Agora que se conhecem os termos do acordo proposto pelo Eurogrupo à Grécia, que prevê até a formação de um fundo de ativos a serem privatizados, com titularidade fora do país, para abater a pesada dívida, uma frase pronunciada ainda durante a realização do plebiscito é a que ecoa mais forte dos dias de cobertura em Atenas. Diante de uma presença muito mais visível da propaganda de boca de urna pró-não, o agente de viagens Mikael Sikas, cantor nas horas vagas e militante do "sim" no plebiscito, reagiu assim:
- O "não" é suicídio, mas tem uma explicação: você vai morrer de qualquer jeito, então quer escolher a maneira de morrer.
Exatamente uma semana depois de uma expressiva vitória do "não" a uma proposta com condições muito menos estritas do que as alinhavadas neste domingo em Bruxelas, festejada alegre e pacificamente na Praça Syntagma, os gregos oscilam entre a incredulidade e a resignação. Saíram do Monte Olimpo para enfrentar as agruras do campo de batalha.
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Todos sabiam que o futuro não seria fácil, mas as exigências europeias avançam tanto na soberania grega que o termo "humilhação" passou a dominar todas as análises. Algumas atribuem o jogo tão duro dos líderes europeus a uma indisfarçável tentativa de derrubar o governo da coalizão de esquerda Syriza. Seria uma retaliação dos sócios mais poderosos ao que consideraram uma "traição" do primeiro-ministro Alexis Tsipras: a própria convocação do plebiscito.
O que era visto apenas como uma tese conspiratória passou a frequentar os discursos de políticos, inclusive das alas mais moderadas do Syriza, caso de Dimitris Papadimulis, vice-presidente da Eurocâmara, que afirmou a um canal de televisão grego:
- O que está em jogo aqui é uma tentativa de humilhar a Grécia e os gregos, ou de acabar com o governo de Alexis Tsipras.
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Politizados, muitos gregos dirigem sua irritação ao ministro de Finanças da Alemanha, Wolfgang Schauble, que utiliza uma cadeira de rodas para se locomover em decorrência de uma tentativa de assassinato em outubro de 1990, vinculada a uma disputa eleitoral. Até com mais frequência do que a chanceler Angela Merkel, é citado nas conversas sobre a interferência indevida dos alemães na política interna grega. É isso que eles querem dizer com "escolher a forma de morrer".