Pelo menos quatro atletas profissionais de futebol firmaram acordo de não persecução penal (quando o acusado negocia cláusulas para extinguir ou diminuir sua pena) com o Ministério Público de Goiás (MP-GO), no curso da segunda fase da Operação Penalidade Máxima, em que reconheceram a prática de crimes envolvendo fraudes em apostas esportivas e deixaram de ser processados criminalmente.
Dentre os quatro, três deles atuavam em clubes do Rio Grande do Sul à época dos fatos, entre o segundo semestre de 2022 e o início de 2023: Nikolas Santos de Farias, do Novo Hamburgo, Emilton Pedroso Domingues, o Jarro, ex-São Luiz e hoje no Inter-SM, e Onitlasi Junior Moraes Rodrigues, o Moraes, ex- Juventude e hoje na Aparecidense-GO. O outro jogador a firmar o acordo foi Kevin Joel Lomónaco, do Bragantino.
Durante interrogatórios na fase inquisitorial da investigação, eles reconheceram a prática do delito previsto no artigo 41-C do Estatuto do Torcedor (lei 10.671): "Solicitar ou aceitar, para si ou para outrem, vantagem ou promessa de vantagem patrimonial ou não patrimonial para qualquer ato ou omissão destinado a alterar ou falsear o resultado de competição esportiva ou evento a ela associado".
A pena prevista é de reclusão de dois a seis anos e multa, mas eles se livraram ao assinarem o acordo de não persecução penal, previsto no Código de Processo Penal: "Não sendo caso de arquivamento e tendo o investigado confessado formal e circunstancialmente a prática de infração penal sem violência ou grave ameaça e com pena mínima inferior a quatro anos, o Ministério Público poderá propor acordo de não persecução penal".
A lei determina que outros critérios devem ser atendidos para o acordo, como reparação de danos, prestação de serviços comunitários e pagamento de multa, entre outros.
A denúncia da segunda fase da operação indica que os pactos foram firmados em expedientes separados, sem as especificações das contrapartidas oferecidas por cada um deles. Na sua etapa mais recente, nesta semana, a Penalidade Máxima denunciou 16 pessoas, entre operadores e atletas, por práticas delituosas que interferiram em jogos da Série A do Campeonato Brasileiro de 2022 e de estaduais em 2023.
Confira as condutas imputadas aos jogadores que fecharam acordos com o MP-GO:
Nikolas Farias, lateral-esquerdo (Novo Hamburgo)
Em 11 de fevereiro, pelo Gauchão de 2023, em jogo contra o Esportivo, Nikolas concordou com promessa de R$ 80 mil em troca do cometimento de um pênalti, o que foi confirmado. Foram remetidos R$ 5 mil antecipadamente ao jogador.
A investigação detectou contatos entre o atleta e os operadores do esquema pelo WhatsApp. Houve até chamada de vídeo entre eles. Nikolas foi parabenizado pelos apostadores e recebeu a sinalização de mais ganhos futuros.
Nikolas deixou o Novo Hamburgo alguns dias depois deste lance. Ele está sem clube.
Jarro, atacante (ex-São Luiz e hoje no Inter-SM)
Em partida contra o Caxias, em 12 de fevereiro, pelo Gauchão de 2023, houve promessa de pagamento de vantagem de R$ 70 mil para que Jarro cometesse um pênalti no primeiro tempo da partida. A denúncia registra que o atacante recebeu R$ 30 mil em adiantamento na véspera do jogo, via pix feito pela esposa de um dos operadores do esquema. O fato é que Jarro efetivamente cometeu a penalidade no primeiro tempo de jogo, aos 17 minutos.
"Chama no green pai, ele já fez, ele já fez, vamooo (sic)", celebrou um dos operadores em mensagem de áudio localizada pela investigação.
Também houve comemoração pela confirmação do pênalti fraudulento em chamada de vídeo entre os operadores e o atleta. Em troca de mensagens de WhatsApp interceptadas pela investigação, um dos operadores afirma, efusivo, que Jarro é "muleque mil grau, muleque loucão (sic)".
Também foi registrado que os apostadores tiveram dificuldade em pagar todo o valor prometido a Jarro e chegaram a criar um grupo de WhatsApp chamado "Solução $".
Moraes, lateral-esquerdo (ex-Juventude e hoje na Aparecidense-GO)
Em jogo contra o Palmeiras, em 10 de setembro de 2022, Moraes aceitou proposta de R$ 30 mil para que fosse advertido com cartão amarelo durante a partida, o que efetivamente aconteceu. A denúncia do MP-GO registra que a quantia de R$ 5 mil foi entregue ao atleta antes do jogo, válido pela Série A do Brasileirão de 2022.
O fato seguinte ocorreu no dia 5 de novembro, em duelo contra o Goiás. A promessa foi de que o jogador receberia R$ 50 mil para que fosse punido com cartão amarelo no decorrer do confronto, fato que novamente se confirmou. A fatia de R$ 20 mil foi entregue antes da realização do jogo como adiantamento.
Kevin Lomónaco, zagueiro (Bragantino)
Em jogo contra o América-MG, pela Série A do Brasileirão, em 5 de novembro de 2022, Lomónaco aceitou promessa de pagamento de R$ 70 mil para que fosse penalizado com cartão amarelo. A advertência se confirmou. Kevin recebeu R$ 30 mil antes do jogo, registrou a denúncia do MP-GO.
Uma segunda proposta foi feita ao zagueiro argentino em jogo contra a Portuguesa, pelo Paulistão de 2023, mas ele, desta vez, recusou.