Os médicos do hospital mais importante do Tigré denunciaram uma multiplicação de mortes "evitáveis" por falta de medicamentos e equipamentos em meio ao conflito que a região do norte da Etiópia enfrenta há mais de um ano.
A falta de tubos de oxigênio, soros intravenosos e equipamentos médicos impossibilitou a realização de cirurgias por pelo menos seis meses, afirmaram em nota os médicos do hospital Ayder em Makele, capital do Tigré.
"Com isso, morrem crianças que precisam de cirurgias, pacientes com câncer curável não recebem tratamento e quem sofre fraturas é obrigado a esperar imobilizado", detalham os médicos do Tigré em texto enviado à imprensa no dia 4 de janeiro.
"Os pacientes morrem quando poderiam ser facilmente salvos com uma simples hemodiálise. Aqueles que estão em diálise há anos em nosso hospital estão morrendo porque equipes não conseguem chegar no local", acrescentou o comunicado.
O acesso à região do Tigré é restrito e as informações fornecidas pelos médicos não puderam ser confirmadas de forma independente pela AFP.
Toda a região sofre com o bloqueio das comunicações e a ONU denuncia uma "obstrução de fato" à chegada de ajuda humanitária aos seis milhões de habitantes do Tigré.
Desde 14 de dezembro, os caminhões com ajuda não chegaram a Tigré e alguns veículos que esperavam para entrar na região foram saqueados, disse o Ocha, o escritório das Nações Unidas para a coordenação de assuntos humanitários.
Segundo os médicos do Ayder, foi solicitada a ajuda de comerciantes de Mekele para obter sabão e detergente, os profissionais de saúde já não tem luvas e não há antibióticos ou analgésicos no hospital.
"Seja qual for a causa deste conflito, não é justo privar os mais pobres dos cuidados de saúde", dizem os médicos do Tigré.
O conflito, que eclodiu em novembro de 2020, quando o primeiro-ministro etíope (e ganhador do Prêmio Nobel da Paz) Abiy Ahmed enviou tropas federais ao Tigré para depor as autoridades locais, acusadas de rebelião.
A crise causou milhares de mortes e obrigou mais de dois milhões de pessoas a fugir de suas casas, segundo a ONU.
E nesta quarta-feira, um relatório divulgado pelas Nações Unidas aponta que mais de seis milhões de pessoas que vivem nas regiões da Etiópia afetadas por uma grande seca precisarão de ajuda "vital" em 2022.
Essa seca se soma à grave crise humanitária que atinge milhões de pessoas, devido à guerra entre forças governamentais e rebeldes na região do Tigré (norte).
A seca na região Somali, bem como no sul e no leste de Oromia, tem um "impacto devastador na vida e nos modos de vida das comunidades pastoris e agropastoris, após três temporadas consecutivas sem chuvas" na área, afirma o Escritório de Coordenação de Assuntos Humanitários (Ocha).
De acordo com o relatório, mais de 6,4 milhões de pessoas nas áreas afetadas precisarão de ajuda alimentar este ano.
No total, cerca de 200.000 crianças e mulheres grávidas ou lactantes sofrem de desnutrição moderada e 14.000 crianças sofrem de desnutrição grave, diz o texto.
No final de novembro, o Programa Mundial de Alimentos das Nações Unidas (PMA) afirmou que a situação humanitária se deteriorou rapidamente no norte do país (Tigré, Amhara, Afar), onde 9,4 milhões de pessoas passam fome devido ao conflito.
Em Tigré, onde, segundo as Nações Unidas, existe um bloqueio humanitário, centenas de milhares de pessoas vivem em condições de quase fome
* AFP