A maturidade da consciência ambiental está condicionada nas leis jurídicas, nas políticas públicas, na educação familiar e também no ensino escolar. No entanto, os gestos de gratidão à natureza vivem a liberdade e o ânimo de contribuir com a harmonia sem limites. Nas cidades de médio e grande porte, as belezas dos jardins ou das flores estão cada vez mais restritas aos parques e às praças. Por outro lado, nas ruas, embora as administrações realizem grande esforço para deixá-las limpas, alguns cidadãos relutam em colaborar na beleza natural.
Diante de expressiva confusão e vandalismo no meio urbano, percebe-se que há pessoas dispostas em responder com atitudes sublimes. O propósito de plantar flores ou criar jardins em espaços das vias públicas, em vez de destruir, denota grandeza na alma humana. Em Caxias do Sul, a disposição da jardinagem é evidente e salutar. Não se trata de algo imposto, mas uma vontade pessoal que vem de costumes familiares, originando a sensibilidade voluntária de poder plantar, regar, cultivar e apreciar o florescer das plantas nas ruas, calçadas e logradouros públicos.
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A riqueza desta intervenção supera aquela ideia de que somente a administração pública deva ser o responsável direto pelo plantio de flores em espaços localizados fora do nosso quintal. A Constituição Federal, em seu Art. 225, enfatiza que todos têm o direito ao meio ambiente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial a qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e a coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.
E o agradável exemplo da coletividade vem dos mais variados bairros. Numa das extensões da Avenida Júlio de Castilhos, bairro Cinquentenário, um canteiro recebeu atenção especial de uma moradora vizinha. A rotina consiste em plantar flores e admirar permanentemente o resultado colorido e perfumado.
Em Galópolis, Marcia Colombo Calai, 44, procurou transformar o paisagem de sua casa por completo. Do outro da lado da Rua Angelo Basso, Marcia limpou o terreno abandonado da via pública e preencheu com inúmeras variedades de flores. Neste contexto, impossível não fazer referência à principal rua da Universidade de Caxias do Sul. Ali, as rótulas exibem espetáculos floridos da intervenção inteligente do homem.
A estética e a limpeza das ruas encantam alunos, professores e visitantes. Nos finais de semana, os jardins naturais da UCS acolhem noivos, formandos e aniversariantes na produção de seus books fotográficos.
Ela foi criada na terra
Plantar flores representa uma terapia ocupacional cheia de graça para Joana Gasparetto Maccari, 83 anos. Nascida no interior de Caxias do Sul, adquiriu na infância o hábito de respeitar o meio ambiente com o plantio de flores. Joana teve que se afastar dos jardins para cuidar da sua família e a administração de uma olaria.Atualmente, com vigor e disposição, retornou a fazer os jardins que aprendeu na infância. Defronte à sua residência no bairro Cinquentenário, na Avenida Júlio de Castilhos, Joana zela por um canteiro. Ali é possível apreciar todos tipos de flores, com destaque para os cravos e rosa, além de árvores frutíferas.
Joana aprecia o contato com a natureza. Afirma que foi "criada na terra", e que seu amor pelas flores é uma bênção. Por outro lado, a cidade ganha uma voluntária extremamente dedicada com a beleza e limpeza urbana. Joana, com seu trabalho, agrega obediência aos preceitos constitucionais relativos ao meio ambiente, anteriormente citado.
Flores na Rua Angelo Basso
Márcia Colombo Calai teria todos os motivos para deixar de seu uma voluntária em defesa do meio ambiente. Sua semana atribulada no ramo metalúrgico e os cuidados com sua própria vida pessoal e a família não impediram em dedicar boa parcela de suas horas de final de semana zelando por um jardim entre a Rua Angelo Basso e o Arroio Pinhal. A área abandonada recebeu atenção especial e colorido de todos os tipos de flores. Além disso, Márcia investe recursos próprios para comprar as mudas em floriculturas, algo que facilita o trabalho.
