O tigrão virou um gatinho. Assim pode ser resumida a radical mudança no discurso do candidato Javier Milei, que disputará o segundo turno da eleição presidencial na Argentina com Sergio Massa. Na primeira entrevista que concedeu depois de eleito, o bravateiro que ameaçava acabar com o Banco Central e dolarizar a economia, abrandou o discurso para tentar conquistar os votos dos eleitores de direita que no primeiro turno optaram por Patricia Bullrich, da aliança Juntos por El Cámbio, que ficou em terceiro lugar, com 23%.
Patricia é aliada do ex-presidente Mauricio Macri, mas o grupo está dividido. Parte deles optou pelo apoio a Massa, temendo que Milei aprofunde a crise se vencer e colocar em prática o que prometeu, como romper com a China, não conversar com o presidente Lula e romper relações diplomáticas com o Vaticano.
Patricia ainda não disse o que fará. Entre seus companheiros há um grupo que defende o voto em branco com o argumento de que a mudança é necessária, mas tem de ser feita com democracia, sem descuidar do social.
Na campanha, Milei chamou Patricia de "montonera asesina". Os militantes de sua campanha espalharam que na juventude Patricia foi guerrilheira e, como tal, explodia bomba em jardim de infância.
Agora que precisa dela e trabalha para ter Macri a seu lado, Milei diz que, se Patricia quiser, será ministra em seu futuro governo. Na tentativa de recuperar terreno, o candidato disse que a peleia terminou e que agora a oposição precisa se unir para acabar com o kirchnerismo, que ele define como uma organização criminosa.
Na entrevista, Milei anunciou os nomes de alguns prováveis ministros e disse que a eleição será apertada como foi a de Macri contra Daniel Scioli. Em 2015, Macri, então prefeito de Buenos Aires, derrotou Scioli, que era governador, por 51,34% a 48,66%. Antes do pleito, Milei estava certo de que venceria no primeiro turno, mas fez praticamente o mesmo percentual de votos das primárias e perdeu em províncias que havia vencido.
Milei foi entrevistado por Jonatan Vale, que não fez nenhuma pergunta difícil. Antes de sentar-se com Milei em uma das poltronas do Hotel Libertador, o jornalista exibiu na TV La Nación o Editorial do Jonatan, no qual fez duros ataques ao candidato Massa e à ex-presidente Cristina Kirchner.
Quando Milei começou a falar, comportou-se como quem conversa com um amigo de infância. Até mesmo os ataques ao Papa Francisco foram trocados por uma pergunta sobre como serão as relações com o Vaticano e ele respondeu que serão normais, e que, se o Papa vier à Argentina, será recebido como chefe de Estado.
Analistas locais e estrangeiros avaliam que os ataques ao Papa Francisco estão entre os motivos que fizeram a candidatura de Milei murchar e impediram sua vitória no primeiro turno. No programa Mano a Mano com Jonatan ele disse que perdeu para o medo e classificou Massa como um "embusteiro".