A movimentação política de um grupo de deputados estaduais recolocou em debate a regra que proíbe a venda de bebidas alcoólicas em estádios no Rio Grande do Sul, deixando de lados opostos da mesa autoridades ligadas à segurança e clubes de futebol. Em reunião sobre o tema na Assembleia Legislativa, a Brigada Militar (BM) e o Ministério Público (MP) defenderam que a regra atual seja mantida, enquanto os clubes da Capital e do Interior pressionam os deputados pela liberação do álcool nos estádios.
Na avaliação da BM, responsável pelo policiamento dentro e fora dos estádios, a segurança durante os jogos de futebol aumentou desde que o consumo de álcool foi proibido, mudando inclusive o público frequentador.
– A bebida ausente no período das duas horas que o indivíduo permanece nas arenas nos permite concluir que há melhora do ambiente, que nos permitiu trazer (para os estádios) famílias, ver mais mulheres nos estádios. A volta do álcool redundaria em um problema da diminuição da qualidade ambiental que observamos desde a proibição – destacou o capitão Gustavo Prieto, representando o Comando-Geral da Brigada Militar em audiência pública, na Assembleia Legislativa.
O Comando da BM calcula que a proibição de álcool nos estádios somada à modernização dos estádios permitiu reduzir em cinco vezes a quantidade de policiais nos jogos. Mesmo que parte dos torcedores consumam álcool antes e depois dos jogos, argumenta Prieto, as duas horas de abstinência durante os jogos são suficientes para reduzir situações de conflito.
— Hoje a Brigada consegue fazer jogos com uma quantidade que fica em torno de um quinto do efetivo que era necessário antes da proibição do álcool e outras inovações legislativas e estruturação de estádios. Com a volta do álcool, nosso temor é que precisemos manejar mais efetivo — acrescentou Prieto.
Durante a audiência pública, realizada na segunda-feira (23), na Assembleia Legislativa, o presidente da FGF, Luciano Hocsman, destacou que os clubes consideram tanto a questão da segurança pública, quanto elementos econômicos, desportivos e de entretenimento.
— Os nossos clubes, independentemente do tamanho dos seus estádios, estão cientes e preparados para fiscalizar e também fazer cumprir essa regulamentação responsável do consumo e comercialização nos estádios — disse Hocsman.
A dupla Gre-Nal está conjurada no debate e argumenta que a mudança na legislação favoreceria o ingresso antecipado dos torcedores, evitando aglomerações nos minutos que antecedem os jogos. Inter e Grêmio também alegam que não terão impacto financeiro direto com a liberação, uma vez que a venda de bebidas no Beira-Rio e Arena são feitas por terceiros.
— Aqui se bebe na esplanada, nos churrascos da volta, no entorno, todo mundo se reúne para confraternizar. E sempre (os torcedores) chegam faltando meia hora para o jogo e é uma acumulação de pessoas com dificuldade de acesso ao estádio — disse o presidente do Grêmio, Romildo Bolzan Jr.
O Inter também disse acreditar que há uma mudança de comportamento do torcedor nos últimos anos.
— Hoje o torcedor também tem a exata noção do reflexo que o seu descumprimento pode gerar com o clube. É um efeito social que precisa ser levado em consideração — disse José Olavo Bisol, da assessoria da Presidência do Inter.
Clubes do Interior, para os quais o comércio de bebidas tem maior relevância no fluxo de caixa, também endossam a mudança.
— Ficamos com o ônus e perdemos o bônus: o pessoal bebe lá fora e vai fazer baderna lá dentro (do estádio). Então, não temos o bônus de estarem bebendo dentro — apontou Everton Giovanella, presidente do Esporte Clube Lajeadense.
A proibição de bebidas em estádios entrou em vigor em 2008. Em 2018, a Assembleia Legislativa aprovou uma proposta para liberar o consumo nos espaços das torcidas, mas o texto foi vetado pelo então governador Eduardo Leite, seguindo as recomendações dos órgãos de segurança.
Para o Ministério Público, contrário à liberação, não há mudança de cenário que justifique a reanálise do tema. O promotor Márcio Bressani, assessor do Conselho Superior do MP, sugeriu que, antes de uma eventual flexibilização, os clubes deveriam promover uma mudança na relação com os torcedores que praticam atos ilegais ou inconvenientes.
— Na NBA, por exemplo: os torcedores tomam cerveja na beira da quadra. Mas o que acontece lá? Se qualquer integrante da disputa esportiva reclamar da atitude de um torcedor, essa reclamação é apurada e o torcedor é banido das arenas. Banido não significa se apresentar na delegacia. Significa que a entidade esportiva é responsável por nunca mais deixá-lo entrar — disse o promotor, acrescentando:
— O que estamos dispostos a fazer por essa pretensa liberdade? Estamos dispostos a tomar as atitudes?
O debate voltou à baila nos últimos dias, com a mobilização dos deputados que assinam o projeto de lei PL 466/21. O projeto, de autoria dos deputados Giuseppe Riesgo (NOVO), Fábio Ostermann (NOVO), Gaúcho da Geral (PSD), Marcus Vinícius (PP), Sérgio Turra (PP) e Gerson Burmann (PDT) ainda aguarda análise da Comissão de Constituição e Justiça da Assembleia. O texto prevê que as bebidas vendidas em estádios gaúchos não poderiam ultrapassar os 14% de teor alcoólico.