Com 10 dias para fazer adequações ao pedido de impeachment da presidente Dilma Rousseff, a doutora em direito penal e professora da Universidade de São Paulo (USP) Janaína Paschoal considera que a devolução, feita por ordem do presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), foi um "movimento político".
Ela e o jurista Hélio Bicudo, um dos fundadores do PT, pretendem incluir trechos do procurador do Tribunal de Contas da União Marcelo Oliveira no documento antes de reencaminhá-lo ao Congresso.
- O que me foi informado, por telefone, foi que eu seria intimada, por e-mail, a complementar a denúncia no prazo de 10 dias. Quando eu perguntei quais seriam os complementos, a senhora que me telefonou disse que o ofício seria genérico, que não havia uma falta específica - disse Janaína.
A oposição aposta no pedido de Bicudo para levar adiante a abertura do processo de impeachment. Como o jurista tem uma história de apoio ao PT, parlamentares acreditam que seu requerimento é capaz de sepultar o discurso de "golpe" apresentado por governistas toda vez que se discute o tema.
Confira os principais trechos da entrevista:
O que motivou a posição da presidência da Câmara de devolver o pedido de impeachment encaminhado pela senhora e pelo senhor Hélio Bicudo?
Acho que foi um movimento político. O pedido foi instruído com documentos, as testemunhas foram arroladas, os fatos foram narrados, a legislação pertinente foi indicada, as firmas foram reconhecidas, as certidões de quitação eleitoral foram anexadas e quase 1 milhão de pessoas já subscreveram a petição. A petição é pública, qualquer um pode conferir seus termos. Fomos parabenizados por juristas e cidadãos do Brasil inteiro.
Até o momento, foram apresentados 17 pedidos de impeachment na Câmara. A oposição demonstrou nítido interesse no pedido escrito pelos senhores. Algum medo de uso político do pedido?
Além do rigor técnico da denúncia, por óbvio, a oposição escolheu nosso pedido em razão da respeitabilidade do doutor Hélio Bicudo, que teve a coragem de deixar o PT, tão logo apareceram os primeiros indícios do mensalão. Ele não aceitou a falácia de que se trataria de perseguição política. Além desse fato, o doutor Hélio Bicudo é conhecido e reconhecido por travar lutas justas e por não temer intimidações.
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Na sua opinião, faz alguma diferença se a presidente Dilma sabia ou não dos esquemas de corrupção no governo ou as pedaladas fiscais por si só já justificariam o afastamento?
Nosso pedido se baseia nos dois fundamentos: primeiro no conhecimento do esquema de corrupção, no petrolão, e no comportamento condescendente com os subordinados e com a ligação estreita entre o presidente Lula e o grupo Odebrecht. E também se fundamenta nas pedaladas fiscais. Cada um desses fundamentos, isoladamente, seria suficiente para ensejar o afastamento. Unidos, o pleito fica mais forte ainda. A denúncia foi muito explícita no que concerne às conexões de Lula com a Odebrecht, com certeza, isso incomodou muita gente. A Odebrecht recebeu verbas públicas de várias fontes, Lula recebia milhões da Odebrecht, a presidente diz que Lula e ela são indissociáveis. Como uma situação dessa pode ser considerada normal? O doutor Hélio Bicudo, com razão, não se conforma. E eu vou continuar trabalhando para mudar esse estado de coisas. Não adianta a intimidação, nós não vamos desistir.
SAIBA MAIS
No documento preparado por Bicudo e Janaína, os autores citam as pedaladas fiscais, manobras do governo federal para adiar pagamentos e usar bancos públicos para cobrir as dívidas. Por se tratar de questões envolvendo a administração pública e não aspectos envolvendo a campanha eleitoral, o pedido de impeachment atinge apenas Dilma, deixando de fora o vice-presidente Michel Temer, explica Antônio Augusto Mayer dos Santos, presidente da comissão especial de direito eleitoral da OAB.