O governo dos Estados Unidos vai anunciar nesta quarta-feira (16) um aumento da ajuda à Ucrânia, no momento em que aumenta a pressão internacional sobre a Rússia, para que o país interrompa os bombardeios contra alvos civis e as negociações de paz prosseguem de maneira hesitante.
Uma fonte da Casa Branca afirmou que o presidente Joe Biden anunciará nas próximas horas US$ 800 milhões adicionais de assistência para a Ucrânia. No total, o presidente autorizou quase US$ 2 bilhões de ajuda à Ucrânia desde o início de seu mandato, de acordo com fontes do governo.
O anúncio de Biden acontecerá depois do discurso do presidente ucraniano, Volodimir Zelensky, aos congressistas americanos, durante o qual certamente solicitará mais ajuda para seu país e a criação de uma zona de exclusão aérea sobre a Ucrânia, algo que Washington descarta no momento.
A ofensiva russa na Ucrânia entra na terceira semana e o cerco a Kiev é cada vez mais intenso. Na madrugada desta quarta-feira foram ouvidas fortes explosões na capital e colunas de fumaça eram observadas em vários pontos.
Os moradores da capital devem respeitar um toque de recolher até a manhã de quinta-feira e a imprensa não está autorizada a circular pela capital. As autoridades municipais afirmam que Kiev vive um "momento perigoso".
"Todas as guerras terminam com um acordo"
Algumas horas antes, em uma mensagem de vídeo, Zelensky pediu novamente aos compatriotas que não desistam da luta contra as tropas russas, mas deu a entender que o conflito deve terminar com um acordo negociado.
— Todas as guerras terminam com um acordo — declarou, em referência às "difíceis, mas importantes" negociações que continuam entre Kiev e Moscou.
— As reuniões seguem adiante. Fui informado que as posições nas negociações agora parecem mais realistas, mas precisamos de tempo e todas as decisões serão tomadas pelo bem da Ucrânia — disse.
Os negociadores russos e ucranianos conversam atualmente sobre um compromisso para a neutralidade da Ucrânia que tenha como modelo a Suécia e a Áustria, informou o Kremlin.
— De fato, esta é a opção que se negocia atualmente e que poderia ser considerada um compromisso — afirmou o porta-voz do Kremlin, Dmitri Peskov.
— O status neutro (da Ucrânia) faz parte das negociações sérias, e isso está vinculado às garantias de segurança que Kiev e Moscou também exigem — disse o ministro russo das Relações Exteriores, Serguei Lavrov.
— Isso é o que está sendo discutido atualmente nas negociações, existem fórmulas muito específicas e acho que estão perto de um acordo — acrescentou, embora tenha destacado que as conversações "não são fáceis".
O status neutro da Ucrânia implica que o país desiste de aderir à Otan. Na terça-feira, o presidente Zelensky disse que é necessário reconhecer que seu país nunca integrará a Aliança Atlântica.
Nos últimos dias os ataques russos se tornaram mais intensos contra alvos civis em Kiev, assim como o cerco à cidade portuária de Mariupol, que sofre uma falta dramática de alimentos, água e medicamentos. Quase 20 mil habitantes da cidade conseguiram deixar a região nos últimos dias.
Exaustos, eles relataram viagens aterrorizantes, em meio a corpos em decomposição nas ruas. Mikola, que pediu para não ter o sobrenome revelado, disse à AFP que dirigiu por um campo minado para para fugir e evitar os postos de controle russos.
— É a primeira vez em semanas que consigo respirar — disse.
Nesta quarta-feira também foi atacada a cidade ucraniana de Zaporizhzhia (sul), refúgio para pessoas que fogem de Mariupol e até agora relativamente protegida dos combates.
— Alvos civis de Zaporizhzhia foram bombardeados pela primeira vez — afirmou no Telegram o governador regional, Alexandr Starukh.
O conflito na Ucrânia forçou a fuga de mais de três milhões de pessoas do país, metade delas crianças.
— Os russos já mataram 97 crianças bombardeando escolas, hospitais e casa — denunciou Zelensky na terça-feira em um discurso ao Parlamento do Canadá.
Forças de paz?
Analistas militares acreditam que a Rússia intensificou os bombardeios aéreos depois que a invasão terrestre estagnou e como forma de pressionar as negociações com a Ucrânia.
— Viram que suas operações terrestres não tiveram êxito e que onde conseguem vitórias, estas são conquistadas com um preço elevado que não é sustentável — declarou à AFP Mick Ryan, general australiano da reserva.
— Tiveram que passar ao 'plano C', que é bombardear cidades e aterrorizar civis com a esperança de que os ucranianos aceitem algum tipo de entendimento político — acrescentou.
Na terça-feira (15), os primeiros-ministros da Polônia, República Tcheca e Eslovênia, partidários de uma linha mais dura dos países ocidentais a respeito de Moscou, se reuniram com Zelensky em Kiev. Durante a visita, o vice-primeiro-ministro polonês, Jaroslav Kaczynski, pediu o envio de uma missão de paz da Otan ou outra formação "que seja capaz de defender-se e possa operar em território ucraniano". Os países da Otan receberam com reservas o pedido.
— Acho muito difícil conceber uma missão de paz agora que há uma guerra em curso, com a intensidade que estamos vendo — disse a ministra da Defesa da Holanda, Kajsa Ollongren.
Os países ocidentais temem que atender o apelo poderia provocar uma guerra catastrófica com a Rússia, que possui armas nucleares. No momento, os países ocidentais optaram por isolar a Rússia diplomática e economicamente. As duras sanções podem levar Moscou a um possível default de sua dívida.
Nesta quarta-feira (16), a Rússia deve reembolsar 117 milhões de dólares de dois títulos em euros, o primeiro pagamento de uma série prevista para março e abril. Em represália pela operação militar russa na Ucrânia, quase 300 bilhões de dólares das reservas da Rússia estão congelados em bancos ocidentais. As sanções também forçaram a saída de Moscou de vários fóruns políticos e eventos esportivos internacionais.
Diante da possível expulsão do Conselho da Europa, a Rússia anunciou na terça-feira a saída do organismo europeu de direitos humanos. Moscou também anunciou medidas contra Joe Biden, o primeiro-ministro canadense Justin Trudeau e vários membros de seus governos.
O governo russo também deseja estimular um projeto de resolução "humanitária" sobre a Ucrânia no Conselho de Segurança da ONU, que pode ser votado na quinta-feira, mas tem poucas chances de prosperar.
A Corte Internacional de Justiça (CIJ) anunciará nesta quarta-feira em Haia o veredicto sobre a demanda apresentada pelo governo de Kiev, que pede ao principal tribunal da ONU que ordene à Rússia o fim imediato da invasão.