Mesmo abaixo de chuva, centenas de servidores, ambientalistas, estudantes e apoiadores da Fundação Zoobotânica do Estado reuniram-se em frente ao Jardim Botânico de Porto Alegre, na manhã desta terça-feira, para um abraço simbólico. O objetivo da manifestação, que teve até hino rio-grandense, foi protestar contra o projeto de lei que prevê a extinção da fundação.
Encaminhada no fim da semana passada à Assembleia pelo Poder Executivo, a proposta revoltou os 205 funcionários do órgão. Celetistas, eles podem ser demitidos se a iniciativa - que integra o pacote do governo José Ivo Sartori para conter a crise nas finanças do Estado - receber o aval dos deputados estaduais.
Os servidores afirmam que o orçamento da fundação representa 0,045% do orçamento do Estado. Segundo eles, isso não justifica a decisão de acabar com o órgão, que atua na defesa da biodiversidade do Rio Grande do Sul.
- Que interesses estão por trás da extinção da fundação? O objetivo realmente é combater a crise financeira do Estado? Não podemos usar isso como justificativa para mudanças desnecessárias e inócuas que atendem interesses contrários ao da população - disse Glayson Bencke, chefe da Divisão de Pesquisa da fundação.
Embora a secretária do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, Ana Pellini, garanta que "nada vai mudar", que o Jardim Botânico continuará existindo, que não haverá demissões imediatas e que nenhuma pesquisa será interrompida, os servidores não acreditam.
Segundo eles, os desligamentos afetarão os estudos em andamento, porque a secretaria não teria técnicos suficientes para dar conta do trabalho. Moradores do bairro também temem o futuro.
- Moro aqui há 40 anos e não posso imaginar o fechamento do Jardim Botânico. Espero que não aconteça, porque vi meu filho crescer aqui - afirmou Sara de Menezes, 62 anos.
Entre os servidores da instituição, um dos mais preocupados é o engenheiro agrônomo Jorge Cesarino Severo Dupont, 62 anos. Ele atua há 28 anos na fundação e é responsável pelo setor de mudas do Jardim Botânico, que produz cerca de 50 mil exemplares por ano.
- É um banco genético da biodiversidade do Estado, que agora corre risco de se perder. Isso é o que mais me preocupa - alerta Dupont.
O projeto de lei que prevê a extinção da fundação depende de aprovação na Assembleia.
ENTREVISTA
Secretária de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, Ana Pellini
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"Nenhum patrimônio será vendido"
Secretária de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, Ana Pellini assegura que nenhum bem da Fundação Zoobotânica será vendido caso a extinção se concretize. Quanto ao Jardim Botânico, patrimônio cultural do Estado, diz que "nada vai mudar". Confira os principais trechos da entrevista:
O Jardim Botânico corre o risco de ser fechado?
Não há nenhuma chance. O Jardim Botânico será incorporado ao Departamento de Unidades de Conservação e continuará funcionando normalmente. Nada vai mudar.
A área de 600 hectares do horto florestal será vendida?
Nenhum patrimônio será vendido. Isso precisa ficar claro. O projeto prevê que todos os bens da fundação retornem ao Estado. Para vender, seria preciso aprovar lei específica, e isso está fora de cogitação.
Qual é a garantia de que as pesquisas serão mantidas?
Se for aprovada, a extinção da fundação levará anos. Nenhum pesquisador será dispensado de imediato, justamente para não afetar as pesquisas. Com o tempo, esperamos firmar convênios para que o meio acadêmico assuma o que for possível. Nos demais casos, os técnicos serão mantidos. Nada será abandonado.
E o que vai acontecer com o Museu de Ciências Naturais?
Também será mantido. Mais adiante, a ideia é fazer parceria com alguma universidade que se disponha a assumir a administração e as pesquisas. Existem muitas instituições de ponta, capacitadas para isso.
PARA SABER MAIS:
A FUNDAÇÃO ZOOBOTÂNICA
O que é
Criada em 1972, é responsável pela conservação da biodiversidade do RS. Inclui o Jardim Botânico e o Museu de Ciências Naturais na Capital e o Parque Zoológico em Sapucaia do Sul.
A saber
- É a única instituição do sul do Brasil fornecedora de veneno para produção de soro antiofídico (a partir de serpentário com 400 animais).
- No Jardim Botânico, mantém banco de sementes da flora do RS (mais de mil espécies) para restaurar ambientes degradados.
- É responsável por elaborar a lista das espécies da flora e fauna ameaçadas de extinção no Estado.
Números
- Funcionários: 205, sendo três CCs
- Quadro técnico: 43 pesquisadores (70% com doutorado)
- Coleções científicas: 500 mil exemplares, entre plantas, animais e fósseis
- Coleção de plantas vivas: mais de mil espécies
Jardim Botânico e Museu de Ciências Naturais
Visitação média anual: 22 mil pessoas
Arrecadação média anual: R$ 330 mil
Parque Zoológico
Visitação anual: 620 mil pessoas
Arrecadação média anual: R$ 3,2 milhões
Impacto nas finanças
- Folha anual de R$ 18 milhões e custeio de R$ 8 milhões, totalizando despesas de R$ 26 milhões em 2014.
- Segundo a direção, a receita projetada para 2015 é de R$ 5 milhões, valor capaz de cobrir 72% do custeio previsto.
- A repercussão da fundação (folha e custeio) no orçamento estadual é de 0,045%.