Tramita na Câmara de Porto Alegre um projeto que condiciona a plebiscito qualquer decisão sobre a privatização de empresas municipais. Aval popular é sempre importante, ainda mais em decisões sobre o futuro de bens públicos. Assim, não tenho qualquer objeção à iniciativa. Mas tomo a liberdade de discordar de um dos argumentos usados pelo autor da proposta, o vereador Cláudio Janta (SDD), que apontou a telefonia entre os casos de ineficiência resultantes das privatizações.
Com todos os defeitos que possui, o serviço telefônico é hoje muito melhor do que o proporcionado pela extinta CRT. Como sou mais velho que o vereador e muitos leitores, tomo a liberdade de relembrar a história. Naqueles tempos, o gaúcho tinha que pagar na frente e aguardar por tempo indeterminado para receber a sua linha. Em alguns casos, a espera chegava a cinco anos. Ainda nos anos 1980, dezenas de municípios gaúchos sequer eram ligados ao restante do país por DDD. As ligações ainda tinham que ser feitas via telefonista.
O telefone era de tal forma escasso que se criou um mercado paralelo em torno dele, com investidores faturando alto na compra, venda e aluguel de linhas. Era um negócio tão comum e lucrativo que os telefones tinham seção própria nos classificados dos jornais.
Melhor que imóvel
Alugar uma linha telefônica dava mais dinheiro e menos incomodação que a locação de imóveis, sempre sujeita às regras rigorosas da Lei do Inquilinato. Caro e difícil de conseguir, o telefone pesava bastante nas despesas de qualquer novo negócio. Bem valioso, o item era de presença obrigatória na declaração do Imposto de Renda.
Mais adiante, já nos anos 1990, quando chegou ao Rio Grande do Sul, a telefonia celular foi sinônimo de status. Além de entrar na fila, o interessado tinha que desembolsar uma pequena fortuna para "comprar" uma linha junto à CRT Celular.
Com a privatização, esse quadro inegavelmente mudou.
O acesso à comunicação foi democratizado e hoje o telefone está incorporado ao cotidiano de todas as classes sociais. O serviço é uma maravilha? Longe disso. Tem muitos problemas, tanto que sempre aparece entre os campeões de queixas nos serviços de proteção ao consumidor. Só que as falhas não decorreram da privatização em si, mas do fracasso dos governos e suas agências reguladoras na fiscalização das concessionárias.
Se o poder público fizesse a sua parte com mais eficiência, a situação seria bem melhor para os clientes.