Quem entrar no Espaço Cultural do Memorial do Ministério Público, a partir das 15h desta quarta-feira e até o dia 15 de junho, vai deparar com uma exposição composta por mais de 30 quadros. Os artistas não são famosos nem têm seus nomes grafados em livros de pintura. São jovens que fazem da arte uma maneira de esquecer os muros da Fundação de Atendimento Sócio-Educativo (Fase).
Trata-se de 17 internos da Comunidade Socioeducativa (CSE), na Vila Cruzeiro, em Porto Alegre. Nas galerias do prédio, eles têm oficinas de pintura, nas quais traduzem sentimentos para as telas.
- É um lugar para extravasar. Trabalharia com os mais inquietos, os mais nervosos, os mais quietos. Cercear a liberdade de alguém é algo muito sério. Fiz pensando neles, para extravasarem mesmo - afirma o professor e artista plástico Aloizio Pedersen, enquanto orienta jovens da Ala D em um dos encontros de duas horas, organizados de acordo com a rotina da CSE.
A iniciativa tem origem em outra atividade do professor, o Escola Sem Violência, criado na Escola Estadual de Ensino Médio Padre Reus, em 2006.
- Uma gurizada entrou destruindo o colégio, e eu iniciei este trabalho. Quem tentou destruir em um ano, no outro, participou da Bienal do Mercosul. A Fase me chamou em 2013, e começou o Artinclusão (também desenvolvido em outras unidades) - diz Aloizio.
Um dos internos que terá seus quadros na exposição "Paisagens Interiores" é Marcelo*, 18 anos. Para ele, que já tinha tido aulas com o artista plástico no Case Poa II, pintar os quadros é uma maneira de desligar do dia a dia marcado por privações.
- Quando estou aqui, penso só no quadro. Neste, cada um vê uma imagem - diz, enquanto coloca tinta sobre a tela.
Tomás*, 19 anos, conta que, com as oficinas, está "mais tranquilo".
- Procuro ficar livre. Aqui, nem parece que estamos trancados - reconhece.
"Atividades são essenciais"
As oficinas do Artinclusão não são elogiadas apenas pelos alunos do projeto. Direção e servidores da Fase comemoram a ajuda que elas dão aos internos. O trabalho de assistente social e psicóloga pode ser conjunto.
- A gente teve a experiência de atendimento individual a um menino que era bem fechado. Ele conseguiu falar enquanto pintava, bem tranquilo, falando da história da família, da experiência de ter ficado internado. Foi bem interessante - salienta a assistente social Marlize Viessiri.
Diretora da CSE - unidade que reúne os internos de perfil mais agravado - há três meses e servidora da instituição há 17 anos, Simone Weber afirma que as oficinas do Artinclusão são "um momento que eles têm para expressar os sentimentos":
- Essas atividades são essenciais.
Conforme a psicóloga Gabriela Cioccari, a escolha dos alunos - entre os cerca de cem internos - é feita por meio de uma avaliação técnica. Um dos critérios é envolver quem não participa de outra atividade.
- A ideia do projeto é pegar continuamente o guri. De três em três meses, tem uma exposição pronta - ressalta o professor Aloizio.
*Nomes fictícios para preservar a identidade dos jovens, em respeito ao Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).
A EXPOSIÇÃO
/// Abertura: às 15h desta quarta-feira, com a performance "Indizível" (a exposição termina em 15 de junho)
/// Onde: Espaço Cultural do Memorial do Ministério Público (Praça Marechal Deodoro, 110, Capital)
/// Atividade: às 15h30min desta quarta, será realizado o diálogo "A travessia da arte: um novo olhar sobre a inserção social e outras margens", com o professor e artista plástico Aloizio Pedersen e os professores da PUCRS Augusto Jobim do Amaral e Ricardo Timm de Souza.
/// Quadros: o valor arrecadado com os quadros é revertido integralmente aos adolescentes. As telas de 50cmx70cm custam R$ 100 e as de 1,2mx70cm, R$ 250. A compra é feita via mensagem inbox na página do Facebook do projeto Artinclusão ou pelo e-mail aloiziopedersen@bol.com.br.
*Diário Gaúcho