O Ministério Público Federal (MPF) tem elementos para investigar uma outra frente de atuação do ex-tesoureiro do PT Paulo Ferreira, alvo de dois mandados de prisão preventiva em um intervalo de 11 dias e suspeito de usar uma escola de samba para lavar dinheiro oriundo de corrupção na Petrobras. Além do Carnaval, as novas suspeitas sobre Ferreira envolvem a intermediação de patrocínio de uma empresa vinculada à estatal a pelo menos um clube de futebol do Estado. Durante dois anos, o Brasil de Pelotas recebeu cerca de R$ 700 mil do grupo Agecom, distribuidor e fabricante de lubrificantes com contratos com a petrolífera.
A Agecom é controladora da Petrowax, empresa que em 2005 fez a maior doação privada do ano ao PT, no valor de R$ 600 mil. À época, Ferreira recém havia assumido a Secretaria de Finanças do partido e tentava equacionar uma dívida de R$ 46 milhões, fruto da gestão do ex-tesoureiro Delúbio Soares, envolvido no mensalão. Quando fez a doação, a Petrowax tinha 30 funcionários e capital social de apenas R$ 50 mil e não era fornecedora da Petrobras. Quatro anos depois, registrava crescimento de 800% no faturamento e havia dobrado a receita em relação ao ano anterior. A parceria com a Petrobras, para quem fabricava lubrificantes, chegou a representar 80% da produção do grupo.
– Já estamos de olho na Petrowax por conta desses contratos com a Petrobras. Foi um período em que a estatal não conseguia suprir a demanda por lubrificantes e terceirizou a produção para a Petrowax. Agora, vamos olhar esses patrocínios ao futebol – afirma um procurador que integra a força-tarefa da Operação Lava-Jato.
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De acordo com o presidente do Brasil de Pelotas à época do patrocínio da Agecom, Helder Lopes, Ferreira foi levado ao clube pelo vereador petista Milton Martins, então diretor de captação de recursos. Chamado na imprensa local de "embaixador do Brasil em Brasília", o tesoureiro petista teria agendado uma audiência com o então ministro dos Esportes, Orlando Silva, e apresentado à direção do time o dono da Agecom, Marcos Guerra. O primeiro contrato, firmado para a disputa da Série C do Campeonato Brasileiro, previa R$ 30 mil mensais. Renovado em 2010, o patrocínio passou para 10 parcelas mensais de R$ 50 mil.
– Às vezes, o pagamento era em dinheiro, às vezes em depósito bancário, mas sempre mediante recibo – afirma Lopes.
O que despertou curiosidade na cidade era que o lubrificante Vorax, fabricado pela Agecom e que figurava nos uniformes dos atletas e painéis do estádio Bento Freitas, não era vendido na região. Torcedores queriam comprar o produto da patrocinadora do time do coração e não encontravam.
– Nunca tinha escutado falar nesse lubrificante. Eles diziam que queriam entrar no mercado gaúcho, mas nunca teve distribuição por aqui – afirma Lopes.
Além do Brasil, Ferreira também procurou outros clubes da região, como o Pelotas e o Rio Grande. Na cidade vizinha, teria intermediado a instalação de um novo sistema de iluminação do estádio Arthur Lawson. Chamado de "cônsul do clube em Brasília", o tesoureiro era próximo do presidente do Rio Grande, Alexandre Lindenmeyer, ex-deputado estadual pelo PT e hoje prefeito da cidade. Procurado por ZH, Lindenmeyer não retornou as ligações.
No Pelotas, a oferta de patrocínio foi da Agecom e do banco BMG, instituição financeira envolvida no mensalão. O acordo, contudo, acabou não sendo celebrado.
– O dinheiro fez falta, mas hoje dou graças a Deus que não tenha dado certo – afirma Luiz Antônio Aleixo, presidente do Pelotas na época da negociação.
Contrapontos
O que dizem Paulo Ferreira e a empresa Agecom
As defesas do ex-deputado e da companhia não responderam aos pedidos de entrevista.
Estratégia em busca de apoio
Com mais de 30 anos de filiação ao PT, Paulo Ferreira sempre foi dedicado à burocracia partidária. Foi ao gerenciar o caixa do partido, de 2005 a 2010, que cultivou ambições maiores. Disposto a concorrer a deputado federal, sua primeira providência foi construir uma base de sustentação eleitoral. Para tanto, mirou em movimentos populares, como Carnaval e futebol. Além de escolas de samba da Capital, Ferreira ajudou agremiações de Pelotas, Uruguaiana e Alegrete. Apresentava-se como alguém capaz de abrir portas em Brasília e intermediar patrocínios.
Foi acolhido pelas entidades, mas não obteve votos suficientes para se eleger. Em 2010, com uma das campanhas mais caras do Estado – R$ 1,4 milhão, dos quais R$ 500 mil doados por empreiteiras envolvidas na Lava-Jato –, ficou na segunda suplência. Acabou tomando posse em março de 2012, após o titular Pepe Vargas (PT-RS) ser nomeado ministro do Desenvolvimento Agrário. No exercício do mandato, tentou ampliar as bases populares, aproximando-se de entidades tradicionalistas e de movimentos umbandistas. Candidatou-se em 2014, mais uma vez ficou na suplência, sem retornar à Câmara.
Filho de um militar e uma dona de casa, irmão do meio em uma prole de três meninos, Ferreira é casado com a ex-ministra do Desenvolvimento Social Tereza Campello. Despertou para a política nos corredores do Colégio Champagnat, na Capital. O ingresso nas hostes esquerdistas se deu na metade dos anos 1970, por meio de irmãos maristas ligados à Pastoral da Juventude e influenciados pela Teologia da Libertação. Formado em História, ingressou no partido no início dos anos 1980 e foi chefe de gabinete do então deputado estadual Selvino Heck. Em 1992, encarou pela primeira vez o desafio das urnas, numa candidatura fracassada a vereador – fez 693 votos. Em 2002, coordenou a campanha de Lula no Estado. Com a vitória, mudou-se para Brasília, onde firmou sólida amizade com José Dirceu. Hoje, ambos estão presos por suspeita de corrupção.