Nunca houve festa igual. Claro que o Gigante construído sobre o Guaíba já viveu momentos inesquecíveis, desde sua inauguração há 45 anos até as conquistas nacionais da década de 1970 e as glórias internacionais dos anos 2000.
Mas o espetáculo que levou às lágrimas e à euforia quase 50 mil torcedores na noite de sábado não comemorou um título. Celebrou todos. A torcida não vibrou com um gol, mas com cada vez em que um atleta de vermelho cruzou a meta adversária. Festejou não somente um ou outro craque, mas o celeiro de ases em que todos eles brilharam a seu tempo e à sua maneira.
Veja imagens da festa:
A partir da contagem regressiva gritada a plenos pulmões pelo estádio ainda no começo do show de reabertura do Gigante, nem o mais otimista torcedor poderia imaginar a grandiosidade do evento que estava por começar combinando música, luzes e projeções sobre uma superfície branca no gramado e em uma tela circular pendurada sobre o círculo central do campo. A apresentação feita ao vivo pelos ídolos Fernandão, Figueroa e D'Alessandro foi o estopim de uma explosão de alegria e emoção.
- É nosso! É nosso! - gritou D'Ale, em uma referência ao retorno do Beira-Rio, levando à loucura a torcida.
Imagens projetadas em uma espécie de tela que ocupou todo o gramado transformaram aquele retângulo gigante nas águas do Guaíba e, ao mesmo tempo, em palco sobre o qual um balé de 800 dançarinos representou a construção do Beira-Rio. Nesse painel, os colorados também puderam rever o gol inaugural de Claudiomiro e muitos outros ídolos que gravaram depoimentos e estiveram presentes na festa como Falcão e Dario.
Com a mesma emoção, o público testemunhou as glórias dos anos 70 - com direito à reprodução, ao vivo, do "gol iluminado" de Figueroa. O ídolo, desta vez iluminado pela luz solitária de um refletor, repetiu a cabeçada disparada contra o Cruzeiro na mesma grande área em que, no distante 1975, garantiu o título nacional para o Colorado. No novo palco colorado, correu para o abraço dos velhos companheiros de jornadas gloriosas. Outra vez, 39 anos após a jogada original, um Beira-Rio lotado vibrava com seu zagueiro.
A reencenação da década serviu, ainda, para a apoteose de Paulo Roberto Falcão. Após a lembrança do gol antológico marcado contra o Atlético Mineiro em 1976, quando tabelou de cabeça com Escurinho, panos caíram no centro do gramado e revelaram o ídolo colorado fardado com a tradicional camisa 5. Foi aplaudido de pé.
Os anos 80, os anos do "quase", e a década de chumbo dos 1990 até pareceram menos terríveis na montagem de Edson Erdmann. Mas quem estava lá sabe que só os colorados de fé resistiram. Ou seja, praticamente todos. E boa parte desses pôde assistir, tanto ao vivo quanto na festa de sábado, às conquistas gloriosas do século 21.
Após a representação de uma batalha campal que simbolizou as agruras de uma Libertadores, os campeões da edição de 2006, entre eles Abel, Alex, Índio, Tinga, Sobis e Clemer foram ovacionados. Vídeos lembraram as demais conquistas da década que transformaram o Colorado no Campeão de Tudo. Fernandão resumiu em uma frase como o valoroso Colorado conseguiu derrotar o mítico Barcelona na final do Mundial - jogo revivido em depoimentos e imagens no sábado.
- A gente entrou em campo e deu porrada neles - afirmou, para delírio das arquibancadas.
Só a reprodução do gol de Adriano Gabiru foi mais celebrada. Ao final dos 13 segundos em que seu gol foi novamente construído desde o campo do Inter até a meta catalã, o atleta foi carregado nos braços pelos colegas daquele timaço. Quando a apresentação rumava para o final, as diferentes gerações de craques presentes se uniram no centro do gramado sob o Hino do Internacional. Foi a deixa para o estádio em peso entoar o cântico:
- Ô, o Beira-Rio voltou!
Em uma das grandes surpresas da noite, imagens de jogadores foram projetadas em um telão erguido por um guindaste do lado de fora do estádio, dando a impressão de que Gigantes de verdade observavam de fora a nova casa colorada. Mas o espetáculo não promoveu apenas o reencontro da torcida com seu estádio ou com o passado do clube pelo qual morrem de amores.
Os colorados resgataram sua própria trajetória durante as duas horas e meia de apresentação, como o empresário de Bento Gonçalves Leonel Giordani, 80 anos. Ele levou consigo para as arquibancadas três filhos, sete netos, uma nora e dois genros. E relembrou os primeiros momentos dessa paixão pelo Inter que já se estende por oito décadas, três gerações e encanta até a neta Carolina, de cinco anos.
O empresário conta que, quando viu pela primeira vez uma montanha de terra empilhada onde antes chapinhavam as águas mansas do Guaíba, no ponto em que começava a ser construído o Gigante da Beira-Rio, não acreditou que a empreitada insana pudesse ter sucesso.
- Perguntei o que era aquele monte de terra e me disseram que seria o novo estádio do Inter. Eu disse: "impossível" - relembra Giordani.
A festa terminou projetando uma nova era de conquistas vermelhas no novo Beira-Rio, a superação de tudo o que já foi realizado pelo glorioso Internacional. Impossível?
O torcedor colorado Leonel Giordani uma vez ousou duvidar dos feitos do Sport Club Internacional. E, neste sábado, lá estava ele, comovido, revendo a história que ajudou a construir, com mais metade do Rio Grande, no estádio que ele viu literalmente ser erguido das águas do Guaíba. Que festa. Nunca houve uma igual.