O presidente Jair Bolsonaro (PSL) viajará no fim de semana a Israel com um problema: como cumprir a promessa feita ao premiê Benjamin Netanyahu de mudar a embaixada brasileira de Tel Aviv para Jerusalém.
A solução que está sendo analisada, dadas as resistências cristalizadas à mudança, é o anúncio da abertura de um escritório de representação comercial em Jerusalém. O próprio Bolsonaro citou a possibilidade na quinta (28).
— Nós talvez abramos agora um escritório de negócios em Jerusalém. Por sinal, a questão de Israel, quem define as questões de Estado é o Estado de Israel e ponto final. Trump levou nove meses para decidir — afirmou.
Com isso, o discurso de que a transferência está em estudo ganha amparo em uma medida concreta. Tanto diplomatas brasileiros quanto o Ministério das Relações Exteriores de Israel já vinham trabalhando com a hipótese.
Dos dois lados, contudo, a reportagem ouviu que a conhecida imprevisibilidade de Bolsonaro impede uma certeza do que vai acontecer.
O tema gera confusão desde que, durante a campanha, Bolsonaro assumiu o compromisso de estabelecer uma embaixada em Jerusalém, o que contraria a tradição diplomática brasileira de seguir a orientação da ONU e esperar uma resolução do conflito entre israelenses e palestinos para definir o status da cidade que ambos os povos clamam como sua capital.
Mover a embaixada de Tel Aviv para Jerusalém é reconhecer esse status, e foi uma das primeiras medidas do ídolo externo de Bolsonaro, o presidente americano Donald Trump. Até aqui, apenas a Guatemala fez o mesmo.
Netanyahu está sob pressão e pode perder o cargo nas eleições do dia 9 de abril. Na virada do ano, ele emprestou prestígio político a Bolsonaro comparecendo à posse do presidente, de quem ouviu que a mudança da embaixada seria uma questão de tempo.
A motivação inicial de Bolsonaro foi agradar aos evangélicos de raiz pentecostal, grupo que o apoiou na eleição. Eles acreditam que o Estado judeu merece estar nas terras bíblicas, e há uma leitura mais fundamentalista que crê na necessidade de Israel existir para que Jesus Cristo volte à Terra e cumpra as profecias do Apocalipse.
Bolsonaro, que é católico mas batizou-se evangélico para seguir a mulher em 2016, aparentemente não professa a segunda visão, milenarista. Mas citou mais de uma vez a "verdade bíblica" acerca de Israel e a necessidade de reconhecer o Estado integralmente.
Assim que a ideia foi ventilada, produtores de carne brasileiros foram ao então governo Michel Temer levar a preocupação da categoria. O Brasil é um dos maiores exportadores de proteína animal halal, feita sob princípios de produção e abate islâmicos, e poderia perder mercados com uma atitude pró-Israel.
Após a eleição, a Liga Árabe externou publicamente a questão. Cerca de 40% da carne de frango e 45% da bovina exportados pelo Brasil são halal. A Arábia Saudita determinou embargo à compra de frango brasileiro, embora usando argumentos técnicos.
Com tudo isso, a ala militar do governo resolveu assumir a questão. Já em janeiro, quando estava interinamente na Presidência, o vice Hamilton Mourão baixou o tom da questão, dizendo ser apenas um estudo. Recebeu representantes árabes, deixando irritados diplomatas israelenses. Na sequência, o chanceler Ernesto Araújo adotou o mesmo discurso.
A aproximação entre os dois países, contudo, deverá prosseguir. É uma agenda prioritária de realinhamento brasileiro ao eixo político norte-americano, expresso por Bolsonaro e pelo chanceler.
Politicamente, o Brasil sempre foi defensor da solução de dois Estados na região, e nos últimos anos vinha tomando posições contrárias a Israel em fóruns da ONU, especialmente em relação aos direitos humanos.
Isso mudou na primeira votação envolvendo o país, na semana passada, naquilo que Araújo disse ser uma correção de rota permanente. Na quinta, Bolsonaro reforçou a posição.
— Nós já começamos a votar de acordo com a verdade na ONU. Israel, EUA, Brasil e mais alguns outros países já começaram a votar diferentemente da forma tradicional, que era o lado da Palestina, por exemplo, e defendendo coisas voltadas a Cuba. Nós voltamos a uma realidade. Nós temos direitos humanos de verdade — afirmou.