Assessora do Ministério da Justiça e Segurança Pública e presidente do Comitê Nacional para Refugiados (Conare), Sheila de Carvalho lidera os trabalhos no território yanomami, em Roraima, onde o governo federal decretou, na semana passada, emergência de saúde pública. Ela descreve um cenário de total precariedade em que vivem milhares de pessoas na maior reserva indígena do país.
Em entrevista ao Gaúcha Atualidade, da Rádio Gaúcha, nesta sexta-feira (27), Sheila afirmou que os yanomami "ficaram em uma situação próxima do extermínio" e que o cenário que levou a esta situação precisa ser investigado.
— O que a gente tem como certeza, do que aconteceu, foi uma negligência deliberada em relação ao povo yanomami. A gente vê que houve denúncias internacionais, a gente vê que vários ofícios e vários pedidos de socorro foram ignorados pela gestão anterior — disse a presidente do Conare.
Sheila critica o que chamou de permissividade da antiga gestão federal em relação ao garimpo ilegal na região, que, segundo ela, ajudou a agravar a situação. Também cobra responsabilização dos responsáveis.
— Não teve nenhuma ação ali no território dos yanomami, não teve nenhum cuidado. Não teve nenhum tipo de política para conter a grave situação dos yanomami. Então, de uma omissão, de uma negligência criminosa, a gente pode sim responsabilizá-los. E a gente sabe que a legislação estabelece que o genocídio de um povo também se dá pela omissão.
Ao falar sobre o cenário precário que o Ministério da Saúde encontrou na região, Sheila elenca as ações que vêm sido tomadas para tentar recuperar os yanomami em estado de desnutrição. Além de hospitais de campanha, polos de triagem e distribuição de alimentos, equipes de nutricionistas têm trabalhado na "recondução alimentar" dos indígenas. Conforme a assessora, desde a última sexta-feira (20), mais de 10 toneladas de alimentos foram distribuídos na região com a ajuda da Força Área Brasileira (FAB).
Sheila diz ainda que a recuperação imediata dos indígenas é somente o primeiro passo para conter a crise humanitária. Para ela, é necessário que seja feita a "desintrusão" dos garimpeiros ilegais que destroem o ecossistema da região, além de se criar meios legais que inviabilizem a prática.
— Essa é a prioridade, garantir a sobrevivência (dos yanomamis). Em paralelo a isso, a gente tem essa ação de médio e longo prazo que é preservar o meio ambiente. E isso passa pela "desintrusão" dos garimpos ilegais (...) para que haja uma fiscalização mais adequada e apurada do que acontece dentro desses territórios — afirmou.
"Yanomami são brasileiros, em território brasileiro"
Questionada sobre as fake news que vêm circulando em grupos bolsonaristas questionando a origem dos yanomami, Sheila afirma que esta é uma tentativa de "tirar a responsabilidade da gestão anterior pelo o que aconteceu".
— Yanomamis são indígenas brasileiros em território brasileiro. A gente está falando de uma crise humanitária brasileira. Os yanomami ficam em um território que está a centenas de quilômetros de distância da fronteira com a Venezuela, por onde entram pessoas venezuelanas que buscam refúgio no Brasil. Essas pessoas, que entram ali na fronteira via Pacaraima, são atendidas pela Operação Acolhida. Não há nenhum indígena venezuelano naquele nível de insalubridade que a gente tem recebido a população indígena brasileira dos yanomami — disse Sheila.