Em mais uma derrota para o Palácio do Planalto nesta semana, o Tribunal de Contas da União (TCU) negou nesta quarta-feira o recurso apresentado pelo governo Dilma Rousseff no caso das chamadas "pedaladas fiscais". Na prática, a Corte consolidou o entendimento de que o governo cometeu uma infração grave à Lei de Responsabilidade Fiscal.
Em votação rápida no plenário, todos os membros da Corte de Contas acompanharam o voto do relator, ministro Vital do Rêgo. Ficou definido que as transações têm "todos os atributos de operação de crédito vedadas pela Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF)". A Advocacia-Geral da União (AGU) argumentava que as manobras não caracterizavam operação de crédito.
Em abril, de forma unânime, os ministros haviam condenado o governo pelas "pedaladas" e considerado a manobra uma infração da LRF. Em seu voto na análise do recurso, Vital ressaltou que é preciso que as operações sejam incluídas na Lei Orçamentária.
O TCU ainda deu provimento parcial ao pedido do Banco Central (BC), sobre o registro das dívidas geradas pelas pedaladas nas estatísticas oficiais de endividamento. Pela decisão, não será preciso que a autoridade monetária incorpore as pedaladas na dívida pública dos anos de 2013 e 2014.
Ficou definido ainda que o FGTS e o Finame, programa operacionalizado pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), devem informar ao BC, a partir de agora, todas as dívidas mantidas pelo governo com eles. Essas dívidas deverão ser incorporadas pelo Banco Central na dívida líquida do setor público. Além disso, o BC deve incorporar, a partir de agora, os passivos do governo junto ao Banco do Brasil (BB), que opera programas subsidiados de crédito rural.
Essas dívidas todas, chamadas de pedaladas fiscais, serão incorporadas pelo Banco Central já a partir da próxima divulgação mensal de estatística fiscal. Há uma dúvida, porém, se essas dívidas serão incorporadas já nos indicadores de novembro, que serão divulgados no fim deste mês, ou a partir dos dados de dezembro, que somente serão anunciados em janeiro de 2016.
O julgamento desta quarta-feira foi o penúltimo passo para o fim do processo das pedaladas, que deverá ocorrer somente em 2016, com a atribuição de responsabilidade dos 17 envolvidos. Nesse ponto final, o TCU poderá decidir pela inabilitação para o serviço público de autoridades do governo, o que exigiria a demissão imediata dos citados.
Entre os envolvidos estão o ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, os presidentes do BNDES, Luciano Coutinho, e da Petrobras, Aldemir Bendine, que foi presidente do Banco do Brasil, além do ex-ministro da Fazenda Guido Mantega e do ex-secretário do Tesouro Nacional Arno Augustin.
O que são as pedaladas fiscais
As pedaladas fiscais consistem em atrasos reiterados no repasse de recursos do Tesouro Nacional aos bancos públicos, ocorridos principalmente em 2013 e 2014, para o custeio de programas sociais. A prática, considerada ilegal pelo TCU, permitiu que o governo Dilma inflasse artificialmente seus resultados e melhorasse o superávit primário em determinados períodos.
O relatório da área técnica do TCU sobre o caso, que embasou os votos dos ministros do Tribunal na análise das contas de 2014 de Dilma, considerou as pedaladas um procedimento irregular.
As irregularidades
- Não contabilização de dívidas do governo com Banco do Brasil, BNDES e FGTS (R$ 40,2 bilhões acumulados até 2014): descumprimento da Lei de Responsabilidade Fiscal - LRF (art. 1);
- Adiantamento da Caixa para pagar Bolsa Família, seguro-desemprego e abono salarial (R$ 7 bilhões em 2014): descumprimento da LRF (art. 1, 32, 36 e 38);
- Adiantamentos dados pelo FGTS à União para cobertura de despesas no Minha Casa Minha Vida (R$ 1,4 bilhão): descumprimento da LRF (art. 32);
- Adiantamentos concedidos pelo BNDES à União para cobertura de despesas no âmbito do Programa de Sustentação do Investimento (PSI): descumprimento da LRF (art. 1, 32, 36);
- Pagamento de dívida contratual junto ao FGTS do Minha Casa Minha Vida sem autorização do orçamento: descumprimento da LRF (art. 1, 3, 5 e 32) e da Constituição (art. 167);
- Uso de recursos além do aprovado no orçamento por estatais ligadas a Petrobras, Telebras e Eletrobras: inobservância da Constituição (art. 167);
- Ausência de contingenciamento de despesas discricionárias da União de pelo menos R$ 28,54 bilhões, quando já se sabia que não haveria dinheiro para gastar: descumprimento da LRF (art. 1 e 9);
- Existência de distorções no Plano Plurianual 2012-­2015, tornando-­o sem confiabilidade: descumprimento da Constituição (art. 37);
- Condicionamento de aumento de gastos públicos à aprovação de lei no parlamento que mudava meta de superávit: inobservância da Constituição (art. 37), da LRF (art. 1) e da Lei Orçamentária (Art. 118);
- Inscrição irregular em Restos a Pagar (dívida de curto prazo) de R$ 1,367 bilhão referente a despesas do Minha Casa Minha Vida no exercício de 2014: descumprimento da Constituição (art.37), da LRF (art. 1) e da Lei que regula os orçamentos (art. 36, 35 e 67);
- Omissão de transações deficitárias da União junto ao Banco do Brasil, ao BNDES e ao FGTS nas estatísticas dos resultados fiscais de 2014: descumprimento da LRF (art. 1) e da Constituição (art. 37);
*Zero Hora, com informações do Estadão Conteúdo