Passageiros com 60 anos ou mais, que utilizam o transporte intramunicipal em Caxias do Sul, estão novamente com o direito à gratuidade negado ou dificultado. Três das quatro empresas que prestam esse serviço nas localidades do interior de Caxias admitem que cobram pelo menos metade do valor das passagens dos idosos e, com isso, descumprem a legislação. Desde 2003, o Estatuto do Idoso assegura a gratuidade dos transportes coletivos públicos urbanos e semiurbanos para homens e mulheres acima de 65 anos. A lei municipal estendeu a gratuidade a partir dos 60 anos.
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A alegação das concessionárias para a cobrança é de que, se os passageiros da terceira idade não pagarem, o prejuízo será grande e o serviço ficará economicamente inviável. As empresas afirmam que grande parte dos passageiros, às vezes mais da metade numa única linha, é de idosos. Nenhuma empresa soube precisar, no momento da entrevista, quantos idosos carregam diariamente ou mensalmente.Para buscar uma solução para o problema, a presidente do Conselho Municipal do Idoso, Franciele Roso, procurou a Secretaria Municipal de Trânsito, Transportes e Mobilidade. Ela afirma que as reclamações sobre esse assunto são recorrentes.
– A gratuidade é um direito adquirido pela terceira idade e, infelizmente, ainda temos problemas. Hoje temos 54 mil idosos em Caxias e essa ainda é uma demanda que precisa ser resolvida para esse público – esclarece.
Ciente do problema, o secretário municipal Trânsito, Transportes e Mobilidade, Cristiano de Abreu Soares, garante que as empresas que prestam o serviço de transporte intramunicipal serão notificadas. Em um primeiro momento, o município pedirá às concessionárias que se expliquem sobre a cobrança indevida e que cumpram o que está na lei.
– Vamos ouvi-las para sabermos das justificativas para o descumprimento da legislação. Não temos como deixar um fiscal em cada linha. Então, precisamos que o cidadão seja o fiscal do serviço – afirma o titular da pasta.
Abrelino Dal Bosco, 71 anos, integrante da Associação dos Aposentados e Pensionistas de Caxias do Sul, guarda vários comprovantes de passagens que indicam os valores cobrados pelas empresas aos passageiros com 60 anos ou mais. Ele conta que busca, há anos, as autoridades municipais para que as permissionárias cumpram a legislação, mas reclama da demora de uma solução.
– Não me conformo que isso é cobrado. Não pode, está na legislação.
O QUE DIZEM AS EMPRESAS
Quando renovamos o contrato para a prestação de serviço, em 2009, a gratuidade ainda não era obrigatória para os idosos. Se soubéssemos disso naquela época, não teríamos nem entrado na licitação. Nós cumprimos a lei e não cobramos, por mais difícil que seja. Só pedimos para quem tem mais de 60 anos fazer uma carteirinha de identificação na empresa. Muitos já utilizaram documento de outras pessoas para não pagar, então tivemos que ter esse controle. Já pensamos muitas vezes em deixar de prestar esse serviço, mas não queremos deixar a população na mão. Trabalhamos de segunda a sábado e o número de passageiros vem diminuindo muito. Hoje, 20 pessoas dentro do ônibus já é muito, imagina com 10 não pagando? O nosso contrato expira em 2020 e, se nada mudar, não vamos renová-lo.
Edani Gardelin Rodrigues, gerente-proprietário da Danytur (linha Loreto)
Nós cobramos dos idosos um pouco mais da metade do valor integral (o valor integral é R$ 7,50 e eles cobram R$ 4) ou não vamos conseguir manter o serviço. A tarifa não é reajustada há pelo menos três anos e os nossos custos só aumentam. Temos que fazer manutenção nos ônibus seguidamente: 16 dos 75 quilômetros que percorremos diariamente são de estrada de chão, os ônibus se deterioram muito rápido. Fazemos esse trabalho desde 1947 e estamos com cada vez menos passageiros. Se não cobrarmos de todos, vamos deixar de prestar o serviço.
Joceli Egídio Boff, responsável pela Claudino Costa e Cia Ltda (linha Santa Lúcia do Piai)
Há poucos anos estivemos na prefeitura para conversar sobre as dificuldades que estávamos passando e foi acordado que cobraríamos metade do valor da passagem dos idosos. Se não fosse assim, não teríamos condições de continuar prestando esse serviço. Hoje, nós não cobramos dos primeiros dois idosos que entram nos ônibus; dos demais, cobramos metade. Está cada vez mais difícil, tem cada vez menos passageiro. Não conseguimos nem trocar de veículo. Estamos sobrevivendo, não vivendo.
Cesar Augusto Stürmer, diretor da Vila Oliva Agência de Viagem e Turismo (linha Vila Oliva)
Nós estamos tentando cumprir a legislação, mas é muito difícil. Para diminuir os gastos, até o ano passado trabalhávamos cinco dias por semana; agora, somente três (segunda, quarta e sexta). Em alguns dias da semana passada, metade dos passageiros que carregamos era de idoso. Assim, nosso trabalho fica inviável. Muitas pessoas acima de 60 anos já nos disseram que querem pagar porque entendem a nossa dificuldade. E também, se não conseguirmos trabalhar, elas ficarão sem transporte. Alguém precisa fazer algo antes que as empresas não queiram mais fazer essas linhas e a população fique prejudicada.
Fernando Michelin, administrador da Expresso São Marcos (linha Criúva, via São Jorge da Mulada e Vila Seca)