No fundo da lata de 400g restavam, na manhã de terça-feira, seis colheres de Pregomin Pepti, único alimento capaz de nutrir Sofia da Silva, de três meses, que sofre de alergia à proteína do leite. Era a última que a família moradora do Passo do Fiúza, em Viamão, tinha no armário. Depois, a mãe da menina, Paola Martins da Silva, 23 anos, pretendia alimentá-la com leite comum, mesmo sabendo que poderia prejudicar a filha. Desde setembro, Sofia faz parte de uma lista com 1.752 solicitações de fornecimento de dietas, suplementos e fórmulas nutricionais que aguardam a Secretaria Estadual da Saúde liberar a primeira remessa. Só no aguardo do Pregomin, há 203 novos pedidos em avaliação.
– Não posso amamentá-la, pois tomo remédios. Não tenho alternativas. Cada lata custa mais de R$ 120 e ela dura dois dias. Já dei um pouco de leite sem lactose, vou ter que dar novamente por enquanto – contou Paola, fazendo as contas de quanto já gastou para alimentar a filha.
Foi na segunda consulta com o pediatra que Sofia foi diagnosticada com intolerância à proteína. Durante 40 dias, o bebê foi alimentado com outra marca de leite em pó, que custa a metade do valor do Pregomin. Porém, Sofia passou a rejeitá-lo. Então, o médico receitou o especial. Em setembro, Paola inscreveu a filha na lista de espera da Secretaria da Saúde, via posto de saúde de Viamão:
– No local, a atendente me deixou assustada. Disse que poderia demorar até 90 dias para recebermos as primeiras latas. Pensei: como faremos para pagar tudo isso?
Em um mês de espera, Paola e o marido, que trabalha como eletricista, gastaram R$ 1 mil em leite especial – o equivalente ao salário inteiro do marido. Amigos, parentes e os padrinhos da menina têm ajudado a família a garantir as latas de Pregomin. Desta vez, porém, o leite acabou antes da compra de novas latas.
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110 dias de espera
Casos de novos cadastros que ultrapassam os dois meses de espera pelo leite especial têm se tornado comuns no Estado, que já atende cerca de 1.687 crianças com alergia à leite de vaca e outros 9.927 pedidos para as demais dietas, suplementos e fórmulas nutricionais. Extraoficialmente, a informação é de que estariam faltando consultores para analisar tecnicamente todos os pedidos que chegam à Farmácia de Medicamentos do Estado. A Secretaria nega a falta de profissionais, mas confirma que são seis consultores para atender toda a área de nutrição e que a "Secretaria Estadual da Saúde (SES) está reestruturando seu quadro de pessoal em parceria com outros órgãos para atender à atual demanda".
Ainda de acordo com a Secretaria, não é normal aguardar três meses para avaliação de quaisquer pedidos de fornecimento de fórmulas lácteas, dietas enterais ou medicamentos. O prazo para conclusão da avaliação ficaria, segundo a SES, entre 30 e 45 dias. O que não ocorreu com Franciele Machado, 24 anos, do Jardim Itu, em Porto Alegre, que espera desde 10 de julho – portanto, completando hoje 110 dias – pelo Pregomin Pepti para o filho Gael de Matos, dez meses. O caso ainda está em avaliação técnica, com previsão de conclusão da análise nos próximos dias.
– Entro todos os dias no site da Secretaria da Saúde à espera de que me liberem o alimento para o meu filho. É uma espera injusta – desabafa Franciele.