Vinte e seis anos depois da queda do Muro de Berlim, a Hungria, convertida em sócia do clube europeu, vai blindar a fronteira com a Sérvia, país que não integra o bloco, a fim de deter a maré de refugiados do Oriente Médio e do norte da África. Não falta know-how a Budapeste para esse tipo de expediente. Durante cerca de 40 anos, as fronteiras da Hungria com vizinhos de fora do bloco soviético, como Áustria e Iugoslávia, permaneceram lacradas.
Cidadãos de países da órbita de Moscou podiam viajar livremente apenas a Estados signatários do Pacto de Varsóvia. Foi, aliás, um afluxo incomum de "turistas" alemães orientais que levou, na segunda metade de 1989, o regime stalinista húngaro a abrir a fronteira com a Áustria e permitir que os visitantes chegassem à então Alemanha Ocidental. O resto é história.
Milhares de imigrantes seguem para as fronteiras da UE pela Macedônia e Sérvia
Enquanto Hungria e Macedônia tentam fazer migrantes esfomeados recuarem por meio de gás lacrimogêneo e cães de guarda, Alemanha e França fecham os olhos na esperança de que a crise evapore. Não pode haver tema politicamente mais explosivo na Europa, neste momento, do que a fixação de cotas de migração.
A extrema direita - de onde saíram alguns dos maiores especialistas mundiais na matéria, como o Führer Adolf Hitler, o padre Jozef Tiso e o marechal Ion Antonescu - não perde oportunidade de recomendar suas receitas de sempre, que incluem cercas, deportações, retirada de direitos e slogans raivosos do tipo "A França para os franceses".
Por que a "ameaça" dos imigrantes é uma paranoia fabricada
O quadro é tão deprimente que até mesmo a chanceler alemã, Angela Merkel, foi obrigada a proferir meia dúzia de palavras piedosas sobre a "dignidade de outras pessoas" ao visitar um centro de refugiados na Saxônia, onde crescem as demonstrações de ódio contra migrantes.
A primavera de 1989 deveria ter ensinado à atual geração de líderes europeus que não se detém 2,1 mil migrantes diários com gás lacrimogêneo e cães de guarda. Oriundos da Síria, onde o uso de armas químicas parece ter se banalizado, os refugiados da primavera de 2015 estão acostumados a avançar em meio às lágrimas. Nem o Mediterrâneo lhes meteu medo.
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