Os tunisianos se recusaram em massa a participar de uma eleição legislativa boicotada pela maioria dos partidos neste sábado (17), por considerá-la mais um passo para a construção de um sistema hiperpresidencialista sob o atual chefe de Estado, Kais Saied, que há um ano e meio assumiu poderes plenos.
A nova câmara de 161 deputados substituirá a congelada por Saied em 25 de julho de 2021, mas terá restrições após a adoção de uma nova Constituição em um referendo marcado por abstenção massiva.
O presidente da comissão eleitoral, Farouk Bouasker, anunciou uma escassa participação de "8,8% às 18h00" (14h00 de Brasíla), número que se completará com o fechamento tardio de algumas seções. Os resultados preliminares da primeira rodada legislativa serão anunciados na segunda-feira.
É a participação eleitoral mais baixa desde a Revolução de 2011, após anos recordes, e é três vezes inferior à do referendo sobre a Constituição deste verão (30,5%), que já foi marcado pela abstenção.
Este novo Parlamento "deve ser mais democrático e presente do que todos os Parlamentos anteriores da história do país", ironizou o analista Youssef Chérif no Twitter.
Bouasker reconheceu uma "taxa modesta, mas não vergonhosa", argumentando que isso seria explicado pela "total ausência de compra de votos (...) com financiamento estrangeiro", ao contrário, segundo ele, de certas votações no passado.
A maioria dos partidos boicotou essas eleições, incluindo o movimento Ennahdha, de inspiração islâmica, inimigo jurado do presidente, que dominava o Parlamento dissolvido.
No novo Parlamento, os deputados não poderão destituir o presidente e será praticamente impossível para eles censurar o governo. Além disso, o chefe de Estado terá prioridade na aprovação de suas leis.
"A votação é uma formalidade para terminar o sistema político imposto por Kais Saied e concentrar o poder em suas mãos", disse à AFP o cientista político Hamza Meddeb.
Os 12 milhões de habitantes do país do norte da África estão muito mais preocupados com o aumento do custo de vida, com uma inflação de quase 10% e a recorrente escassez de alimentos, como leite e açúcar.
O país está mergulhado em uma forte crise política e altamente polarizado desde que Saied assumiu poderes plenos em 25 de julho de 2021, após alegar que o país havia se tornado ingovernável desde o triunfo da revolução de 2011.
A isso se soma uma grave situação econômica e a guerra na Ucrânia, da qual depende para a importação de trigo.
* AFP