O caso do detento do regime semiaberto que retirou a tornozeleira e foi preso ao praticar extorsão expõe as fragilidades do monitoramento eletrônico de presos.
Especialistas apontam que o sistema se mostra vulnerável, pois pode ser corrompido e não prevê a inclusão social do apenado. Autoridades da segurança insistem que os números dos primeiros quatro meses comprovam a eficácia da iniciativa.
Alexsandro Soares Rodrigues, que deveria estar cumprindo pena com o benefício do monitoramento, foi preso na terça-feira cometendo um crime e confessou ter retirado a tornozeleira.
Após diagnóstico de que houve erro humano na colocação do equipamento usada por ele - uma folga de 1cm entre o objeto e o tornozelo do preso, permitiu que ele retirasse o aparelho - a Secretaria de Segurança Pública defende que a falha foi um fato isolado.
A posição do chefe da divisão da monitoramento eletrônico da Superintendência dos Serviços Penitenciários do Estado (Susepe), Cezar Moreira, é de que o episódio não compromete o saldo positivo do programa, que segundo ele, chega a 96%:
- Precisamos melhorar a eficiência na captura dos presos. Para algo inovador, a experiência é fantástica.
Juiz da Vara de Execuções Criminais (VEC) da Capital, Paulo Augusto Oliveira Irion concorda que o caso atípico não demonstra fragilidade do sistema:
- Temos menos de 5% de fugas no monitoramento eletrônico. Se comparado à fuga do semiaberto, é pouco. Além de ser eficiente, é mais barato.
Irion diz que há presos esperando para usar e, no que depender da VEC, mais tornozeleiras serão usadas.
Especialistas defendem adoção de outras medidas
Responsável pela investigação do caso de Alexsandro, o delegado Juliano Ferreira acredita que a grande dificuldade é avaliar se o objeto é um equipamento confiável. Segundo ele, a maioria dos crimes graves é praticada por apenados no semiaberto, por isso, dizer que o sistema funciona é "hipocrisia".
Para o consultor em segurança pública Marcos Rolim, no Exterior a tornozeleira é usada para evitar que as pessoas sejam presas em crimes de menor gravidade, onde se estabelece restrição de liberdade, pena inexistente no Brasil. Para o Estado, ele considera que o efeito nulo:
- Saber onde o sujeito está não ajuda a prevenir a ocorrência de delitos. Cria-se um mecanismo extra de cumprimento de pena, mas pouco se faz para inserir o apenado na sociedade.
Presidente da ONG Brasil Sem Grades, Luiz Fernando Oderich, acredita que o semiaberto foi criado para diminuir custos do Estado, mas na prática, representa desperdício de verba, e defende a construção de novas prisões.
OS PRIMEIROS MESES
O sistema de monitoramento eletrônico de presos a foi implanto em 27 de maio no Rio Grande do Sul:
l No total, 666 presos do semiaberto das regiões Metropolitana e Vale do Sinos já receberam tornozeleiras
l Desses, 11 foram presos cometendo crimes (1,65% do total)
l Um retirou o objeto sem danificar
l 24 tornozeleiras rompidas (3,60%)
l 22 foragidos (3,30%)
l R$ 260 é o custo de cada equipamento por comodato
l R$ 1,2 mil é o custo para manter o apenado no sistema semiaberto
Fonte: Susepe
Programa
l Com a tornozeleira, o monitorado não ocupa vaga no sistema prisional, já que dorme em casa. O programa é personalizado para cada um e vai delimitar a rota e o tempo necessário para percorrê-la, determinando horários para chegar e sair do trabalho e de casa. Se houver tentativa de rompimento do equipamento ou fuga da rota, por exemplo, um alerta será acionado na Central de Monitoramento da Susepe, via internet.
Adesão
l Os sentenciados devem se enquadrar em critérios como adesão voluntária, estar trabalhando, ter residência fixa e boa disciplina. Após o preso assinar o documento concordando, a autorização depende do deferimento da Vara de Execuções Criminais.
Tornozeleira
l Feita em borracha, com fibra ótica por dentro, mede 9 cm de largura e tem uma bateria acoplada, com carga de 24 horas de duração. Quando a bateria estiver no fim, a tornozeleira vibrará. O próprio monitorado terá obrigação de recarregá-la na luz diariamente. Os equipamentos foram adquiridos em regime de comodato (espécie de aluguel).
Monitoramento
l Cada preso tem sua rota monitorada entre a casa e o local de trabalho, com o cálculo de tempo máximo para o deslocamento. Dependendo do tipo de crime que cometeu, haverá áreas de exclusão do trajeto, de onde não poderá se aproximar. Como exemplo, o assaltante de bancos nas agências.
Acompanhamento
l Os usuários das tornozeleiras têm atendimento de duas assistentes sociais por telefone, que recebem cerca de 300 ligações por dia. Também será criado um centro de atendimento à pessoa monitorada. Ainda sem local fixo, funciona atualmente de forma experimental e descentralizada em prédios da Secretaria de Segurança.