O ex-jogador de futebol Richarlyson Barbosa, 39 anos, assumiu sua bissexualidade em podcast produzido pelo GE e disponibilizado nesta sexta-feira (24). Durante a conversa, o multicampeão pelo São Paulo também falou sobre o preconceito que enfrentou durante a carreira.
Richarlyson contou que já se relacionou com homens e mulheres e que é muito seguro de sua sexualidade. De acordo com ele, a decisão de não ter assumido publicamente sua orientação sexual antes foi por medo do preconceito e por acreditar que sua declaração não mudaria a triste realidade que o mundo enfrenta com a homofobia.
— Infelizmente, o mundo não está preparado para ter essa discussão e lidar com naturalidade com isso — afirmou.
O ex-atleta relembrou que sua sexualidade foi pauta durante boa parte da sua vida, quando algumas pessoas o questionavam se ele era gay. Richarlyson confessou que esse tipo de questionamento constante o incomodava, mas que resolveu falar abertamente sobre o tema depois de conversar com pessoas que acreditavam que seu posicionamento fosse importante.
— Pelo tanto de pessoas que falam que é importante meu posicionamento, hoje eu resolvi falar: sou bissexual. Se era isso que faltava, ok. Pronto. Agora eu quero ver se realmente vai melhorar, porque é esse o meu questionamento.
Apesar de entender a importância da representatividade, o ex-jogador acredita que frente a tantas questões como o preconceito que leva à morte de pessoas LGBTQIA+, se rotular não parece ser o mais importante
— Sou um mero cidadão comum, que teve uma história bacana no futebol, mas eu não vou poder mover montanhas para que acabem esses crimes, para que acabe a homofobia no futebol — se posicionou.
Com a declaração, Richarlyson se torna o primeiro jogador que atuou na série A do Campeonato Brasileiro e na seleção brasileira a se assumir como integrante do movimento LGBTQIA+ e que falou abertamente sobre o assunto.
O caso mais famoso e recente do Brasil ocorreu em 2010 quando Messi, um goleiro da série D, que na época atuava no Palmeira de Goianinha, se assumiu como homossexual. Do ponto de vista mundial, também há poucos atletas do futebol que tenham falado abertamente sobre o tema.
Preconceito durante a carreira
Richarlyson conquistou diversos títulos, como uma Copa São Paulo, três estaduais, três Brasileiros consecutivos, duas Libertadores e um Mundial. Apesar disso, foi um dos jogadores que mais sofreu pressão da mídia e de torcedores para assumir sua sexualidade.
O ex-jogador também presenciou situações de preconceito durante sua trajetória. Na passagem pelo São Pualo, onde viveu o auge de sua carreira, chegou a ser ignorado pela torcida no momento em que ela gritava os nomes dos jogadores escalados para a partida.
— Eu não queria ser pautado por causa da minha sexualidade, de eu ser bissexual. Eu queria que as pessoas me vissem como espelho por tudo aquilo que conquistei dentro do meu trabalho. Eu nunca coloquei a minha sexualidade à frente do meu trabalho, e nunca faria isso — disse.
Processo contra homofobia
O debate em torno da sexualidade de Richarlyson começou em junho de 2007. Nessa época, José Cyrillo Júnior, então dirigente do Palmeiras, insinuou em rede nacional que o ex-atleta fosse gay. Por conta disso, o ex-jogador registrou uma queixa-crime contra o cartola, que posteriormente se desculpou em público.
O juiz responsável pelo caso, Manoel Maximiniano Junqueira Filho, acabou arquivando o processo e ainda alegou que "não seria razoável aceitar homossexuais no futebol brasileiro porque prejudicaria o pensamento da equipe". Na sentença, ainda foi citado que futebol é coisa de macho, não de homossexual.
— Ser homossexual não é demérito para ninguém, e no futebol não deveria ser um assunto tão polêmico. Nunca deixei que isso atrapalhasse o que eu quero para minha vida, não vai ser uma frase, uma palavra, uma discussão ou um cara babaca que tentou de forma vulgar maltratar uma classe… Pelo amor de Deus, quanto sofrimento tem na classe LGBTQIA+ — afirmou.
Para o ex-atleta, é importante também ter o apoio dos colegas da equipe e de outros setores para que o combate ao preconceito seja mais efetivo.
— Os próprios jogadores têm que se posicionar melhor sobre a situação, especialmente os héteros. Não é questão de vestir a camisa com um arco-íris. É, quando acontecer essa situação de homofobia, sair de campo. "Espera aí, a torcida não está respeitando o meu companheiro ou meu adversário como ser humano? Então, eu não vou voltar a jogar" — exemplificou.
Apoio familiar
De acordo com Richarlyson, sua orientação sexual nunca foi questionada pela família e ele jamais enfrentou preconceito dentro de casa.
— Só falei abertamente com a minha mãe sobre a minha sexualidade. Meu pai (o ex-atacante Lela) e meu irmão (o atacante Alecsandro) vão saber pelo podcast — contou.
O ex-jogador também ressaltou que sua educação é fruto de uma formação rígida e de muito respeito que seus familiares lhe proporcionaram. Ele acredita que por conta disso, ele tenha tido força e coragem para enfrentar todos obstáculos que enfrentou ao longo de sua trajetória.