O marido Nelson Calai, 47 anos, que mora nesta via há três anos, comunga com este capricho. O impacto desta intervenção é positivo. Quem passa por ali descansa o olhar no canteiro e sentir a fragrância das flores, e, naturalmente, elogiar o capricho do casal. Nelson tem a preferência pela flor boca-de-leão. Neste jardim, pode ser vistos as variedades de margaridas, amor perfeito, crista de galo, gerânio e cravos. Neste ano, foram investidos R$ 500 em mudas.
Jardins na UCS
Universidade de Caxias do Sul adotou em seu campus não apenas jardins, mas um projeto paisagístico que valoriza canteiros e flores de forma permanente. Cesar Lorandi, coordenador da zeladoria da instituição, salienta que o trabalho aproveita orientações dos cursos de Biologia e Agronomia. O aporte dos laboratórios realizam análise da terra, adubação e desenvolvimento das plantas.
Lorandi administra um complexo na Rua Francisco Getúlio Vargas que compreende duas rótulas e canteiros a margem da via. Seis jardineiros e três tratores integram a estrutura que passa o ano cuidando do plantio e manutenção das flores.
O jardineiro Roberto Toscan, 62 anos, trabalha há sete na UCS. Sua afinidade com as flores vem desde menino, quando aprendeu a cultivar com seus pais no interior de Flores da Cunha. Para Toscan e Lorandi, cuidar dos jardins da UCS é um trabalho exigente e fascinante. O resultado disto é poder ver as pessoas admirando os canteiros com alegria e encantamento. Nos finais de semana, o lugar transforma-se num endereço mágico para muitos noivos que registram seus momentos maravilhosos, comentam Toscan e Lorandi com satisfação...e emoção.
No momento, a UCS não produz mais flores, cujas sementes eram importada da Holanda. Hoje as mudas são adquiridas na floricultura Santa Úrsula. Nas rótulas percebe-se a variedade Impatiens, cuja variedade é conhecida popularmente como beijo, maria-sem-vergonha e não-me-toques. Lorandi explica que esta flor sofre com a geada mas brota na primavera. Sua folhagem frondosa exige plantio que obedeça o espaçamento físico.
Vale a Pena ter Um Jardim?
O ambientalista José Lutzenberger (1926/2002) participou ativamente em defesa do meio ambiente. Quando alertava para os perigos da poluição, sua retórica era abrangente e contundente. Com franqueza e desenvoltura atingia a problemática do lixo urbano, hospitalar, agrotóxicos, uso do solo, inseticidas domésticos, agrotóxicos, etc.
No livro Manual de Ecologia / Do Jardim ao Poder, editado em 2004, foi compilado um artigo escrito por Lutzenberger em 1973: Em Vale A Pena Ter Um Jardim? o ecologista mostra sua feição humana e pacífica na tolerância com a agressividade do homem, propondo, insinuando, incitando-o a desenvolver uma mentalidade ecológica harmoniosa.
Lutzenberger interpretava sua realidade criticando as sombras do progresso, fenômeno que desencadeava uma corrida grotesca que nos tornava cada dia mais neuróticos e desequilibrados. Para isto, implorava de que necessitávamos de compensações. E o jardim poderia ser uma dessas compensações. Além de contribuir substancialmente para a saúde do corpo e da alma, a jardinagem poderá constituir ocupação de grande valor educativo.
O ambientalista em vida provou que sua posição estava afastada do discurso fácil. Numa área degradada pela exploração do basalto, constituiu seu jardim: A Fundação Gaia foi concebida para fomentar tecnologias socialmente compatíveis, como a agricultura regenerativa, medicina natural, saneamento alternativo e manejo sustentável da terra. A sede localizada em Pântano Grande (RS), ainda evidencia-se pelas diversas espécies silvestres e a biodiversidade. O local é uma referência para a educação ambiental.