Responsável por denunciar a compra de apoio parlamentar no Congresso em 2005, a qual batizou de mensalão, o ex-deputado federal Roberto Jefferson (PTB-RJ) foi o último réu preso no processo que abalou o governo Lula, manchou a reputação do PT e, ao punir e mandar para a cadeia políticos influentes, se tornou um marco na história do país.
Às 12h21min desta segunda-feira, 3.183 dias depois de revelar em uma entrevista ao jornal Folha de S.Paulo, em 6 de junho de 2005, como funcionava a negociata, o delator do esquema assinou na sua casa, em Levy Gasparian (RJ), o mandado de prisão emitido pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Em seguida, arrumou as malas e, no carro da Polícia Federal, saiu rumo à prisão.
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- Não sou melhor do que ninguém. Não sou santo. Tenho defeitos, mas também virtudes. Não é à toa que fui eleito seis vezes deputado federal - declarou o petebista, 60 anos, antes de ser detido.
E também não foi em vão que Jefferson contou o que sabia. Acuado pela denúncia de um esquema de corrupção nos Correios, do qual foi apontado como chefe, o então deputado e presidente nacional do PTB virou alvo e decidiu se defender atacando.
Na histórica entrevista, Jefferson garantiu que a compra de apoio político de parlamentares durante o governo Lula era articulada pelo PT e chefiada pelo então ministro da Casa Civil, José Dirceu. O dinheiro, segundo o delator, vinha de operações estatais e do setor privado.
Ao abrir o jogo, Jefferson poupou Lula. Mas suas críticas ecoaram e abriram uma crise política, que desestabilizou o governo e fez sucumbir o comando do PT. Dez dias após surgir o escândalo, Dirceu saiu da Casa Civil. De volta à Câmara, o ex-ministro ainda protagonizou um duelo apimentado com o delator. Ambos terminaram o ano com o mandato cassado.
Mas foi somente sete anos depois disso - em 2012 - que o STF julgou o mensalão e condenou 25 pessoas por envolvimento no esquema, incluindo Dirceu e Jefferson. Réu confesso, o delator do "maior e mais atrevido esquema de corrupção da história", como definiu o então procurador-geral da República, Roberto Gurgel, esperava pela prisão desde novembro do ano passado.
Sem arrependimentos nem planos
Nos últimos três meses, Jefferson viu 18 réus do processo irem para a cadeia. Chegou até a reclamar da agonia, diante da demora do inevitável desfecho do seu caso. Condenado por corrupção passiva e lavagem de dinheiro, ele cumprirá a pena de sete anos e 14 dias em regime semiaberto. Por decisão da Justiça, não terá direito à prisão domiciliar, requisitada diante de problemas de saúde decorrentes de um câncer.
Na iminência da detenção, Jefferson escreveu em seu perfil no Twitter que cumprir a pena na cadeia é "mais uma provação". Antes de ser preso, fez questão de falar com a imprensa. Disse lamentar a perda da liberdade, mas frisou que caiu de pé. Voltou a afirmar que acredita que o país melhorou após a denúncia. E negou se arrepender de seus atos no caso do mensalão:
- Fui condenado, não tenho o que esconder. Caí de pé. Não me ajoelhei e fiz da minha maneira. O Brasil melhorou. E os políticos melhoraram seu comportamento. Não dá mais para brincar com a opinião pública nacional.
O ex-deputado não quis revelar se considera justa sua condenação. Disse que encara sua prisão "com serenidade, equilíbrio, paciência e humildade". Revelou, ainda, não ter nenhuma proposta de emprego, o que pode lhe permitir a deixar a prisão durante o dia.
Também afirmou que as negociações para venda de seu escritório de advocacia no centro do Rio estão bem encaminhadas. O dinheiro será usado para pagar parte da multa de R$ 720 mil imposta pela Justiça. Ele espera juntar o restante com doações de correligionários do PTB.
Antes de ser levado ao Instituto Médico-Legal (IML) para exame de corpo de delito, Jefferson agradeceu a cortesia da polícia, que o deixou tomar banho, trocar de roupa e almoçar antes de sair de casa. À noite, o o ex-deputado chegou à Casa do Albergado Coronel PM Francisco Spargoli Rocha, em Niterói, onde cumprirá pena. Na mala, levou a Bíblia e dois livros sobre a história do mundo e do século XX. Questionado sobre o seu futuro político, foi sucinto:
- Vou ter tempo (para pensar) - declarou, ainda pela manhã, quando vestia uma camiseta que estampava a frase "Livre para sempre", escrita em inglês.