Tribunas de imprensa em arenas são frias demais. Em meio às preocupações com o material que temos de produzir, corremos o risco de não captar a emoção do jogo. Por isso eu sabia, quando fui designado a cobrir o confronto do tênis de mesa em que o brasileiro Hugo Calderano tentaria uma vaga entre os oito melhores da Olimpíada, que meu lugar tinha de ser no meio da massa.
A escolha de assento era óbvia porque nos jogos anteriores de Hugo a torcida se transformou em protagonista. Ao se comportar como se estivesse em um estádio de futebol, causou polêmica. Tanto que o sérvio Aleksandar Karakasevic chegou a protocolar uma reclamação formal na Federação Internacional da modalidade por conta do barulho. Depois de acompanhar da arquibancada a eliminação de Hugo diante do japonês Jun Mizutani, arrisco-me a dizer que o Pavilhão 3 do Riocentro é a Bombonera do tênis de mesa.
Leia mais:
Austrália é o primeiro país a ser medalha de ouro no rugby sevens
Rogerinho é eliminado por Monfils na segunda rodada da Olimpíada
Russa Yana Egorian supera compatriota e conquista o ouro no sabre individual
A modalidade não permite que o torcedor fique muito perto dos jogadores, já que há uma área ampla para permitir a livre movimentação dos atletas em volta da mesa. Ainda assim, a brasileirada do Riocentro proporciona ao adversário a experiência mais próxima do popular "bafo na nuca", tão característica dos estádios do Interior e da mítica casa do Boca Juniors.
Mizutani sentiu o drama logo na entrada. Hugo foi anunciado e, enquanto caminhava em volta das outras mesas para chegar ao local do jogo, ouvia seu nome entrecortado pelo barulho ensurdecedor da bateção de pés sobre o tablado das arquibancadas temporárias.
Durante o jogo, vaias no momento em que Mizutani preparava seu saque. Em um momento do jogo, uma bola do japonês atingiu a quina da mesa, e ele, como é praxe quando isso ocorre no tênis de mesa, pediu desculpas a Hugo. Pronto. Foi a senha para o caldeirão explodir em apupos, motivando Mizutani a levantar os dois braços e estender as desculpas aos torcedores. Não foi suficiente. Um grupo sentado atrás do japonês chegou a puxar um coro de "uh, vai morrer!".
A cada ponto de Hugo, torcedores gritavam de pé, os braços levantados em sinal de comemoração. Quando o brasileiro engatava três, quatro pontos seguidos, vinham os cânticos. O repertório era largo, do "vai pra cima deles Hugo" até o irreverente "o Hugo é melhor do que o Neymar".
Os mais céticos diriam que essa gritaria toda não adiantou, já que Mizutani superou o clima hostil e eliminou o carioca de 20 anos da Olimpíada. Só que Hugo é o número 54 do mundo e, empurrado pela torcida, ficou entre os 16 melhores dos Jogos, igualando a melhor campanha do país, de Hugo Hoyama em 1996.
Na sexta-feira, o caldeirão vai rugir de novo, já que o Brasil inicia sua participação na competição por equipes feminina contra a China, e masculina diante da Coreia do Sul. E como diz um velho canto de arquibancada de estádio, chinesas e coreanos que se preparem, porque o bicho vai pegar.
*ZHESPORTES