Ana Caroline Oliveira Pereira, 25 anos, é de uma família de professores. Há seis meses, alfabetiza crianças de sete anos na Escola Estadual Aurélio Reis, na zona norte da Capital. E é adorada pelos alunos.
Ingressou no primeiro nível da carreira, na classe A, com uma jornada de 20 horas semanais e um vencimento básico de R$ 630,08 por mês. Recebe um complemento de R$ 328,81, como forma de equiparação ao valor proporcional a 20 horas do piso (R$ 958,89), além de vale-refeição, auxílio-transporte e gratificação de difícil acesso. A partir deste mês, passará a ganhar, ainda, um adicional de unidocência, concedido a quem é regente de classe. Em abril, o salário bruto não passou de R$ 1,3 mil.
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ENTREVISTA
- Sei de gente que desistiu da vaga ao ver esses valores. Amo o que faço e sou feliz por isso, mas a falta de valorização é decepcionante - afirma.
Além de dar aulas, Ana é fotógrafa e ainda estuda Pedagogia. Quando se formar, daqui a quatro anos, espera saltar para o nível 5. A perspectiva de crescimento reforça a defesa do plano de carreira, que para ela representa a garantia de um futuro melhor.
"Meu sonho era ter um carro"
Vania tem 26 anos de carreira na rede pública estadual
Foto: Mateus Bruxel
Com 26 anos de magistério público estadual, Vania Paiva Golgo, 61 anos, já perdeu as contas de quantos alunos passaram por ela. É uma professora de Educação Física dedicada e inquieta. Dá aulas em três escolas.
Ela contabiliza seis especializações, está no último nível da carreira, na classe B, e não pensa em parar de estudar.
- Estou indo para o meu sétimo curso de pós-graduação - diz.
Vania tem dois vínculos de 20 horas semanais (com vencimento básico de R$ 1.386 em cada um) e ainda cumpre mais oito horas, em uma rotina puxada. Recebe gratificações, abono de permanência (porque já poderia estar aposentada) e adicionais por tempo de serviço. Somando tudo, a remuneração bruta chega a R$ 7 mil mensais.
- Meu sonho era ter um carro, mas até hoje não consegui comprar. O pior é saber que o atual governo ainda quer mexer nas gratificações. Por que sempre bater no lado do mais fraco? - questiona a professora.
Como Ana, Vania diz que não aceitaria mudanças no plano de carreira. Na avaliação dela, isso resultaria em perdas e acabaria por prejudicar a categoria.
Helenir Schürer diz que não confia no governo
Foto: Júlio Cordeiro
"Querem reduzir e achatar salários"
Presidente do Cpers, Helenir Aguiar Schürer diz que não está no horizonte da categoria discutir o plano. Ela considera possível o pagamento do piso sem a necessidade de mudanças. Professora da rede estadual há 32 anos, está no nível 5 da carreira. Por dois contratos de 20 horas, recebe R$ 3,7 mil líquidos por mês.
- No Japão, até o imperador é obrigado a se curvar diante de um professor. Aqui, temos de brigar por valorização - lamenta.
A seguir, leia os principais trechos da entrevista.
Estado pagar o piso sem mexer no plano de carreira?
Sim. Se o Estado pagasse o piso, o teto para uma jornada de 40 horas semanais não chegaria nem a R$ 4 mil (sem contar vantagens e gratificações). Ninguém pode dizer que isso é demais. O problema é que o governo não prioriza a educação e não valoriza os professores.
Por que não atualizar o plano, se é considerado defasado?
O plano de carreira tem alguns pontos defasados, sim. Há quem diga que já cumpriu o objetivo, que desde o início foi estimular a qualificação dos professores. A questão é que a educação não é estática, e a qualificação nunca pode parar. O plano cumpriu o seu papel, mas esse papel ainda não acabou. O incentivo ao professor é necessário e, quando o piso for pago, será maior.
Mesmo que a maioria dos professores já esteja no topo da carreira?
Com certeza. Temos um grande número de professores que pensa em fazer doutorado. Muitos defendem a inclusão de novos níveis na carreira, justamente para estimular essa qualificação. O problema é que quem quer discutir o plano quer reduzir níveis e achatar salários. Não tem como negociar assim.
Não existe possibilidade de diálogo com o Piratini?
O governo do Estado, até agora, em suas decisões, está apontando para a redução de recursos para as políticas sociais e a inexistência de qualquer reajuste salarial até 2017. Em Santa Catarina, mexeram no plano e, no fim, o achatamento foi enorme. Por isso, aceitar uma discussão desta natureza só pode levar a retirada de direitos e a redução salarial. Qual é o sindicato que vai querer um diálogo com estas perspectivas?
De onde o governo do Estado tiraria o dinheiro para pagar o piso sem mexer na estrutura da carreira?
Pressionando o Congresso a votar a regulamentação dos royalties do petróleo, combatendo a sonegação e revendo as isenções fiscais. Até o final de 2014, o governo deixou de arrecadar R$ 13 bilhões por conta das desonerações. Isso seria mais do que suficiente para o piso. O que não pode é o governo dizer que não tem dinheiro e reajustar os próprios salários. Pedimos ao governador para vetar os aumentos. Ele disse que não poderia, porque era um dever constitucional. Mas não é dever constitucional cumprir as leis? Nesse caso, a prioridade é seletiva.
Existe a possibilidade de greve neste ano?
A partir do dia 9 de junho vamos começar uma grande caravana pelo Estado. Se o governo não apresentar uma proposta concreta, vamos começar a discutir a possibilidade de greve, sim. Mas tudo vai depender da categoria.
A ESTRUTURA DA CARREIRA
O plano divide a carreira em seis níveis e seis classes. A ascensão profissional dos educadores se dá nas duas dimensões.