Um dos maiores atletas brasileiros de todos os tempos, dono de cinco pódios olímpicos, em seis participações, Robert Scheidt acabou favorecido pelo adiamento dos Jogos Olímpicos de Tóquio. Após um 2020 de resultados abaixo do esperado, o velejador de 48 anos, aproveitou o período de paralisação das competições para se preparar melhor, o que lhe valeu a conquista de um segundo lugar em um torneio em Portugal, no mês passado.
— A pandemia é uma coisa muito triste, muitas vidas perdidas, para mim foi um momento de apreensão, meses difíceis, do início até agora. Mas, pelo lado esportivo, esse tempo a mais que proporcionou teve um impacto positivo. Em 2020, eu não vinha muito bem, então nesse ano a mais que tive, consegui me organizar melhor, me preparar melhor e mexer na preparação. E meu nível se elevou, esse tempo a mais foi benéfico — disse o atleta, nesta quinta-feira (7), em entrevista virtual desde Sirmione, na Itália, onde mora.
Scheidt reconhece que a disputa dos Jogos de Tóquio, por causa da pandemia, será completamente diferente das competições anteriores.
— O ponto principal é que, antes e durante os Jogos, é evitar uma infecção ou um teste positivo, isso pode te tirar dos Jogos, seria um momento muito crítico e difícil para qualquer atleta. O cuidado principal é não se infectar nem antes nem durante. Uma coisa secundária é a mudança de rotina, ao que parece a gente não vai ter uma liberdade de sair, dar uma caminhada, comprar alguma coisa, quebrar um pouco a rotina. Vai ser uma rotina muito restrita para todos os atletas e isso tem seu peso.
O brasileiro acredita em uma disputa mais equilibrada no Japão, pois os velejadores não poderão conhecer o local disputa, se adaptar aos ventos e às correntes marítimas.
— Devido a pandemia, nenhum atleta conseguiu se preparar de maneira perfeita. Normalmente na vela, os atletas se deslocam para o local de competição muitas vezes para se adaptar a raia, ao vento, ao mar, enfim, ao clima, que é tão importante no nosso esporte. E, dessa vez, ninguém teve muitas chances de treinar na raia olímpica. Eu acredito que chegar em cima da hora, em um evento de grande pressão, pode ser um ponto a meu favor. Eu já passei por muitas situações em seis Olimpíadas, pois o lado mental, a calma, a tranquilidade em função de ter vivido muitas coisas, pode me ajudar em um torneio em que esse reconhecimento do local da disputa não pode ser explorado. Em relação às condições, a raia em Enoshima pode mudar de tempo, de vento fraco a forte. Não predomina uma condição e tem que estar pronto para o que vier. Serão seis dias de competição e, naturalmente, vai haver variação no clima. E isso me favorece. Sou um velejador que cobre bem tanto vento forte como fraco. Então, seria mesmo bom que não tivéssemos a mesma condição a semana toda.
Esta será a sétima participação do paulista em Jogos Olímpicos, um recorde entre os atletas brasileiros.
— Em cada Olimpíada existe bastante ansiedade, seja na primeira ou na sétima. E isso não vai mudar. O importante é que essa ansiedade não chega a um patamar que atrapalhe a performance. Eu quero muito lutar por uma medalha, representar bem o meu país mais uma vez e, com certeza, não vou conseguir escapar da ansiedade, mas vou ser capaz de controlá-la para que não atrapalhe a minha velejada —garante o 11 vezes campeão mundial e bicampeão olímpico da classe laser.
Um fator de preocupação para Schedit é a idade. Apesar de se sentir bem aos 48 anos, completados no último dia 15 de abril, ele sabe que seu corpo requer maiores cuidados.
—Essa é uma questão crítica. Com a idade, o principal é o tempo de recuperação e o maior risco de lesão. Equilíbrio e a qualidade do treinamento são fundamentais. Se antes, com 20-30 anos, minha filosofia era fazer mais que os outros para que o resultado viesse como consequência, hoje, não consigo mais fazer dessa forma, porque vou acabar me machucando e isso é contraproducente. Hoje em dia, meu volume de trabalho é bem menor que antes, mas com qualidade e intensidade maior. Essa é a grande mudança. Também é preciso saber escutar o corpo, quando ele precisa de descanso ou está prestes a se lesionar. Também é importante contar com a ajuda de bons profissionais de fisioterapia e preparação física. Tem também as coisas simples, que muita gente negligencia, como alimentação regrada e sono. Agora, tenho uma rotina ainda mais regrada. E por ter feito tudo isso sempre, ainda tenho chance de seguir usando meu corpo em alta performance. Ele me permite fazer esse abuso, que são essas velejadas de Laser, especialmente nos ventos fortes
Em Tóquio, Robert Scheidt acredita que a disputa será bastante acirrada.
— No momento, um dos nomes mais fortes para os Jogos é o alemão Philipp Buhl, que é o atual campeão mundial e venceu em Vilamoura com um ponto a mais do que eu. Ele está em uma fase boa e, aos 30 anos, é experiente. Em relação aos outros nomes, temos o Matt Wearn, da Austrália e o Sam Meech. Mas ainda é uma incógnita como eles chegarão a Tóquio. Eles estão treinando isolados em seus países e não tive oportunidade de velejar contra eles em 2021. Só tive contato com os atletas norte-americanos, europeus e sul-americanos. Além desses, velejadores da Croácia, Chipre e França, no caso o Jean Baptist Bernaz, que é meu companheiro de treino, são nomes fortes. Acredito que teremos dez a 12 atletas lutando pelas três medalhas e acredito que estou entre eles. A Laser é muito forte, com uma grande representatividade no mundo e é a classe na qual o velejador faz a diferença. Quando a gente chegar na Olimpíada, todo o material vai ser fornecido pela organização - vela, mastro e barco - então, o que conta é a maneira como se veleja, as escolhas táticas.