"Com este projeto, os filhos dos camponeses serão médicos, e os filhos dos mineiros, advogados". O atual presidente Filipe Nyusi repetiu essa frase em cada etapa de sua campanha para a eleição desta terça-feira (15), em Moçambique, que tem o desenvolvimento de gás como um dos eixos da agenda política.
Desde a descoberta, no início dos anos 2010, de grandes reservas submarinas frente a seu litoral norte, Moçambique se pôs a sonhar, começando por seus líderes.
Estimado em 5 bilhões de metros cúbicos, este tesouro deve transformar um dos países mais pobres do planeta em um exportador de primeiro nível de Gás Natural Liquefeito (GNL).
Um "novo Catar", preveem os mais otimistas. Os consultores da firma Wood McKenzie estimam que o gás deve dar uma receita de até 3 bilhões de dólares ao ano a partir da próxima década. O dobro do que entra hoje no país.
Este grande projeto de gás foi adiado durante muito tempo, mas acaba de ser lançado, de maneira muito oportuna, com investimentos prometidos da ordem de 50 bilhões de euros por parte da americana ExxonMobil e da francesa Total.
As eleições gerais de amanhã em Moçambique, nas quais também se elegem deputados e governadores, acontecem após uma campanha eleitoral violenta que demonstra as dificuldades do governo no poder há mais de 40 anos, em meio à crise econômica e aos conflitos armados.
Salvo maior surpresa, Nyusi e seu partido, a Frente da Libertação de Moçambique (Frelimo), devem se impor mais uma vez frente a seu eterno rival, a Resistência Nacional de Moçambique (Renamo).
Para Nyusi, enfraquecido pela crise financeira e tantos anos no poder, o boom do gás se transformou em uma grande cartada eleitoral.
"Moçambique vai mudar", prometeu, ao depositar em agosto a pedra angular de uma unidade de gás liquefeito em Palma, na província de Cabo Delgado, frente a jazidas de gás.
- 'Fazer a diferença'
Durante a campanha, Filipe Nyusi estimou em 5.000 empregos diretos e 45.000 indiretos o impacto dos projetos das companhias internacionais. Prometeu, sobretudo, que estes dólares serão usados.
"Alguns países dispõem de recursos naturais há tempos, mas a maior parte da população continua na pobreza. Queremos e devemos fazer uma diferença", reconheceu o chefe de Estado.
Nyusi anunciou que os 880 milhões de dólares em impostos percebidos pelo Estado no âmbito do projeto da Total serviriam para reconstruir zonas afetadas pelos ciclones Idai e Kenneth mais cedo este ano, pagar uma parte de sua dívida e cobrir o déficit orçamentário.
Em um país onde cerca da metade (46%) dos 31 milhões de habitantes vive abaixo do limite da pobreza, segundo o Banco Mundial, as declarações do presidente em final de mandato trazem muita esperança, pelo menos entre seus simpatizantes.
"Estes recursos beneficiarão todo mundo", diz Sara Lucas, uma mãe de família que assistiu no sábado ao último ato de campanha de Filipe Nyusi, em Maputo.
Este entusiasmo não é compartilhado pelos críticos do governo, que não se cansam de denunciar sua corrupção.
"Como acontece com tudo mais, estes recursos vão beneficiar apenas alguns que conhecemos bem", afirma Stelio Inacio, um funcionário público de 41 anos, militante do opositor Renamo.
Moçambique se afundou em uma grave crise financeira desde a revelação, em 2016, de que fez, secretamente, um empréstimo de US$ 2 bilhões. Esta operação ficou vinculada a um grande tecido de corrupção, em benefício de pessoas próximas do poder.
A oposição não é a única a duvidar do milagre do gás.
"Nossos prognósticos são que os mais pobres entre os pobres não vão se beneficiar de verdade", afirma Liesl Louw-Vaudran, do Instituto Sul-Africano de Estudos sobre Segurança (ISS).
* AFP