Desde a semana passada, a maior das 33 bibliotecas da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), com 188 mil títulos, está interditada para alunos, professores e outros pesquisadores. Apenas funcionários têm acesso à Biblioteca Setorial de Ciências Sociais e Humanidades, no Campus do Vale, na Capital.
Cerca de 10% do acervo, segundo estimativa dos bibliotecários, foram danificados após um vazamento de água em um cano rompido, localizado no andar superior, acima da biblioteca. Paramentados com máscaras e luvas cirúrgicas, 15 funcionários, além de bolsistas, trabalham das 8h às 18h na recuperação dos volumes. As páginas molhadas são secadas uma a uma, com folhas absorventes, em um trabalho minucioso e demorado.
- Não podemos ficar muito tempo aqui porque esse ambiente é insalubre - relata a bibliotecária-chefe Karen Ribeiro de Freitas Irizaga.
Em uma visita ao local, ontem, ZH testemunhou um clima desolador. Livros molhados estão distribuídos pelo chão e pela mobília. Na sala de estudos, os volumes estão até pendurados em varais. Mesas de leitura e estantes também foram danificadas, mas o estrago ainda não foi contabilizado.
- É uma pergunta que todo mundo nos faz, mas não temos condição de avaliar porque não terminamos o trabalho. Ainda estamos retirando os livros e secando - diz Karen.
A parte mais afetada foi a Coleção Especial, que inclui livros raros, como uma série de obras do filósofo Voltaire (1694-1778), em francês, datada de 1978, e um vocabulário da língua italiana editado em Florença, em 1903. Também foram danificadas obras do acervo do professor Balthazar Barbosa Filho, morto em 2007, que conta com 10 mil títulos, dos quais 3 mil estavam no salão onde houve o vazamento. A biblioteca também compreende títulos de áreas como Letras, Ciências Sociais e História, atendendo principalmente alunos de graduação e pós-graduação da universidade.
Nesta semana, o atendimento aos usuários passou a ser realizado de segunda a sexta-feira, do meio-dia às 14h. Podem ser retirados livros que estejam em boas condições, na avaliação dos bibliotecários, que atendem os pesquisadores na porta. O acesso ainda é restrito aos bibliotecários, e as persianas das janelas permanecem fechadas.
Água foi cortada para evitar novos vazamentos
O problema no cano que encharcou a biblioteca teria ocorrido entre os dias 31 de dezembro e 1º de janeiro, período de recesso, segundo Soraya Vargas Côrtes, diretora do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH) da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Ela relata que funcionários teriam identificado o vazamento na manhã do dia 2 de janeiro.
- Era um cano que levava água para um bebedouro no corredor do andar de cima. Pedi aos engenheiros da universidade que não corra mais água, nem acima e nem abaixo da biblioteca. O prédio vai ficar sem água, mas é melhor fazer isso do que correr o risco de que aconteça novamente. Vamos tentar investigar (o que ocorreu), mas não tem testemunha de nada. Só vimos vazando - diz Soraya.
A diretora do IFCH busca, com a reitoria da universidade, recursos para a renovação do mobiliário danificado. Não há previsão de reabertura da biblioteca, mas ela afirma que haverá um esforço para que a normalização ocorra até o reinício das aulas, no dia 24 de fevereiro.
O professor do Departamento de História da UFRGS, Francisco Marshall, um dos usuários da biblioteca, entende que há desafios pela frente:
- Houve uma quebra na atualização do acervo desta biblioteca nas décadas de 1980 e 1990. Nos anos 2000, isso começou a ser recuperado. A descontinuidade da atualização é pior do que uma enchente. O maior dano causado à biblioteca não foi da água, e sim da falta de consistência na política de bibliotecas das universidades brasileiras, e da UFRGS em particular.