Um navio porta-contêiner de 400 metros de comprimento e 59 metros de altura – quase tão longo quanto o Empire State Building (Nova York, EUA) – encalhou nesta quarta-feira (24) no Canal de Suez, bloqueando a navegação em uma das principais rotas de abastecimento do mundo. Os contratos futuros de petróleo são alguns dos ativos que respondem com ganhos ao bloqueio, diante de preocupações sobre atrasos na oferta.
Às 8h57min de Brasília, o barril de petróleo WTI para maio subia 2,12%, a US$ 58,98, enquanto o de Brent para junho avançava 1,97%, a US$ 62,05. Os contratos já vinham em alta desde cedo, após uma série de índices de atividade (PMIs) europeus vir bem acima das expectativas.
A embarcação, da japonesa Shoei Kisen e operada pelo conglomerado taiwanês Evergreen Group, viajava da China para o porto de Rotterdam, na Holanda. Autoridades egípcias já estão no local e esperam desencalhar o navio em poucas horas, mas analistas temem que o procedimento possa levar mais tempo.
— O incidente cria distorção nos fluxos de petróleo e produtos que são transportados através do canal. Existem rotas alternativas, mas se o bloqueio durar mais, pode impactar os preços por alguns dias — diz Bjornar Tonhaugen da consultoria norueguesa Rystad Energy.
Oito rebocadores foram mobilizados para ajudar na missão
A embarcação de mais de 220 mil toneladas encalhou depois de ser levada por uma rajada de vento, quando acabava de cruzar a entrada sul do Canal de Suez, segundo o site Vesselfinder.
De acordo com a Autoridade Egípcia do Canal de Suez (SCA), o incidente se deveu a um vento de areia, fenômeno comum no Egito nesta época do ano, que teria gerado um problema de visibilidade.
O encalhe "aconteceu principalmente pela falta de visibilidade, devido às condições meteorológicas, enquanto os ventos atingiram 40 nós (74 km/h), o que afetou o controle do navio", relatou a SCA em comunicado.
"O navio cargueiro encalhou acidentalmente, provavelmente depois de ser atingido por uma rajada de vento", havia dito mais cedo à AFP a companhia Evergreen Marine Corp, que opera o navio.
Julianne Cona, usuária do Instagram, postou uma foto do navio encalhado do Maersk Denver, que ficou bloqueado atrás do Evergreen.
Após o incidente, dezenas de navios esperam para usar o canal, segundo uma fonte marítima. De acordo com fontes marítimas, 30 navios estão parados na entrada norte do Canal, e outros três, na entrada sul.
Ao mesmo tempo, as autoridades anunciaram que o trecho histórico do canal, localizado na parte central da hidrovia, foi reaberto nos dois sentidos de navegação. Neste momento, porém, não está claro como isso ajudará a absorver a perturbação criada pelo Evergreen.
Tal atraso pode ter consequências para o fluxo do tráfego marítimo em uma rota de navegação que concentra cerca de 10% do comércio marítimo internacional, segundo especialistas.
— A passagem por Suez é sempre levada em consideração e, quando há um grande incidente como este, cria atrasos e um efeito dominó — explicou à AFP Camille Egloff, especialista em transporte marítimo do Boston Consulting Group, com sede em Atenas.
Ela informou que o atraso é apenas "questão de horas", porque "estamos em um ambiente hipercontrolado". Ainda assim, deve ter um custo, "porque bloqueia o tráfego atrás".
Fonte de renda
Em resposta a uma política de grandes obras, uma nova seção escavada em 2014 e 2015 facilitou a travessia dos comboios e reduziu o tempo de trânsito das embarcações.
Quase 19 mil navios passaram pelo Canal de Suez em 2020, de acordo com a SCA. Este canal é uma fonte de receita essencial para o Egito, com o qual arrecadou US$ 5,61 bilhões em 2020.
O presidente egípcio, Abdel Fattah al-Sissi, anunciou em 2015 um projeto para desenvolver o canal com o objetivo de reduzir o tempo de espera e dobrar o número de navios que o utilizam até 2023.
As autoridades anunciam regularmente novos recordes de tonelagem. Em agosto de 2019, passaram por ele 6,1 milhões de toneladas em um dia.
Idealizado por Ferdinand de Lesseps, empresário e diplomata francês, o colossal projeto de ligação dos Mares Vermelho e Mediterrâneo durou 10 anos (1859-1869). Participaram dele um milhão de egípcios, segundo as autoridades de hoje.
Dezenas de milhares deles morreram durante este projeto titânico, estimam os especialistas.
Com 164 quilômetros de extensão, o Canal de Suez "não é prerrogativa de uma nação: (...) pertence a uma aspiração da humanidade", lançou Ferdinand de Lesseps em 1864, cerca de 4.000 anos após os primeiros projetos de canal dos Faraós.
Ligação marítima entre a Europa e a Ásia, esta rota permitiu não se ter de contornar outro continente, a África, através do Cabo da Boa Esperança. Também conheceu várias guerras e anos de inatividade.
Essa história foi particularmente marcada pelo ano de 1956: em 26 de julho, Gamal Abdel Nasser, recém-eleito presidente, nacionalizou o Canal de Suez.