Após um ano da entrada em vigor, as audiências de custódia, que colocam juízes e presos em flagrante frente a frente em um prazo de 24 horas, possibilitaram que um em cada seis autuados respondessem em liberdade.
É o caso do haitiano de 29 anos que na madrugada desta segunda-feira foi levado ao Presídio Central, após ser acusado de estupro por uma mulher a quem contratara para um programa, na Capital.
Durante a manhã, o hatiano foi levado à presença do juiz Sidinei Brzuska. Ao ouvir as alegações do estrangeiro, o juiz decidiu pela concessão de liberdade provisória, uma vez que não houve a comprovação do estupro, além dos fortes indícios de um mal-entendido.
Não entendeu bem
Ele alegou que não entendeu bem a combinação. Enquanto isso, o haitiano deverá se apresentar uma vez por mês no Fórum Central.As audiências de custódia possibilitam que esse tipo de análise se dê de imediato – antes ela poderia levar meses.
O magistrado analisa a prisão sob o aspecto legal (se não houve ilegalidades ou irregularidades por parte da polícia), a necessidade de manutenção do encarceramento ou a possibilidade de liberdade provisória.
Em outras duas audiências realizadas no Juizado do Presídio Central, na manhã de ontem (um caso de roubo e outro de descumprimento de medida protetiva), as prisões em flagrante foram convertidas em preventivas.
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Uma tendência
Essa tem sido a tendência no Estado desde que o procedimento foi implantado, no dia 30 de julho de 2015.Até junho deste ano, foram realizadas 2.994 e, destes, 2.479 (82,8%) resultaram em prisões preventivas, contra as 515 (17,2%) liberdades provisórias.
Do total, em 269 (9%) houve alegação de violência policial.
– Nem toda a pessoa presa é culpada. É preciso aferir as circunstâncias da prisão e, sobretudo, a integridade física das pessoas. Quando fui plantonista, deparei com um caso em que jovens que voltavam da balada embarcaram em um táxi e, numa abordagem, foram encontrados 20kg de cocaína. Todos foram presos em flagrante, mas era preciso saber a quem pertencia a droga – explica o juiz corregedor do Tribunal de Justiça Vanderlei Deolindo.
Antes, uma triagem
Coordenadora do grupo de pesquisa sobre audiências de custódia, do Projeto de Direitos Humanos na Prisão, do IPA, Caroline Viera destaca uma peculiaridade do Rio Grande do Sul: a Justiça gaúcha realiza uma espécie de triagem através do juiz plantonista.
Com isso, cerca de 40% nem chegam à audiência de custódia.De acordo com estimativa do juiz corregedor do Tribunal de Justiça do RS Vanderlei Deolindo, essa primeira análise libera suspeitos desde que obedecidos critérios como primariedade e que sejam crimes sem ameaças ou violência.
O presidente da OAB/RS, Ricardo Breier, avalia como positivo o primeiro ano de realização das audiências.
– O grande aspecto positivo é que quando alguém é preso em flagrante, é apresentado em 24 horas ao juiz, que confere pessoalmente se a prisão obedece aos critérios estabelecidos. Antes, isso levava mais tempo e, enquanto isso, o preso permanecia no presídio, em um ambiente contaminado, sem que se soubesse se a prisão era legal ou não – afirma.
Entenda como funciona
O que é?
É a garantia de rápida apresentação do preso a um juiz nos casos de prisões em flagrante. A ideia é que o acusado seja apresentado e entrevistado pelo magistrado. São ouvidas também as manifestações da defesa e da acusação.
Como funciona?
Em um prazo de 24 horas, os juízes devem ouvir as pessoas que foram presas em flagrante. O magistrado deve avaliar se é necessário mantê-la presa, se ela pode sair mediante fiança, se cabe uma medida punitiva de caráter educativo ou se pode ficar em liberdade.
O que é avaliado?
Durante a audiência, o juiz analisará a prisão sob o aspecto da legalidade, da necessidade, da adequação da continuidade da prisão ou da eventual concessão de liberdade, com ou sem a imposição de outras medidas cautelares, e poderá avaliar também eventuais ocorrências de tortura ou de maus-tratos, entre outras irregularidades.
Qual o objetivo?
Evitar prisões ilegais, feitas de maneira arbitrária ou desnecessária, dar ao preso a chance de se manifestar ao juiz, com a possibilidade de ter a prisão revista. Indiretamente, é uma forma de desafogar o sistema carcerário, uma vez que libera aqueles cuja prisão foi ilegal ou for considerada desnecessária.