A menos que haja uma guinada digna dos filmes mais bregas de Hollywood, a carreira de Ângelo Stulp, 26 anos, acabou no futebol. Meia formado pelas bases de Grêmio e Novo Hamburgo, ele era figurinha carimbada no Interior nos últimos anos. Andou por Aimoré, Guarany-Ba, Bagé, São José, Inter-SM e estava no União-FW em sua última tentativa de seguir jogando bola.
Colecionou acessos por Bagé (da terceira para a segunda divisão estadual) e São José (da Série D para a C nacional), andou por Santa Catarina, no Metropolitano, e estava no norte gaúcho quando sentiu que havia chegado ao fim da linha.
Ao ser avisado de que estava liberado de Frederico Westphalen para ir para casa, tinha noção de que poderia não voltar mais. Inicialmente, era para ser um período curto, de cinco dias que passaria em Novo Hamburgo, cidade onde mora com a mulher e um filho, de dois anos.
— Mas foram adiando, adiando. Quando vi, estava no plano de auxílio emergencial do governo. A situação apertou de vez, então procurei um amigo, que é dono de uma imobiliária e tinha me oferecido emprego. Ele me chamou e comecei a trabalhar. Sempre joguei bola, nunca tinha feito nada disso. Só que a necessidade faz a gente aprender — explica o agora corretor Ângelo.
Adaptou-se rapidamente à nova função, fez uma carteira de clientes e agora não pensa mais em voltar, já que sua mulher também tem emprego na cidade. Segundo ele, o salário é o dobro do que costumava receber no futebol. Isso ficando em casa, perto da família, sem a incerteza dos atrasos de salário e a oscilação de renda de um semestre para o outro, realidades comuns em clubes.
Sem contratos longos, jogadores costumam atuar em um time em Gauchão ou Divisão de Acesso e mudar de cidade para a disputa da Copinha. Cada competição com realidades financeiras diferentes. Mesmo que não seja mais a profissão, o futebol ainda é sua paixão, que também está sendo atrapalhada pela pandemia. Ângelo já sabe o que vai fazer quando a situação melhorar:
— Estou louco para jogar bola.
Mas, agora, só pelo divertimento e pela adrenalina. Seu negócio é vender imóveis.
* Colaborou Eduardo Castilhos, jornalista de GZH