Dar pitaco no desfecho da crise que acomete o governo de Dilma Rousseff anda tão popular quanto comentar a rodada do Brasileirão. Sobram cenários e vontades.
A presidente termina o mandato conquistado no voto? É tragada por um impeachment justificado na rejeição de suas contas? Despede-se junto do vice Michel Temer com a impugnação da chapa? O coro é pela permanência de Dilma, por Temer no leme ou por novas eleições? Questões que diferentes vozes da sociedade brasileira debatem e que apontam o rumo de um país ameaçado pelo risco da instabilidade.
Crise política turbina protesto anti-Dilma neste domingo
Como o MBL organiza os protestos contra Dilma na Capital
Inflação e dólar em alta, ajuste fiscal e casos de corrupção desnudados pela Operação Lava-Jato ajudam a explicar a rejeição recorde de Dilma. Neste domingo, as ruas recebem os inconformados com a petista. Na quinta-feira, quem apoia sua continuidade fará o mesmo.
- Ficará mais claro quem está com Dilma e quem deseja a saída. É hora de descer do muro, de resolver a crise. Nos idos de março de 1964, sabíamos que viria algum golpe. Hoje, é tudo imprevisível - clama o deputado federal e peemedebista histórico Jarbas Vasconcelos (PE).
Jogo da crise: qual a sua posição sobre o atual governo?
A discussão das saídas para a crise foi apimentada quando Temer afirmou que o país precisa de "alguém" para "reunificar a todos". Quem seria este alguém? O PT e os movimentos sociais respondem: Dilma, eleita democraticamente, e que já avisou aos rivais:
- Envergo, mas não quebro.
O PT sabe que o ocaso do governo inviabiliza um quinto mandato no Palácio do Planalto, mesmo com Lula como candidato. Assim, os movimentos sociais entraram no palácio. Presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT), Vagner
Freitas polemizou ao dizer que "com armas nas mãos" defenderá a presidente. Não há fato que justifique um impeachment, afirma:
- Somos contra o ajuste fiscal, mas não aceitamos que se afronte a democracia. Todos os golpes foram ruins para os trabalhadores, como no caso de João Goulart.
Das grandes centrais, apenas a Força Sindical contraria Dilma de forma integral. Porém, o governo não recebe apenas apoio. A política econômica engasga a base social.
- Apoiamos na campanha de 2014 outro projeto. Somos contrários ao golpe, mas não apoiamos cortes na educação - explica a presidente da União Nacional dos Estudantes (UNE), Carine Vitral.
A UNE está entre as entidades que convocam o ato de quinta-feira, que o líder do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST), Guilherme Boulos, assegura não ser "chapa-branca":
- Combatemos a ofensiva conservadora, mas não defendemos a forma como o governo conduz o país. O MTST é radicalmente contrário ao ajuste fiscal - afirma.
Críticas da economia lenta, as federações da indústria moderaram o discurso. Firjan, do Rio de Janeiro, e Fiesp, de São Paulo, divulgaram nota em favor da governabilidade, uma vez que derrubar presidente assusta investidores. A pauta-bomba que tramita no Congresso e representa novos gastos públicos, também entrou na mira.
- Vamos nos tornar uma Grécia só pelo desejo de impor problemas para o Executivo. A sociedade não tem como pagar essa conta. É preciso responsabilidade - alerta o presidente da Federação das Indústrias do Rio Grande do Sul (Fiergs), Heitor José Müller.
Quando Michel Temer soltou o apelo por "alguém" que reunifique o país, um tucano levantou a asa. Dono de 51 milhões de votos em 2014, o senador Aécio Neves (PSDB-MG) se considera apto a conduzir o Brasil na crise, mas reconhece que depende de um novo sufrágio, situação viabilizada apenas se o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) impugnar a chapa Dilma­Temer. Mesmo assim, aliados do senador querem convocar eleições - o "terceiro turno", segundo petistas. O mineiro justifica que a presidente e o PT "perderam a capacidade de governar".
- Só pelo voto em torno de um projeto de salvação nacional se criará o ambiente para sair dessa grave crise - disse o líder do PSDB no Senado, Cássio Cunha Lima (PB).
