A situação das dezenas de crianças e adolescentes presos na fronteira americana com o México deve ganhar destaque no primeiro encontro de alto nível entre Estados Unidos e Brasil em território nacional desde o início do governo Michel Temer. O vice-presidente de Trump, Mike Pence, desembarca em Brasília nesta terça-feira (26) às 7h40 e tem um encontro com Temer marcado para as 12h.
Ao detalhar a agenda de Pence no Brasil, o subsecretário-geral de Assuntos Políticos Multilaterais, Europa e América do Norte, Fernando Simas Magalhães, afirmou que todos os temas levantados serão tratados pelas autoridades, mas evitou detalhar assuntos mais sensíveis como esse impasse decorrente da política de "tolerância zero" sobre imigrantes ilegais.
Simas Magalhães se limitou a afirmar que o assunto terá "tratamento concreto e especial" e lembrou que o Itamaraty está mantendo um diálogo permanente com o governo americano, mas agentes consulares nos Estados Unidos têm relatado uma grande dificuldade em monitorar e encontrar as dezenas de crianças brasileiras e promover o reencontro com as famílias.
— O esforço anunciado deixa clara a nossa posição de preocupação com a dignidade dessas famílias e crianças e da importância desse assunto, em um contexto maior dos direitos humanos do qual os dois países estão engajados — declarou o subsecretário.
Desde abril deste ano, milhares de famílias que tentaram entrar ilegalmente nos Estados Unidos acabaram afastadas de seus filhos. Estima-se que mais de 2 mil crianças foram afetadas pela medida adotada pelo governo Trump que, diante das críticas, ordenou, na última quinta-feira, que as famílias fossem reunidas. Hoje o Departamento de Segurança Nacional dos Estados Unidos atualizou os números e elevou para 538 o número de crianças imigrantes que voltaram a ficar perto de seus familiares. Mesmo com essa medida de Trump, o Escritório de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU) disse que a reunificação não soluciona o problema. A porta-voz do organismo da ONU, Ravina Shamdasani disse que, em nenhuma circunstância, se pode deixar uma criança em um centro de detenção.
Previdência
Coincidindo com a visita do vice-presidente norte-americano, Mike Pence, Michel Temer deverá promulgar na terça-feira (26) o acordo Brasil-Estados Unidos na área de Previdência. Isso será feito com a publicação de um decreto no Diário Oficial da União. Com isso, ele entrará em vigor no próximo dia 1º de outubro.
Esse acordo vai permitir que brasileiros que vivem nos Estados Unidos possam somar aqui o tempo de contribuição registrado no exterior.
O mesmo valerá para americanos trabalhando no Brasil. Segundo estimativas da Secretaria de Previdência do Ministério da Fazenda, a medida deverá beneficiar 1,3 milhão de brasileiros e cerca de 35 mil norte-americanos.
Assinado em 2015, o acordo precisou ser aprovado na Câmara e no Senado, um processo que só foi concluído no fim de maio deste ano. Com ele, o contribuinte deixa de ser tributado duplamente. Dado o tamanho da comunidade brasileira nos Estados Unidos, esse acordo representa 45% de um total de 88,52% de cobertura previdenciária no exterior.
De acordo com a Previdência, o Brasil tem acordos semelhantes em vigor com: Alemanha, Bélgica, Cabo Verde, Canadá, Chile, Coreia do Sul, Espanha, França, Grécia, Itália, Japão, Luxemburgo, Portugal e Quebec.
Há acordos multilaterais assinados com o Mercosul (Argentina, Paraguai e Uruguai) e países da península ibero-americana (Argentina, Bolívia, Brasil, Chile, El Salvador, Equador, Espanha, Paraguai, Peru, Portugal e Uruguai).
Venezuela
Pence chegará ao Brasil acompanhado pela mulher Karen Pence, que também tem agenda em Brasília. Os dois ainda participam de um almoço oferecido pelo Itamaraty, também com a presença de Temer e ministros ainda não confirmados, por volta das 13h. A lista de convidados ainda não divulgada inclui 24 autoridades.
No Itamaraty, as negociações continuam, segundo informou o embaixador Fernando Simas Magalhães. Os dois países também vão tratar da situação de refugiados venezuelanos. Esta, aliás, era a pauta principal do encontro, que foi confirmado pelo ministro das Relações Exteriores, Aloysio Nunes Ferreira, durante a 48ª Assembleia-Geral da Organização dos Estados Americanos (OEA), quando reafirmou a posição brasileira contrária a uma intervenção. O Brasil defende que a situação da Venezuela, suspensa temporariamente da OEA como medida punitiva por desrespeito à democracia, seja tratada conjuntamente pelos países membros da organização.
— Os EUA têm dado contribuições ao tratamento desse fluxo migratório de venezuelanos na nossa fronteira norte, inclusive contribuição de forma financeira. Vemos com satisfação esse interesse do vice-presidente norte-americano de ver, in loco, como está sendo administrada e gerida uma situação que é muito sensível e tem despertado o interesse de todos nós — declarou Magalhães.
Pence viaja para Manaus no início da manhã da quarta-feira (27) e vai visitar um dos abrigos construídos para receber venezuelanos. A visita à Casa de Acolhimento Santa Catarina está marcada para 11h.
Dados da Agência da Organização das Nações Unidas (ONU) para os Refugiados (Acnur), apontam que, desde 2005, mais de dois milhões de venezuelanos deixaram seu país e mais de 60% estão atualmente em situação irregular. O Brasil recebeu até o momento cerca de 50 mil venezuelanos refugiados. A Colômbia acolhe o maior número de migrantes venezuelanos, mais de 800 mil pessoas.
A crise humanitária dos imigrantes venezuelanos continua na agenda de Pence nos próximos dias. Daqui ele seguirá para Quito, no Equador, onde se reunirá com o presidente Lenín Moreno, para tratar da mesma questão.
Alcântara
No encontro também estão previstos anúncios sobre acordos bilaterais em áreas estratégicas para os dois países. Entre eles, o que sela a retomada das negociações para uso pela Nasa, da base de lançamentos de satélites de Alcântara, localizada no Maranhão.
— Se pretendemos fazer no futuro essa utilização comercial da base de lançamento de satélites é claro que as condições em que o material ingressa em território brasileiro tem que estar coberto por salvaguardas legais — explicou o subsecretário-geral do Itamaraty.
O interesse pela utilização da base para lançamento de satélites está na economia que o espaço permite em função das sua localização geográfica, próxima a linha do Equador.
— Isso permite que um satélite possa ser lançado com 30% a mais de carga ou com economia de 30% de combustível. Alcântara oferece uma enorme atratividade para essa atividade que movimenta centenas de bilhões de dólares em todo o mundo. Se pudermos criar as condições para utilização comercial efetiva vamos entrar em um filão de mercado extraordinário — avaliou o diplomata.
As tratativas sobre salvaguardas tecnológicas voltou à mesa de negociações dos dois países recentemente. O ministro Aloysio Nunes confirmou as conversas depois de encontrar o secretário de Estado norte-americano, Mike Pompeo, no início deste mês.