Sob indefinição desde fevereiro, a falência da Magazine Incorporações S/A, com nome fantasia de M.Grupo, foi confirmada por unanimidade pela 6ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado (TJ). A decisão abre caminho para bloqueio de bens e varredura nas contas da empresa, que ainda pode recorrer. O M.Grupo surgiu no Estado em 2008 prometendo investir R$ 1 bilhão em negócios e ganhou notoriedade ao anunciar a construção daquele que seria o prédio mais alto do Estado, mas deixou de entregar imóveis a pelo menos 400 clientes, além de ficar devendo para bancos e o fisco.
O rombo nas contas até 2016 chegava a pelo menos R$ 505 milhões – o número oficial ainda é desconhecido, assim como o patrimônio da incorporadora.
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Até o momento, os donos do M.Grupo, Lorival Rodrigues e o filho Cyro Santiago Rodrigues não prestaram declarações à Vara de Direito Empresarial, Recuperação de Empresas e Falências da Capital. Quando isso ocorrer, terão de apresentar, conforme a lei, livros contábeis e lista completa de bens e de credores.
"Estamos diante de um processo excepcional. São centenas, senão milhares de consumidores lesados. (...) Guardadas as devidas proporções, faz lembrar a falência da Encol (construtora goiana que foi à ruína em 1999, lesando 42 mil clientes no país)", relata documento encaminhado ao judiciário pela Medeiros & Medeiros Administração Judicial, nomeada pela Justiça para gerenciar a massa falida.
Gestora judicial busca recursos para credores
A empresa trabalha com 15 profissionais, entre advogados e contadores, buscando documentos, encaminhando pedidos e se reunindo com representantes de credores.
– Solicitamos a intimação do falido, e vamos pedir a extensão dos efeitos da falência da Magazine para as demais empresas deles – afirma o advogado João Adalberto Medeiros Fernandes Júnior, sócio da Medeiros & Medeiros.
A administradora tem mapeado subsidiárias do M.Grupo. Até agora foram identificadas 76, dos setores imobiliário, investimentos, marketing, eventos, fazendas, extração de areia, mineração, tecnologia e estacionamento. Uma delas, a JVL Equity Participações Societárias, tem sede em São Paulo. Aberta em setembro de 2016, consta com capital social de R$ 1,3 bilhão, segundo cadastro da Receita Federal. Os sócios da JVL são outras duas subsidiárias do M.Grupo e a filha de Lorival, Camila.
Para Fernandes Júnior, a abertura de dezenas de empresas – mais de 50 em 2016, grande parte com capital social de R$ 2 mil – seria forma de ocultar bens.
– Pode ser uma cortina de fumaça para o endividamento que já existia. Mas ainda não temos percepção clara dessas atitudes – pondera.
Os gestores querem ainda a quebra dos sigilos fiscal e bancário dessas empresas, o bloqueio de valores e a indisponibilização judicial de bens. A M.Invest, um dos braços da Magazine, vendeu R$ 169,8 milhões em debêntures (títulos de dívida privada).
– Nosso objetivo é localizar, arrecadar e vender ativos em leilão judicial. Em paralelo, vamos elaborando a lista dos credores. Depois, quando tivermos dinheiro em caixa, faremos os pagamentos – observa Fernandes Júnior.
Por lei, a prioridade é quitar dívidas trabalhistas (mais de cem ações), depois, pagar detentores de hipotecas, seguidos de tributos fiscais e clientes. O advogado evita dar prazo e diz que a maior dificuldade será conferir quem tem saldo devedor com o M.Grupo e quem já quitou pagamento de imóveis não entregues.
– Queremos, de forma legal e justa, equacionar problemas relacionados, principalmente, aos adquirentes das unidades e que os empreendimentos sejam concluídos.
A falência teve origem em débito do M.Grupo com um comprador de sala do projeto Majestic, em Gravataí. O prédio seria o mais alto do Estado, com 42 andares. Jamais saiu do papel, embora dezenas de unidades tenham sido vendidas, e, segundo Fernandes Júnior, está inviabilizado em definitivo:
– A massa falida não tem interesse em construção. Provavelmente ocorra a alienação do terreno.
Justiça sequestrou 18 carros de luxo de donos da empresa
A primeira solicitação da Medeiros & Medeiros Administração Judicial, gestora da massa falida do M.Grupo, foi a indisponibilização de 18 veículos de luxo avaliados em R$ 4,1 milhões em nome da Magazine Incorporações, de Lorival Rodrigues e do filho Cyro Santiago Rodrigues. Apenas um Rolls Royce Phantom, ano 2009, está avaliado em R$ 1,9 milhão – tem placa que faz referência ao nome de Cyro e ao ano de nascimento dele, 1985.
Embora os carros ainda não tenham sido recolhidos – o paradeiro é desconhecido –, Lorival e Cyro estão proibidos pela Justiça de vender e de circular com os veículos.
Foram identificados também outros 17 automóveis registrados em nome da Magazine Incorporações, avaliada em R$ 3,3 milhões – incluindo duas Ferrari Scaglietti, ao preço de R$ 757 mil cada. De acordo com levantamento da massa falida, essa frota foi transferida para terceiros em outros Estados entre 2010 e 2015, e os gestores tentam descobrir o destino dos carros para apurar se foram objeto de supostas fraudes.
A gestora da massa falida também fará arrecadação de terrenos localizados em Capão da Canoa e procura imóveis em Alvorada, Canoas, Pelotas, Florianópolis e São Paulo. Há ainda intenção de questionar a Marinha do Brasil para saber se existem equipamentos náuticos em nome das empresas do M.Grupo.
CONTRAPONTO
O que diz Lorival Rodrigues, um dos sócios do M.Grupo
Por celular, afirmando estar em São Paulo, disse que o processo de falência é tratado pelo jurídico da empresa, e que já foi apresentada proposta de renegociação com garantias reais suficientes para cobrir os débitos. Assegurou que a dívida do M.Grupo é menor do que os R$ 505 milhões apresentados em balancete à Justiça no ano passado (débitos com financeira foram liquidados no começo do ano, quando o M.Grupo perdeu shoppings em Gravataí, Xangri-Lá e Santa Cruz, e parte de shoppings em Lajeado e Bento Gonçalves, além de um hotel em Bagé).
Embora a informação conste no cadastro da Receita Federal, disponível para consulta na internet, o empresário também nega que sua filha, Camila, seja sócia da empresa paulista JVL Equity Participações Societárias, com capital de R$ 1,3 bilhão.
– A empresa é de um grupo da nossa família, mas não é minha. E minha filha estava como diretora de marketing, sem ações, sem propriedade – diz.
Quanto à venda de R$ 169,8 milhões em debêntures pela M.Invest, Lorival não soube dizer quanto entrou no caixa, afirmando que grande parte do dinheiro arrecadado financiou obras em shoppings e quitou dívidas.