O baile funk onde morreram nove pessoas pisoteadas na madrugada de domingo (1), mais conhecido pela sigla "DZ7", é um dos maiores de São Paulo e reúne entre 3 mil e 5 mil pessoas - incluindo gente de municípios vizinhos - por dia ao longo da rua Ernest Renan, em Paraisópolis, e em seu entorno.
O baile, que começa à noite e continua até a manhã do dia seguinte, funciona com iniciativas descentralizadas - carros e caixas de som, comerciantes e aglomerações de pessoas ao longo das ruas. Diferentemente dos maiores bailes do Rio de Janeiro, o DZ7 não tem um organizador nem apresentações de DJs ou MCs.
Sábado é o dia principal de festa, mas o DZ7 acontece todas as semanas, de quinta a domingo. O baile era conhecido como um dos poucos bailes funk da cidade em que a Polícia Militar não costumava ser tão incisiva, mas a situação mudou nos últimos três a quatro meses, segundo frequentadores.
A reportagem entrou em contato com uma frequentadora, um dono de bar e uma pessoa que coloca músicas nos bailes. As identidades foram preservadas por motivos de segurança.
Eles dizem que as ações da polícia para interromper a festa na rua estão acontecendo quase todo fim de semana. O público continua indo, mas agora muitos estão com medo da violência. Uma frequentadora diz que as pessoas vão mesmo assim porque o baile é a única diversão da favela. — É gente que não têm condição de pagar uma balada — diz.
Um comerciante local também reclama das ações da polícia e relata que sem o baile não entra tanto dinheiro na favela, já que grande parte do público que consome bebida, comida, estacionamento e outros serviços no local vem de fora do bairro, da cidade e até do Estado.
Com a ascensão da festa, novos bares foram abertos nas redondezas. Em contrapartida, as casas próximas passaram a ter um preço desvalorizado, por causa do barulho, em relação àquelas mais afastadas.
"Polícia está com uma ação de matar mesmo"
Outro frequentador disse que a ação da madrugada do domingo foi mais violenta do que o de costume, algo que vem sendo recorrente nos últimos meses.
— A polícia está com uma ação de matar mesmo — diz Felipe Santos, 17, morador e estudante de Ensino Médio. — Eles já chegaram tacando bomba. Fechei a janela porque passou bem perto. Desceram da viatura e foram pro beco da 17. Deixaram as armas na viatura, pegaram o cacete e foram batendo no pessoal. Depois disso, foram descendo pela viela. Trombaram eles na saída. Passou um tempo o baile foi voltando aos poucos.
Os frequentadores do baile da DZ7 entrevistados disseram que a versão da Polícia Militar -de que o tumulto começou quando uma moto passou atirando nos policiais - não é verdadeira.
— Ninguém viu isso — diz um deles, que estava na rua principal do baile quando a confusão começou.
Nos últimos bailes, as estruturas de som conhecidas como "paredões" não estão mais tão presentes. Com a polícia desde cedo na favela, os carros de som também pararam de chegar no baile.
Alexandre Cabral, fundador da Becei, biblioteca comunitária criada há mais de 20 anos, cita Gabriel García Márquez para falar sobre tragédia.
— É como o título daquele livro Crônicas de uma Morte Anunciada — diz. — Sou totalmente contra os bailes. Só o poder público pode acabar, mas precisa de alternativas. A molecada não tem onde se divertir. Não é só jogar a polícia contra os meninos. A polícia vem durante o dia e à noite. Jogam rojões. Os jovens saem correndo e atropelam uns aos outros — completa Cabral.
— A prefeitura poderia criar galpões, promover shows lá. Quem sabe a secretaria da Cultura poderia ver isso. Talvez as escolas abrirem aos fins de semana — diz ele, que reclama do barulho e bagunça gerados pelas festas de quinta-feira a domingo. — Isso não vai acabar, até morrer o dobro, o triplo de pessoas. Daí sim tomarem providências.
Neste domingo, jovens ligados à cena cultural na comunidade se reuniram para debater sobre o assunto e buscar alternativas.
— Queremos unir outros coletivos e vamos fazer uma marcha no próximo dia 14, saindo de Paraisópolis em direção ao Palácio dos Bandeirantes. Estamos ainda definindo as coisas, como rotas e horário — afirma Gloria Maria, 20, moradora da comunidade que integra dois coletivos culturais, o Batalha do Paraisópolis e o Anarcoletiva.