Pequenos youtubers, grandes futuros. Este é o nome de uma página no Facebook com mais de mil membros que revela um mantra de muitos adolescentes. Não é que eles se julguem empreendedores, mas encontraram no canal de vídeos da internet uma forma de ter fama e prestígio, além de uma vitrine para testar habilidades.
Com isso, toda aquela discussão sobre o quanto é saudável deixar o filho por horas na frente do computador ganha outro viés: eles podem estar delineando uma carreira profissional e ganhando dinheiro com isso desde cedo. As histórias que você vai conhecer aqui mostram o quanto esses jovens levam a sério o seu negócio online. A pedido de ZH, cada um dos personagens desta reportagem produziu um vídeo para contar a sua história.
João Adolfo já custeia seus luxos
Com 128 mil inscritos no canal ADOLFzZ, João Adolfo Zimmermann, 17 anos, de Novo Hamburgo, no Vale do Sinos, consegue manter uma certa independência financeira. Já ganhou R$ 5 mil com alguns vídeos quando estava com a produção de gameplay em alta: posta pelo menos um por dia.
O faturamento ajudou a custear alguns luxos no intercâmbio recente à Nova Zelândia, como passeios e salto de bung jump, um celular novo, tatuagem de R$ 1 mil e parte da aparelhagem dos jogos. O adolescente grava a própria performance desde 2011 e, até hoje, se surpreende com os frutos do trabalho: ganha produtos de algumas empresas.
- Sempre fui de me virar. Não gosto de depender do meu pai. Com a produção de vídeos, eu mesmo me mimo - disse.
A habilidade com o marketing, descoberta no mundo virtual, ajudou a escolher a profissão. Ele pretende prestar vestibular para Publicidade e Propaganda.
Filipe fala sobre games
Estes pequenos que aprendem na velocidade de um clique do mouse trazem um conjunto de características: dedicação, perfeccionismo, engajamento e auto cobrança. Tá aí o Filipe Rosa, 13 anos, para servir de exemplo. Ele é um dos primeiros da turma de 7ª série, em Porto Alegre, a começar um canal de gameplay, o filipegames44.
A modalidade consiste em capturar a tela do computador com um programa próprio para isso e gravar a sua voz narrando enquando joga. A ideia é dar dicas sobre os jogos. Depois do material pronto, edita o vídeo e posta no YouTube. Aprendeu olhando os mais experientes e faz tudo sozinho.
Com a missão de atualizar o canal uma vez por semana, conquistou 241 inscritos. Está longe de ser um canal grande, por isto está sempre maquinando uma estratégia para aumentar o número de seguidores. Já fez sorteio de jogos e pretende confeccionar camisetas para brinde.
Pedro aposta no humor
Filipe incentivou o colega Pedro Nunes, 13 anos. Com o tempo, o garoto que tem dotes artísticos migrou para vídeos de humor, fundou "O pessoa". Passa horas observando trejeitos nas ruas e situações do cotidiano para escrever os roteiros - todos feitos no Ipod. Pediu para a mãe uma câmera mais potente para capturar as imagens e leva cerca de quatro horas entre decorar o texto, montar figurino e percorrer os cômodos da casa como cenário para as brincadeiras.
O número de inscritos dos dois e visualizações são baixas. Com paciência, levam as postagens como se fosse um negócio, e sonham quando faturarem as primeiras quantias. Mas carregam nítidas as características desta nova geração, chamada de nativos digitais. Para estes jovens, trabalho e diversão se misturam. Com a tecnologia ao seu dispor, andam com a criatividade a mil.
Todos concordam também que ajuda a melhorar o inglês e também a ampliar a rede de contados.
Nayany dá dicas de como se maquiar para festas
Dona de um arsenal de pincéis, rímeis, batons e sombras, Nayany Hächler Müller, 18 anos, criou no ano passado um canal de maquiagem no YouTube, que leva os dois primeiros nomes dela. Com elegância e simpatia, dá dicas sobre como se pintar para uma festa, para o dia a dia, quais tons combinam entre si e por aí vai.
- Aprendi a me maquiar fazendo os vídeos. Assistia aos meus erros e tentava melhorar, olhava a opinião das pessoas. Hoje é engraçado, pois tem gente que me reconhece, pergunta se eu sou aquela que faz os vídeos na internet. É divertido - disse.
Ela levou seis meses até que chegasse nesse nível e já tem mais de 3,4 mil inscritos, batendo as mil visualizações por produção. A jovem comemora os US$ 40 por mês que já fatura e também o assédio de algumas marcas que a procuram para testar produtos.
Busca de prestígio
Roberto Tietzmann, professor da Faculdade de Comunicação Social da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), diz que fazer circular os dons de cada um na internet gera um prestígio quantificado, pois se consegue mensurar quantas foram as visualizações da performance e que tipo de comentários ela gerou, fomentando a competição:
- É uma disputa pela atenção das pessoas, mas não quer dizer que quem não conseguiu está perdendo, só não está ganhando tanta atenção. Esta é a lógica deles.
Léa Fagundes, especialista em psicologia do desenvolvimento humano e coordenadora do Laboratório de Estudos Cognitivos da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), pondera que a dificuldade é saber como as escolas estão preparadas para lidar com esta geração.
- A escola tem de mudar, estamos em uma nova era, em que a cultura digital revolucionou o conhecimento. A escola tem de pensar em todos os recursos do momento e não só colocar o computador à disposição - analisa Léa.
Assista aos bastidores da criação de vídeos