Numa das áreas mais carentes do Bairro Sarandi, em Porto Alegre, duas primas adolescentes provam que problemas financeiros, intrigas e pouca idade não são obstáculos quando o desejo é fazer o bem.
Juntas, a estudante Jaqueline Costa da Silva e a auxiliar de cozinha Bruna Sabino Martins, ambas de 19 anos, da Vila Recanto do Chimarrão, promovem há seis anos uma festa de Natal para as crianças da região.
Inspiradas pela avó Lídia, falecida há 12 anos, que costumava distribuir sopão para os necessitados da comunidade onde morava, as meninas decidiram dar alegria aos pequenos. Quando tinham 13 anos, as primas e outras cinco amigas promoveram a primeira festa. Só que as amigas acabaram deixando de lado a ação voluntária. Restaram as primas.
Sem verba suficiente para cobrir os gastos, elas começaram a arrecadar garrafas pet pelas ruas do Sarandi. O dinheiro serviu para alugar os brinquedos infláveis que são espalhados pela rua na tarde da festa. Hoje, o Natal da Chimarrão é esperado durante o ano todo.
Jaqueline
As garrafas: "Sem dinheiro, a gente optou por recolher garrafa pet nas ruas. O dinheiro deu certinho para alugar três brinquedos para as crianças se divertirem. Nossa! Foi bonito ver todos sorrindo, felizes. Mas até hoje tem gente que fica dizendo que não temos mais nada para fazer, que vamos usar o dinheiro para a gente. Começou a dar vergonha de pedir as garrafas por conta disso. Como os vizinhos já sabem da nossa ação, jogam as garrafas por cima do muro. Isso ajuda também."
Dever cumprido
"Ver tudo concluído dá uma sensação boa! Nós olhamos para as crianças e vemos que o pouco que nós damos para elas é muito. Na nossa época, ninguém dava nem um pouco para a gente. É uma coisa boa que, talvez, mais além, nós vamos ver de volta esta alegria que eles dão para nós e que nós damos para eles."
Inspiração
"Nosso maior desejo é que as crianças de hoje, que acompanham o nosso trabalho, façam isso no futuro. Já temos duas mascotinhas de sete anos que nos ajudam, como a gente ajudava a nossa avó. Elas estão ali brincando, querendo esmagar garrafa como diversão, mas estão vendo a importância de ajudar ao próximo. A gente quer ser a inspiração para que elas façam a festa no futuro."
Bruna
O início: "A inspiração veio da nossa avó Lídia, que fazia sopão para quem não tinha o que comer. Nós estávamos sempre junto com ela, a admirávamos por fazer aquilo sem pedir nada em troca. E ela já tinha tão pouco... Depois que ela faleceu, ficamos anos desejando ajudar os mais pobres que nós. Até que fizemos a primeira festinha com a ajuda dos vizinhos, de algumas amigas e da comunidade. Só que, no ano seguinte, a gente queria continuar, e os outros, não."
Briga
"Ficamos um ano e meio sem nos falarmos, mas continuamos fazendo festas separadas e menores. Até que percebemos que as intrigas não poderiam nos afastar. Fizemos as pazes neste ano. O que fazíamos pelas crianças era muito maior do que fofoca e briga de família. Voltamos e a festa se tornou ainda maior. A gente percebeu que juntas, unidas, somos bem mais fortes para continuarmos fazendo a festinha para as crianças. Nós temos este compromisso!"
Compromisso
"Muitos ajudam com pouco porque não querem o compromisso maior. A gente tem que encher balão, amassar milhares de pets e separar as tampas, vender as garrafas, embalar os brinquedos, costurar as toucas de Papai Noel, conseguir um carro para buscar as doações, organizar o dia da festa. O trabalho só aumenta com a chegada da festa. E, a cada ano, aumenta mais. Nem todo mundo tem paciência para isso. Só faz se tiver amor mesmo pelo que está fazendo."