.173,00 a débito. Ela teve rendimentos de apenas R$ 458,00.
A suspeita de fraude começou a ser investigada em Santa Cruz do Sul porque produtores rurais procuraram a PF e o Ministério Público para dizer que não haviam autorizado empréstimos do Pronaf em seus nomes e que tinham assinado papéis em branco que ficaram na Aspac.
O inquérito revela que dinheiro liberado na forma de empréstimos do Pronaf contraídos no Banco do Brasil em nome de produtores rurais entrou nas contas de uma associação de Santa Cruz do Sul, e de lá seguiu para contas pessoais de dirigentes e ex-dirigentes da entidade. Em seguida houve saques em espécie e transferências para outras contas.
Entre os investigados no inquérito da Polícia Federal estão o vereador de Santa Cruz do Sul Wilson Rabuske (PT) e a esposa dele. Segundo o laudo, o vereador recebeu R$ 700 mil e a mulher outros R$ 324 mil em recursos da Associação Santacruzense de Agricultores Camponeses (Aspac).
O advogado que representa Rabuske e a associação afirmou que o valor na conta de Wilson e da esposa é na verdade uma espécie de devolução de empréstimos a agricultores. Isso porque, Luiz Pedro Swarovsky disse que a associação, o vereador e simpatizantes do Movimento dos Pequenos Agricultores, por muitas vezes, adiantaram dinheiro aos produtores."Foram ressarcimentos de valores que ele adiantava, não só ele, para viabilizar a manutenção da associação", disse.
Outro investigado e o ex-presidente da Aspac, Irineu Perci Roberto Shuster, que recebeu R$ 89 mil entre julho de 2009 e agosto de 2012. Além deles, pelo menos outras três pessoas são investigadas, entre elas um candidato a vereador na cidade de Sinimbu.
A investigação resultou em um inquérito que passou a tramitar no Supremo Tribunal Federal (STF) por ter indícios do suposto envolvimento do deputado federal reeleito em 2014 pelo PT, Elvino Bohn Gass, que tem foro privilegiado.
Em uma das gravações telefônicas interceptados pela PF, um dos funcionários da Aspac afirma que o dinheiro desviado foi usado em camapnhas e cita Bohn Gass. O deputado se manifestou por meio de uma nota oficial, onde diz que ainda não teve acesso aos documentos oficiais, mas que sempre trabalhou para ajudar os agricultores. "Nunca sequer cogitei uma coisa dessas, muito menos que minha ajuda pudesse servir para encobrir o que quer que seja".
O ex-ministro do Desenvolvimento Agrário, Pepe Vargas (PT) também é citado nas gravações. Em uma ligação entre Bohn Gass e o vereador Rabuske, o deputado cita uma reunião com o ministro onde trataria da renegociação da dívida dos pequenos agricultores.
Pepe Vargas afirmou que as reuniões são comuns em Brasília. "É muito comum que deputados, porfeitos, movimentos de pequenos agricultores, procurarem os ministros para a renegociação de dívidas. Conheço o Deputado Elvino Bohn Gass. Tenho muita confiança nele e não acredito que ele esteja envolvido nesse esquema", afirmou.
A Polícia Federal ainda apura possível participação de servidores de agências do Banco do Brasil. Eles seriam responsáveis pela análise e autorização dos contratos com pequenos agricultores intermediados pela Aspac. Os profissionais são quatro ex-gerentes do banco em Santa Cruz do Sul, dois ex-gerentes e um auxiliar de uma agência de Sinimbu.
Leia a nota divulgada por Elvino Bohn Gass
"Procurador-geral da República do Brasil, Rodrigo Janot
Conheço profundamente as dificuldades do campo. Sou filho de agricultores familiares. Tornei-me sindicalista rural (anos 80) muito por conta da vontade de transformar esta realidade. Por isso, também, nos quatro mandatos parlamentares como deputado estadual e federal mantive a agricultura familiar como eixo prioritário.
Neste universo, o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar – Pronaf, é a mais abrangente política pública de suporte a esta atividade. Portanto, deve ser preservado, fortalecido e não pode ser fraudado ou destruído.
Sou mandatado para defender a agricultura familiar onde financiamento e crédito - o que inclui renegociação de dívidas - são pautas históricas presentes em todas as reivindicações anuais das representações de agricultores.
A busca por soluções para garantir a renda e a qualidade de vida dos trabalhadores rurais é, portanto, um trabalho que faço há quase 40 anos! E nada, absolutamente nada que possa ter outra finalidade, terá de mim qualquer respaldo. Muito menos o enriquecimento ou o financiamento de campanhas eleitorais.
Fui eleito pelo povo. É meu dever defender os interesses desse povo. Assim, talvez, eu devesse ser criticado por NÃO cumprir o meu dever, jamais por fazê-lo.
FUMO/ENDIVIDAMENTO
Nestas décadas de luta, tomei conhecimento de centenas de casos em que a propriedade familiar se inviabilizou por conta das dívidas. E, sim, ouvi relatos de situações que levaram até a suicídios.
Na região de Santa Cruz do Sul, há décadas se fazem investigações e muitos e vastos estudos científicos sobre esta questão. Estudei vários destes trabalhos e pude verificar que o preço pago aos fumicultores é, historicamente, baixo; e que há hipóteses fortes que ganharam até mesmo a sustentação de trabalhos da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, dando conta de que o uso intensivo de venenos na cultura do fumo, mais precisamente dos organofosforados, tem como consequência a depressão, causa maior dos suicídios segundo apontam estes mesmos estudos.
