O presidente venezuelano, Nicolás Maduro, cancelou a viagem à Argentina para participar da cúpula da Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos (Celac), sob alegação de que haveria um plano de agressão contra a delegação dele. Segundo analistas, o temor de ser preso pode ter influenciado a decisão.
Os rumores sobre o cancelamento começaram na segunda (23), quando a reunião bilateral que teria com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva retirada da agenda. A mudança de planos havia sido pedida por Caracas, já argumentando problemas de segurança.
"Nas últimas horas fomos informados de um plano elaborado no cerne da direita neofascista cujo objetivo é realizar uma série de agressões contra nossa delegação liderada pelo presidente da República", afirmou o governo venezuelano, justificando a ausência de Maduro na reunião, que contará com a presença de Lula (Brasil), Luis Arce (Bolívia), Gabriel Boric (Chile), Xiomara Castro (Honduras), Mario Abdo Benítez (Paraguai) e Gustavo Petro (Colômbia).
Ordem de captura
Analistas acreditam que o real motivo para Maduro deixar de viajar seja o medo do cerco legal. Existe uma ordem de prisão internacional contra o chefe de Estado chavista expedida pelos Estados Unidos e, justamente por isso, o presidente só viaja para outro país quando tem a certeza de que não será capturado pelas autoridades locais. Além disso, o Congresso argentino tem maioria opositora e isso pode aumentar o coro pelo pedido de prisão de Maduro.
— Se Maduro não viajar à Argentina é porque não teve garantias de que não seria capturado e enviado aos EUA. É preciso avaliar, também, a rota que o avião fará para chegar em território argentino e se vai atravessar outros países, para se ter a garantia desses países de que o avião pode passar e não será obrigado a aterrissar. É preciso ter tudo isso em conta para viajar — explicou ao Estadão o tenente venezuelano José Antonio Colina, que fugiu da Venezuela em 2004 e vive nos EUA.
Oposição
Na semana passada, quando foi anunciado que Maduro havia sido convidado a participar da cúpula da Celac, representantes da oposição argentina começaram a se manifestar contra a viagem e pediram a detenção do chavista por crimes de lesa-humanidade.
O comunicado do governo venezuelano aponta uma tentativa de prejudicar a imagem da Venezuela: "Pretendem montar um show deplorável, a fim de perturbar os efeitos positivos de um encontro regional tão importante e, assim, contribuir para a campanha de descrédito - e fracassada - que tem sido feita contra nosso país a partir do império americano."
A Argentina tem a presidência temporária da Celac e, por isso, a cúpula ocorre, nesta terça (24), em Buenos Aires. Em entrevista coletiva, Lula e o presidente argentino, Alberto Fernández, comentaram a situação da Venezuela e o convite a Maduro.
— A cúpula da Celac reúne líderes de América Latina e do Caribe e, portanto, todos os países-membros estão convidados Não temos nenhum poder de veto, nem queremos ter. A presença de presidentes de Cuba e Venezuela é mais uma inquietação dos meios de comunicação do que dos membros da Celac — afirmou Fernández.
Questionado sobre a situação de Maduro, Lula pediu o respeito à autodeterminação dos povos e disse que os problemas internos venezuelanos devem ser resolvidos com "diálogos, não com ameaças de invasão".
O chanceler venezuelano, Iván Gil, e mais três diplomatas, chegaram a Buenos Aires na segunda-feira para representar a Venezuela na cúpula. Para o analista político Erik Del Bufalo, professor da Universidade Simón Bolívar, o cancelamento acaba sendo "positivo para a Celac":
— Ninguém quer ser retratado ao lado de Maduro, nem mesmo aqueles que supostamente são seus aliados. Para a Venezuela é um desastre e agora precisamos ver os desdobramentos.