Um paredão de concreto com 382 metros de comprimento e 25 metros de altura erguido no meio do pampa simboliza a esperança de água abundante para produtores rurais de cinco municípios da região da Campanha. Quase 20 anos após os primeiros estudos, a barragem de Taquarembó, em Dom Pedrito, terá as obras retomadas nas próximas semanas, com promessa de conclusão em 2026. Somado à barragem de Jaguari, cuja construção também será reiniciada em São Gabriel, o reservatório vai garantir irrigação para 117 mil hectares, uma área superior a duas vezes o território de Porto Alegre.
O anúncio de retomada foi feito no início do mês pelo governo do Estado, sete anos após a suspensão dos trabalhos. Em 2017, Taquarembó estava 60% concluída. Jaguari não chegou a parar, mas o ritmo é lento, estando atualmente 70% pronta.
Nessa retomada, serão investidos R$ 248,3 milhões em recursos estaduais e federais. O contrato com a nova empresa responsável pelas obras, a Sultepa, está sob análise do Ministério da Integração e Desenvolvimento Regional em Brasília, e a previsão é de que os operários comecem a trabalhar em maio.
Técnicos da empreiteira vistoriaram Taquarembó há duas semanas. Encontraram no local galpões se desmanchando, um pouco de lixo e muito mato crescendo no canteiro de obras abandonado. A empresa já procura alojamento para os funcionários e começa a preparação para a retomada.
Para terminar a barragem, os operários precisam levantar mais nove metros de muro, chegando a 34 metros de altura, instalar as comportas, limpar a área a ser alagada e replantar boa parte da vegetação suprimida. Também será necessário erguer uma nova ponte entre Dom Pedrito e Lavras do Sul, já que a travessia atual será inundada.
— Esse projeto não para mais. São obras muito importantes para a região, beneficiando quase 250 mil pessoas e permitindo um salto na economia — afirma a secretária em exercício de Obras , Zilá Breitenbach.
Serão beneficiados os municípios de Dom Pedrito, São Gabriel, Lavras do Sul, Cacequi e Rosário do Sul. Estudo da Associação dos Usuários da Água da Bacia Hidrográfica do Rio Santa Maria (Ausm) projeta que a economia da região terá incremento anual de R$ 1,2 bilhão. Projeções mostram que a produção de arroz, principal cultura da região, deve crescer 28,7 mil hectares, saltando dos 115 mil hectares atuais para quase 144 mil.
— Com mais água, vamos plantar mais, contratar mais funcionários, comprar mais trator, insumos e equipamentos. Vamos retirar as 99 bombas que puxam água do Rio Santa Maria com licença ambiental precária e cadastrar 238 propriedades para captação direta por canais de irrigação — comenta o presidente da Ausm, Edson Silva.
Além de levar água às lavouras de arroz, soja, sorgo, milho e pastagens, bem como aos rebanhos e pomares da região, o sistema vai garantir abastecimento da rede urbana de Dom Pedrito e Rosário do Sul, beneficiando 80 mil habitantes nos dois municípios. Para alcançar todo o potencial, porém, as duas barragens precisam de 296 quilômetros de canais, cuja construção ainda não tem data
A previsão da Secretaria de Obras é lançar ainda este ano a licitação dos projetos executivos. Em paralelo, está em andamento convênio junto ao governo federal para estudo do impacto ambiental do empreendimento, cujo prazo de execução é de 18 meses. No total, a construção dos canais está orçada em R$ 400 milhões.
De acordo com a pasta, quando as duas barragens forem concluídas a água será distribuída por canais naturais, como arroios e rios e vertentes, até a conclusão dos canais. A secretaria não informou, porém, quantos dos 117 mil hectares serão irrigados neste primeiro momento.
— Estamos correndo com isso. A ideia era entregar a barragem e os canais, tudo pronto em 2026, mas estamos com os estudos em andamento — diz Zilá.
Vai ser um divisor de águas para a região. O município vai produzir muito mais e melhorar a qualidade de vida de quem mora no campo.
MÁRIO AUGUSTO GONÇALVES
Prefeito de Dom Pedrito
Quando toda a obra for concluída, caberá à Ausm manter as barragens e gerir o processo de distribuição dos 116 milhões de metros cúbicos de água estocados em Taquarembó e dos 159 milhões de Jaguari. Atualmente, os produtores não pagam pela água que retiram do Rio Santa Maria nas 99 bombas de captação.
Com as duas barragens funcionando a pleno, a irrigação será cobrada. Ainda não há um modelo definido, mas a ideia da entidade é usar como parâmetro a Associação dos Usuários do Perímetro de Irrigação do Arroio Duro (Aud). Com sede em Camaquã, a AUD tem 395 associados e irriga 20,7 mil hectares na região.
— A AUD cobra cerca de R$ 500 por hectare irrigado. Pode ser que adotemos um sistema semelhante — cogita Edson Silva.
Em Dom Pedrito, a expectativa é de que a obra estimule ainda mais uma economia em expansão. Segundo o prefeito Mário Augusto Gonçalves (PP), o município passou por uma mudança significativa da matriz econômica, até então majoritariamente proveniente do arroz e da pecuária. Agora, há mais renda a partir do crescimento das lavouras de soja, antes restritos a 30 mil hectares ante 50 mil de arroz. Atualmente, são 160 mil hectares de soja e 40 mil de arroz.
— Vai ser um divisor de águas para a região. O município vai produzir muito mais e melhorar a qualidade de vida de quem mora no campo — afirma Mário Augusto.
Sistema Taquarembó-Jaguari
Concebidas há quase 20 anos para resolver problema crônico de irrigação na Campanha e Fronteira Oeste, as barragens terão as obras retomadas nas próximas semanas, com R$ 248,3 milhões em investimentos. Veja os números do complexo:
Taquarembó
- Localização: Arroio Taquarembó, na divisa entre Dom Pedrito e Lavras do Sul
- Custo de finalização: R$ 133,8 milhões (R$ 71,5 milhões em verbas do Estado e R$ 62,3 milhões federais)
- Capacidade: 116 milhões de metros cúbicos de água
- Crista: 382 metros
- Altura: 34 metros
- Municípios beneficiados: Lavras do Sul, Dom Pedrito e Rosário do Sul
- População beneficiada: 88 mil habitantes
- Área irrigável: 52,6 mil hectares, sendo 35,5 mil por gravidade e 17,1 mil em terras altas
Jaguari
- Localização: Arroio Jaguari, na divisa entre Lavras do Sul e São Gabriel
- Custo de finalização: R$ 74,7 milhões (R$ 65 milhões em verbas do Estado e R$ 9,7 milhões federais)
- Capacidade: 159 milhões de metros cúbicos de água;
- Crista: 1.045 metros
- Altura: 25 metros
- Municípios beneficiados: Lavras do Sul, São Gabriel, Cacequi e Rosário do Sul
- População beneficiada: 113 mil habitantes
- Área irrigável: 64,8 mil hectares, sendo 47,3 mil por gravidade e 17,5 mil em terras altas
* Há ainda mais R$ 39,8 milhões em recursos estaduais para desapropriações, serviços ambientais e construção de canais naturais