Para enfrentar estas duas questões - endividamento e uso de venenos – tenho lutado pela mudança do critério de preço para os fumicultores e contra o uso abusivo de agrotóxicos. Por isso, sofro uma fortíssima oposição das indústrias fumageiras. Agora mesmo, em Brasília, fui relator e dei parecer favorável ao projeto do deputado Assis do Couto que tenta, mais uma vez, garantir a presença do agricultor na hora da classificação do fumo. Outra medida que visa garantir direitos aos produtores de fumo é o projeto que tramita em Brasília e que trata de oferecer segurança aos trabalhadores rurais que atuam na condição de integrados.
Esperamos votar e aprovar estas medidas, em que pese o poderoso lobby das indústrias.
Por que defendemos estes direitos? Ora, justamente para que o agricultor seja melhor remunerado. Por isso, tenho certeza de que os colonos sabem quem, verdadeiramente, os defende.
RENEGOCIAÇÃO DE DÍVIDAS
As transcrições que surgem na investigação só comprovam o meu trabalho a favor dos colonos. Na única vez em que minha voz aparece, estou falando justamente disso, de renegociação de dívidas.
Só nos anos de 2013/14, foram oito (8) medidas – Decretos, Resoluções e Medidas Provisórias – que trataram da renegociação de dívidas e que beneficiaram MAIS DE 2 MILHÕES E 760 MIL CONTRATOS DE AGRICULTORES FAMILIARES NO BRASIL INTEIRO.
Tratei sobre renegociação de dívidas como fiz com outros inúmeros agricultores ou seus representantes, seja do MPA, da Fetag, da Contag, da Fretaf. Da mesma forma como fazem os que representam a agricultura empresarial.
E repito o que já manifestei: continuarei lutando pela renegociação de dívidas de agricultores sempre que isto for justo e necessário. Neste sentido, busco estabelecer a relação mais direta possível com quem está na lavoura, para fundamentar minha ação parlamentar. E me assessoro de pessoas ligadas aos trabalhadores e suas entidades.
INVESTIGAÇÕES
Nestes estranhíssimos vazamentos seletivos à imprensa, sempre às vésperas do 1º e 2º turno, há, ainda, uma outra menção ao meu nome. São terceiros, um deles sequer identificado, que emitem opiniões, inclusive sobre meu caráter e comportamento. Não há qualquer concretude, absolutamente nenhuma prova, sequer um indício consistente que possa me vincular a irregularidades supostamente cometidas. Seja pela Aspac ou pelo Movimento dos Pequenos Agricultores.
Todas as minhas prestações de contas da campanha são públicas. A de 2010, que como as demais foi aprovada, sofreu rastreamento nota por nota nesta investigação. Nada foi localizado de irregular. E nunca será. Por que não há.
CONCLUSÃO
Não tenho envolvimento com nenhum ilícito e repudio todo e qualquer ato que possa prejudicar o homem ou a mulher do campo.
Defendo a apuração rigorosa de toda e qualquer irregularidade e, a estas alturas, o maior interessado na transparência desta investigação sou eu.
Sobre isso, quero manifestar algumas estranhezas: primeiro, em relação à nítida má intencionalidade, o direcionamento e, mais grave, a evidente manifestação política a que se presta esta investigação às vésperas de uma eleição.
Nada devo, nada temo. Mas sofro a dor da suspeição que se joga contra mim e que persiste mesmo após a análise minuciosa dos fatos realizada pelo senhor Procurador-geral da República do Brasil, Rodrigo Janot , cuja conclusão foi: “Não foi demonstrado pela autoridade representante (delegado), NENHUM ELEMENTO CONCRETO MINIMAMENTE RAZOÁVEL a justificar a medida de busca e apreensão tanto na residência do deputado ora investigado como, mais grave ainda, dentro do Parlamento brasileiro, no gabinete do congressista.”
Ainda assim, mesmo não havendo quaisquer elementos “minimamente razoáveis”, a tônica dos vazamentos e suas posteriores divulgações faz crer que o principal alvo sou eu. E reitero: não há razão concreta para que assim seja. O conjunto de procedimentos beira, portanto, a irresponsabilidade.
AGRADECIMENTO
Dirijo-me, por fim, aos meus amigos e minhas amigas, companheiros e companheiras, militantes e especialmente os homens e mulheres da agricultura familiar.
É dolorosa a suspeição. Ainda mais por que ela se lança sobre um trabalho que consome horas, dias, anos, décadas. O que está sendo posto em dúvida é o esforço, a dedicação, o respeito e o amor que nutro pelas coisas da agricultura familiar.
Estranho, sim, e muito, que a cada vez que se realiza uma eleição, se levantem suspeições que, depois, jamais de confirmam. Mas, por óbvio, sempre causam algum prejuízo eleitoral e um enorme desgaste pessoal e de imagem. Mesmo assim, a confiança que tenho no agricultor tem sido, sempre, retribuída por ele. E, apesar das difamações, aumento minha votação.
Por isso, apesar de tudo, quero dizer-lhes: muito obrigado."