Em entrevista ao programa Gaúcha Atualidade, da Rádio Gaúcha, na manhã desta quarta-feira (6), o economista e professor da Universidade George Whasington, Mauricio Moura, analisou o resultado das eleições nos Estados Unidos e projetou o que esperar de Donald Trump, eleito para ocupar a Casa Branca pelos próximos quatro anos.
O republicano volta a comandar a maior potência militar do planeta após um hiato de quatro anos. Ele derrotou a atual vice-presidente Kamala Harris.
Confira a entrevista
Foi um resultado mais rápido do que se esperava e com uma ampla vantagem de Donald Trump, não?
Comparando 2020 com 2024, claramente Donald Trump conseguiu melhorar o desempenho dele entre eleitores latinos, por exemplo, mas o que mais se destaca é que os democratas não conseguiram repetir a coalizão de 2020. Então, a gente teve um avanço do Trump, sem dúvida, mas a vantagem se explica muito pelo desempenho ruim dos democratas.
A partir de agora, o que a eleição pode impactar em relação a negócios com o Brasil?
O Brasil tem de se preocupar com as tarifas, porque o Brasil é um exportador para os Estados Unidos. O Brasil tem de se preocupar com a pressão do dólar, porque se aumentar o juro nos Estados Unidos em função de pressão inflacionária, vai ter pressão no câmbio brasileiro. Além disso, o governo brasileiro tem de se preocupar com o tensionamento da relação dos Estados Unidos de Donald Trump com a China, porque o Brasil é parceiro comercial da China, então assim, são várias preocupações que o Brasil vai ter de ter.
Qual o tamanho dessa vitória para um candidato que foi derrotado na tentativa de reeleição e que agora tentou de novo, teve uma condenação no meio desse caminho, teve várias polêmicas ao longo da campanha? Qual é o tamanho da volta por cima que a gente está falando?
É enorme, sobretudo do ponto de vista de narrativa política, né, ele sofreu 91 processos aí, é o primeiro presidente eleito condenado da história, então, na verdade, mostra a resiliência política do Donald Trump e também retrata a insatisfação dos eleitores com o governo atual. Desta forma mantém-se a máxima de que governos com um avaliação ruim não são reeleitos e não fazem sucessores. Acho que pesou muito a avaliação negativa do governo Joe Biden que se deve muito em função da economia, da inflação.
Qual é o peso de Joe Biden ter primeiro tentado a reeleição e depois se mostrado um candidato incapaz da continuidade e renunciado mesmo depois de dizer que não renunciaria? Kamala Harris entrou tarde demais neste jogo eleitoral ou mesmo que ela tivesse começado cedo, ela não teria chance de vitória?
Bom, nunca saberemos porque ela não começou cedo, mas a história ensina, né, a gente teve dois candidatos democratas que entraram aos 48 do segundo tempo na disputa, então em 1968, o vice-presidente na época, o Hubert Humphrey, perdeu do Richard Nixon também, um resultado bastante significativo para o republicano e agora a Kamala Harris repetiu a história, entrou na última hora e também perdeu para os republicanos. No entanto, com a avaliação do Biden na casa de 40%, pesou demais no resultado.
A entrevista na íntegra
Hoje nós estamos tendo já uma movimentação muito intensa no mercado financeiro mundial, tem o Trump Trade, como é chamado, e isso está acontecendo em cima de perspectivas de aplicação, de cumprimento das propostas, das promessas de Trump durante a campanha como taxação de importação, desregulamentação do mercado de criptomoedas, qual é a perspectiva de que essas promessas efetivamente sejam aplicadas?
Eu acredito que a questão das tarifas é algo que passa muito pela caneta do presidente, ele pode gerar tarifas com ordem executiva, mas também alguns acordos comerciais que vão precisar do Congresso. Ele fala que vai baixar imposto. A gente vê o mercado animado com o Trump porque o Trump é um cara que vai baixar imposto para a empresa, vai desregular. Por outro lado, o mercado, olhando a curva de juros aumentando em função da expectativa de que as medidas do Trump sejam inflacionárias, seja pelo rombo maior no déficit fiscal, com redução de impostos, seja com sobretaxa de importações, o que tende a elevar preços. Dito isso também, é importante dizer que nos primeiros seis meses do governo ele vai surfar uma inflação controlada, juros caindo, enfim, e ele vai dar uma situação bem melhor do que o meio de mandato do governo Biden.
Uma das principais promessas de Donald Trump, ou talvez eu devesse dizer ameaças, diz respeito à deportação dos imigrantes ilegais, mas a gente sabe o quanto os Estados Unidos são dependentes dos imigrantes para a realização dessas tarefas que os americanos não gostam de fazer, não querem fazer. Até que ponto o senhor acredita que de fato haverá uma deportação em massa e também até que ponto se pode imaginar que ele dará continuidade àquele projeto que era do outro mandato de construção do muro, que acabou ficando pela metade?
Acho que não chegou a 5% da construção do muro, mas essa questão da deportação em massa é uma questão bastante retórica, mas a prática dela é bastante complexa, ninguém sabe como é que isso vai se realizar, mas suponha que ele consiga fazer uma deportação em massa, ele vai botar mais pressão no mercado de trabalho, vai ter restrição de oferta de trabalhadores. Quando tem restrição de oferta de trabalhadores, o que acontece? Os preços sobem também, então é mais um elemento de pressão inflacionária. Eu tenho dúvidas qual é a materialidade de fazer uma deportação em massa na prática.
Em relação à guerra da Ucrânia, por exemplo, que impacto pode ter a vitória de Trump no desfecho do conflito?
Bom, o Trump falou isso de novo, falou isso hoje no primeiro discurso. Então a gente vai ver se ele vai acabar com a guerra da Ucrânia em um dia, mas o que está claro, obviamente está no plano de governo deles, é acabar com a ajuda financeira à Ucrânia. Então a gente pode já aguardar que a Europa vai ter de se virar para a Ucrânia, se eles quiserem manter o apoio financeiro, o apoio militar, porque claramente, e não é só a Ucrânia, o Trump também disse que não vai ajudar Taiwan, caso Taiwan sofra uma invasão da China. Então, vamos aguardar para ver o que é bravata de campanha, e o que realmente vai se materializar.