O Brasil chega hoje à cúpula do clima organizada pelo presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, com um embaraço diplomático de R$ 2,9 bilhões. Esse é o montante doado por Noruega e Alemanha, no âmbito do programa Fundo Amazônia, que há mais de dois anos está parado em uma conta bancária do governo federal.
Desde o início do mandato de Jair Bolsonaro, em janeiro de 2019, nenhum novo programa de proteção da Amazônia foi financiado pelo fundo. Mesmo assim, Bolsonaro pediu mais dinheiro para proteger a floresta.
A reportagem questionou o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, sobre o que motiva o governo a pedir US$ 1 bilhão aos EUA para preservação ambiental, quando o país já possui R$ 2,9 bilhões imobilizados há mais de dois anos, doados por Alemanha e Noruega. Salles culpou a Noruega pela paralisação.
— O fundo está paralisado desde 2019 a pedido da Noruega, e não por decisão do Brasil — disse.
De fato, o que ocorreu é que, em junho de 2019, o governo brasileiro editou um decreto que dissolveu o Comitê Orientador do Fundo Amazônia (Cofa) e o Comitê Técnico do Fundo Amazônia (CTFA), que faziam o fundo acontecer. À época, a Noruega declarou que, "dada a conjuntura atual", o país não tinha "fundamento jurídico e técnico" para realizar a contribuição anual do Fundo Amazônia.
Salles paralisou os repasses a novos projetos no início do governo Bolsonaro, com o argumento de ter encontrado "fragilidades" nos projetos. Paralelamente, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), que administra os recursos, afastou sua chefia do Departamento de Meio Ambiente, que cuidava do programa. Nunca veio à tona qualquer prova de irregularidades na gestão do fundo, que tem seus resultados publicados regularmente.
Salles insiste que a paralisia se deve ao posicionamento dos noruegueses, que doaram 94% do total destinado ao Fundo Amazônia até hoje.
— Eles não aceitaram o novo decreto e mandaram uma carta proibindo o fundo de aprovar novos projetos — afirmou o ministro.
O Estadão procurou a embaixada da Noruega, que ainda não se manifestou sobre o assunto. A embaixada da Alemanha afirmou, por meio de nota, que "está em diálogo com o governo brasileiro" para resolver a situação o mais rápido possível.
Nesta semana, em entrevista à BBC, o ministro do Meio Ambiente da Noruega, Sveinung Rotevatn, deu o tom sobre o assunto.
— Diminuir o desmatamento no curto prazo é uma questão de vontade política, não de falta de financiamento adiantado — disse.
O BNDES confirmou à reportagem que, desde 2019, não aprova novos projetos, mas apenas repasses às ações que já estavam contratadas em anos anteriores. O último desembolso ocorreu em 16 de março, com R$ 4,2 milhões destinados ao Projeto Floresta para Sempre, realizado pelo Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon).
O rendimento do Fundo Amazônia, segundo o BNDES, foi de R$ 207 milhões, em 2019, e de R$ 203 milhões, em 2018. O saldo está investido nos fundos Gaia e Gaia II, geridos pelo Banco do Brasil, que mantém a atualização monetária de recursos disponíveis para financiar projetos.
Assim, ao pedir mais dinheiro, Bolsonaro deixa sem destino a maior iniciativa ambiental do Brasil. Os recursos do Fundo Amazônia, criado em 2008, são repassados a fundo perdido. A única contrapartida exigida é a apresentação de resultados práticos das iniciativas.