O cientista político Benedito Tadeu César diverge dos aecistas. Professor aposentado da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), avalia que o país pode ficar mais dividido com uma eleição um ano após a corrida presidencial mais disputada das últimas décadas.
- A saída de Dilma não vai gerar um governo de conciliação nacional. Fernando Collor foi eliminado em um impeachment mais por falta de base social e parlamentar do que pela corrupção em si. Mesmo fragilizado, o PT tem base social que pode se insurgir - pondera.
As eleições antecipadas dividem até o PSDB. O senador José Serra (SP) e o governador Geraldo
Alckmin (SP), que disputam a hegemonia no partido em São Paulo, preferem esperar até 2018. Postulantes ao Planalto, querem minar a preferência por Aécio. Em seus discursos, ambos não apontam fatos concretos que embasem um impeachment.
Entre os grandes produtores rurais, apesar da antipatia ao PT personificada no senador Ronaldo Caiado (DEM-GO), as vozes contra Dilma estão controladas graças à ministra da Agricultura, Kátia Abreu, que domina a Confederação da Agricultura e Pecuária (CNA). Professor de Ciência Política da Universidade de Brasília (UnB), David Fleischer aponta que o governo ganhou tempo com as avaliações recentes do mercado:
- Dilma representa falta de governabilidade, mas foi ajudada pela voz da rua que se chama Wall Street. As agências de risco dizem que o Brasil ou melhora o jogo político e econômico, ou cairá ao nível especulativo.
Na dicotomia PT-PSDB, há quem escolha a coluna do meio, o PMDB de Temer. Pelos corredores do Congresso, partidos começam a apontar o vice como o "alguém" que trará a estabilidade.
A opinião cresce também no PMDB, já que Eduardo Cunha (PMDB-RJ) é considerado imprevisível e vê a Lava-Jato avançar sobre ele, enquanto Renan Calheiros (PMDB-AL), que se reaproximou do governo, joga sempre no time que ganha. O perfil conciliador de Temer agrada aos moderados e aos fervorosos pela queda de Dilma.
- Se para tirar Dilma é preciso apoiar Temer, vamos juntos - afirma o deputado federal Paulinho da Força (SD-SP).
A opção por Temer também figura nos grupos que convocam as manifestações deste domingo.
- Temer está longe de ser o presidente dos sonhos, faz parte de um partido que também é corrupto, mas não tem viés totalitário como o PT. Quando ele assumir, talvez traga confiança e estabilidade - diz Fernando Holiday, porta-voz do Movimento Brasil Livre (MBL).
O MBL segue na toada de "Fora Dilma" com o Vem Pra Rua e o Revoltados On Line, que aguardam apreciação da Câmara sobre pedido de impeachment. As pedaladas fiscais e a compra da refinaria de Pasadena pela Petrobras justificariam a derrocada da presidente.
- Todos os caminhos levam ao impeachment - afirma Marcelo Reis, do Revoltados On Line.
AS TURMAS
Tô com Dilma
PT
Chega de fogo amigo! O partido torce o nariz para o ajuste fiscal e para o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, mas tenta reduzir o tom das críticas e fortalecer Dilma. O PT, como o PC do B, entendeu o óbvio: se Dilma não tem apoio nem em casa, imagine na rua.
MTST e MST
Os movimentos dos trabalhadores Sem Teto (MTST) e Sem Terra (MST) garantem que não são "chapas-brancas". Com uma mão protestam contra o impeachment de Dilma, atribuído a grupos conservadores. Com a outra, batem na política econômica do governo.
Centrais sindicais
Das principais centrais sindicais, os companheiros da CUT e da CTB são os mais próximos do governo. Com CSB, UGT e Nova Central, resmungam contra as mudanças nas regras do seguro-desemprego e das pensões, mas batem o pé contra a queda de Dilma.
UNE
Para a União Nacional dos Estudantes, o impeachment é golpe conservador para derrubar Dilma. Por ora, acredita a entidade, não há fatos para um impedimento. Mas a UNE não é só apoio: reprova os cortes no orçamento do MEC e lembra o slogan Pátria Educadora.
