Há mais entre uma avenida pintada de verde e amarelo e uma manchete de jornal do que supõe nossa vã matemática. Após os protestos por todo o país, o Brasil dormiu e acordou sem saber ao certo quantos manifestantes passaram pela Avenida Paulista, ponto mais movimentado entre as manifestações de domingo.
Enquanto a Polícia Militar de São Paulo divulgava 1 milhão de pessoas, o instituto Datafolha garantia que os insatisfeitos não passavam de 210 mil. Em Porto Alegre, segundo a Brigada Militar, teriam sido mais de 100 mil nas ruas.
- Não tem nada muito técnico nesses cálculos. Tanto que, normalmente, dão um número redondo - analisa o estatístico Jéferson Daniel Matos, que atuou na Fundação de Economia e Estatística (FEE) e atualmente trabalha no Tribunal Regional do Trabalho (TRT).
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Atribui-se a Herbert Jacobs, professor de jornalismo da Universidade da Califórnia nos anos 1960, a modernização da estimativa de pessoas em multidões, utilizada até hoje como base para esses cálculos. À época, ele criou uma regra básica de densidade, que vai de um multidão "pouco densa" a um multidão "muito densa" - como em um ônibus lotado. Veja no gráfico:
Mas afinal, quem chegou mais perto do número real de manifestantes dos protestos antigoverno? Saiba como é feita a contagem de cada instituição e tire suas próprias conclusões:
Datafolha
Segundo Mauro Paulino, diretor-geral do instituto, calcular multidões "não é uma tarefa simples". Para os protestos de domingo, foram tiradas as medidas da Av. Paulista, desconsiderando os canteiros. A área de 16 mil metros quadrados foi dividida em setores, distribuídos entre uma equipe de 60 pessoas. Elas faziam a contagem de manifestantes por metro quadrado, do chão, de hora em hora.
- Esse é o ponto essencial para uma medição mais precisa. Se considerarmos apenas uma visão aérea e contarmos cinco pessoas por metro quadrado, chegamos naquele um milhão que a polícia divulgou - analisa Mauro.
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O procedimento ocorreu ao longo de toda a via, entre 14h e 18h. No "horário de pico", às 16h, o Datafolha registrou 188 mil pessoas no local. Ao todo, 210 mil teriam passado pelo protesto.
De acordo com o diretor-geral do Datafolha, o número da PM seria superestimado pois, mesmo considerando toda a extensão da Av. Paulista, sem excluir os canteiros (o que resulta em uma área de 135,5 mil metros quadrados), a capacidade da via seria de 950 mil pessoas.
Além da contagem, as equipes do Datafolha aplicaram questionários em uma amostragem de 330 manifestantes para saber o que horário em que chegaram ao local. Assim, o público foi dividido entre "persistentes", os que acompanharam o protesto do início ao fim, e "entrantes", que fizeram apenas uma parte do percurso. A soma dos dois dados resultou no total divulgado pelo instituto.
- É um trabalho importante, porque uma contagem errada era um peso político falso. Estão dizendo que o Datafolha diminuiu as manifestações de domingo. Não diminuímos nada, só demos a real dimensão. Não tinha um milhão de pessoas na Paulista.
Polícia Militar de São Paulo
Antes do fim do protesto na Paulista, a Polícia Militar de São Paulo divulgou que 1 milhão de pessoas teriam tomado as ruas na capital paulista. O número, questionado após a divulgação da estimativa do Datafolha, foi ratificado pela instituição em nota enviada à reportagem.
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Segundo a PM, o cálculo foi feito por uma ferramenta tecnológica chamada "Copom Online", que utilizaria recursos de mapas e georreferenciamento baseadas em imagens aéreas captadas por dos helicópteros Águia. Para realizar a contagem, foi adotado como constante o número de cinco pessoas por metro quadrado.
"A estimativa, apurada por volta de 15h40min, considerou a extensão da Avenida Paulista e da Praça Oswaldo Cruz até a Rua da Consolação, considerando, ainda, a ocupação das ruas adjacentes e paralelas, além do Vão Livre do MASP" - disse a instituição, em nota.
Brigada Militar
Em Porto Alegre, estimativas da Brigada Militar disseram que mais de 100 mil pessoas participaram do protesto. Subcomandante-geral da BM, o coronel Paulo Stocker diz que o método usado para fazer a contagem de manifestantes "é uma fórmula bastante simples".
De cima da passarela da Av. Goethe, os policiais observaram a movimentação ao longo de toda a via a partir das 15h. Segundo o coronel Stocker, a média ficou entre cinco e seis pessoas por metro quadrado (bastante densa, conforme o método Jacobs) durante todo o trajeto. Ainda assim, a BM preferiu usar quatro pessoas por metro quadrado para o primeiro cálculo: 45 mil manifestantes:
- Depois disso, observamos um grupo que carregava uma faixa preta, posicionado no fim da via. Quando ele completou o trajeto, a Goethe seguia cheia. Aí chegamos em 90 mil pessoas - explica Stocker.
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Os 10 mil restantes seriam as pessoas que seguiram transitando pela via "por cerca de 10 minutos após a última contagem", somados a pessoas que ocupavam "os barrancos e o interior" do Parque Moinhos de Vento.
- Mesmo depois do protesto, ainda tinha gente chegando - diz Stocker.
De acordo com o subcomandante, também foi feita uma contagem com base em imagens aéreas registradas pelo helicóptero da Brigada Militar, que teria chegado a um número ainda maior: 115 mil.
- Preferimos manter o cálculo por baixo para não superestimar. Mas que tinha mais de 100 mil, tinha. Só não sabemos o quanto.
*ZERO HORA