Ruim com ela, pior sem ela
PSOL, PSB, PDT e PSD
O PSOL critica o PT, mas vê no impeachment um "golpe de direita". O PSB, que se afastou do governo, não bate panela pela saída de Dilma. Líderes de PDT e PSD criticam a presidente, mas valorizam os cargos no governo. O PDT aguarda novas vagas para voltar à base de apoio.
Federações de indústria
Alerta ligado! Se as agências de risco baixarem a nota do Brasil, a economia vai para o buraco. Fiesp e Firjan divulgaram nota pela governabilidade, e a Fiergs prega responsabilidade. País que derruba presidente assusta investidores.
PMDB de Michel Temer
O vice se esforça pela governabilidade. Mas ameaça deixar o barco quando petistas lhe acusam de jogo duplo.
PMDB de Renan
Renan Calheiros é um pêndulo. Rompeu com governo por causa da Lava-Jato, mas se reaproximou. No movimento, virou o fiador da estabilidade.
PSDB de Alckmin e Serra
Do Palácio dos Bandeirantes ao Planalto. Por esse trajeto, o governador Geraldo Alckmin esfria ímpetos por impeachment. Como tem um mandato a cumprir e precisa vencer a prévia tucana para concorrer, prefere que Dilma fique até 2018. E José Serra não desiste. Disposto a concorrer outra vez, acredita que ainda não apareceu o fato do impeachment. O senador quer tempo para disputar a prévia tucana ou para eventual troca de partido.
Impeachment ou renúncia
PMDB de Cunha
Eduardo Cunha, presidente da Câmara, balança o palanque de Dilma e faz de tudo para melar o governo. Nos jantares na residência oficial da presidência da Câmara, o cardápio servido é o mesmo: impeachment da presidente. Mas Cunha tem seus próprios fantasmas: é alvo da Lava-Jato e deve ser denunciado pelo Ministério Público Federal nos próximos dias.
Força Sindical
A Força Sindical abraçou as manifestações, vai para rua pedir o "Fora Dilma", e conta com dissidentes de outras centrais. O brado é por renúncia ou impeachment, com Temer chegando lá à Itamar. Com o perdão do trocadilho, a Força faz força para Dilma cair.
SD, PP, PR, PTB e PPS
Mudam o tom do discurso e os adjetivos pouco elogiosos à gestão Dilma, mas os partidos concordam em um ponto: não querem a presidente nem o PT até 2018. É a turma do impeachment ou renúncia, que busca uma vaguinha em um eventual governo Temer.
MBL, Vem Pra Rua e Revoltados
Bate panela, protesta na rede social, veste camisa e vai para rua. É "Impeachment Já" e "Fora Dilma". Os movimentos não morrem de amores por Temer, mas adotaram a linha pragmática: o jeito mais fácil de tirar o PT do poder é com Temer no Planalto.
Fora Dilma e novas eleições
PSDB de Aécio Neves
A eleição do ano passado ainda não acabou, ou deveria ter um repeteco logo. Eis a toada da turma de Aécio Neves, senador mineiro derrotado por Dilma na corrida presidencial de 2014. Para eles, só uma nova chapa escolhida nas urnas teria legitimidade para conduzir o Brasil. Esperar até 2018 leva tempo demais.
DEM de Caiado
O senador goiano Ronaldo Caiado brada por novas eleições, não confia em uma alternativa por meio do PMDB. Por garantia, ensaia outra candidatura. Sem paciência para esperar 2018, o ruralista já mandou encilhar o cavalo branco. Se deixarem, sobe a galope a rampa do Planalto.
MBL, Vem Pra Rua e Revoltados
Eles outra vez? Estrategicamente, esses grupos têm o impeachment como principal grito de guerra, como você leu aacima. Acreditam que a força da expressão que marcou a queda de Fernando Collor pode reacender a memória dos brasileiros e ajudar a criar uma mobilização contra Dilma. Pelo mesmo motivo, também decidiram se autodenominar "novos caras pintadas". Como não são necessariamente fãs de Temer, que assumiria em caso de afastamento de Dilma, sabem que o melhor mesmo seria poder votar novamente em uma nova campanha. É por isso que eles aparecem aqui e na turma do impeachment ou renúncia.