PARIS – Os quatro mosqueteiros do tênis francês demonstraram suas habilidades no esporte em alguns lugares pouco convencionais, incluindo deques de navios de cruzeiro enquanto cruzavam o Atlântico ou o Pacífico a caminho de competições internacionais.
Contudo, esses grandes jogadores, cujo brilhantismo há muito tempo deu origem à necessidade da construção do Estádio Roland Garros, em 1928, nunca jogaram em uma quadra parcialmente rebaixada e rodeada por estufas.
Agora, seus sucessores têm essa chance, com a inauguração da quadra mais recente e iconoclasta do Aberto da França. "Ela nos dá mais espaço e, ao mesmo tempo, algo singular", comentou Gilles Jourdan, gerente do projeto de modernização do estádio.
As autoridades parisienses e os vizinhos afluentes de Roland Garros resistiram por muito tempo à construção dessa quadra no sereno jardim botânico de Serres d'Auteuil, adjacente ao local do torneio.
Quando você coloca os pés em um jardim no meio de Paris, vai enfrentar muita gente contrária ao projeto.
MARC MIMRAM
arquiteto
Mesmo após a prefeita Anne Hidalgo ter concedido aprovação para a quadra, grupos ecológicos franceses travaram uma guerra legal que atrasou a construção em muitos anos. "Quando você coloca os pés em um jardim no meio de Paris, vai enfrentar muita gente contrária ao projeto", declarou recentemente Marc Mimram, arquiteto da nova quadra, a repórteres franceses.
Mas a quadra da estufa, oficialmente batizada em homenagem à antiga campeã francesa de simples Simonne Mathieu, está agora concluída. O que representa um significativo contraste com outras partes de Roland Garros, incluindo a quadra principal, Philippe Chatrier, que foi quase completamente demolida e reconstruída no ano passado para receber a instalação de uma cobertura a tempo do torneio de 2020.
Após um esforço final para limpar o entulho e cobrir espaços expostos, a esperança dos organizadores é que nem o público nem os jogadores percebam que o projeto ainda não está finalizado.
"Os britânicos e os anglo-saxões têm uma boa expressão", ensinou Jourdan enquanto caminhava sob cabos dependurados e tetos inacabados. "Eles dizem que são como patos: acima da superfície da água parecem calmos e contidos; abaixo dela, movem os pés que nem loucos, mas sem ninguém perceber. Essa é a ideia para nós este ano."
De fato, tem sido uma corrida contra o relógio, não diferente da que aconteceu em 1928 quando Roland Garros foi construído.
A primeira vitória da França em uma Copa Davis em 1927 sobre Bill Tilden e os Estados Unidos, na Filadélfia, foi o capítulo de maior importância da história esportiva da França. Os jogadores franceses, conhecidos como os mosqueteiros – René Lacoste, Henri Cochet, Jean Borotra e Jacques Brugnon –, exigiram, então, um local apropriadamente grandioso para receber a Copa Davis na França, pela primeira vez, em 1928.
Roland Garros foi terminado no limite do prazo. "Definitivamente, podemos traçar alguns paralelos", concordou Jourdan.
Desde então, o complexo vem crescendo vertiginosamente: a quadra nº 1 foi concluída em 1980, e a Quadra Suzanne Lenglen, a segunda maior, em 1994. Mas o projeto de renovação e expansão corrente é o mais expressivo desde a inauguração do complexo.
O objetivo não é apenas oferecer um teto e garantir jogos em dias de chuva, mas também proporcionar mais espaço para os espectadores. Os corredores abarrotados de Roland Garros podem se assemelhar a uma plataforma do metrô em horário de pico. Colocar a terceira maior quadra do torneio no jardim botânico foi, em parte, para dispersar a multidão: agora, quase um quilômetro separa uma quadra da outra.
A nº 1 será demolida após a competição deste ano para dar lugar a um grande gramado para o público, que também poderá servir como uma área de espera entre as partidas do dia e da noite que estão programadas para começar em 2021.
Não restou muita coisa capaz de fazer alguém se lembrar de 1928. Uma rara exceção é o solo da quadra Philippe Chatrier. "É o mesmo chão que estava lá no começo; não escavamos nada. O suor do sr. Lacoste continua ali embaixo", declarou Jourdan, enquanto olhava para o retângulo vermelho.
Mas o estádio que emoldura o retângulo foi transformado: ganhou amplitude e iluminação, cadeiras dobráveis feitas de madeira castanho-claro substituíram as verdes, de plástico, e os ângulos acentuados das fileiras superiores deram lugar a curvas.
Durante uma visita ao local no dia 10 de maio, enquanto os operários da obra batiam em coisas e corriam para dentro e para fora da quadra Chatrier, a Simonne-Mathieu era um oásis vermelho de tranquilidade.
O tênis moderno começou como uma diversão nas festas ao ar livre no século XIX. Há quadras em locais arborizados, incluindo a do Central Park, em Nova York, a dos Jardins de Luxemburgo, do outro lado de Paris, e as do All England Club, que abriga o torneio de Wimbledon.
Entretanto, nunca houve um acontecimento como esse no tênis profissional. Após caminhar por uma ruela de paralelepípedos entre construções elegantes de pedra de calcário, que datam de 1898, chega-se a uma quadra rodeada por quatro estufas conectadas, cada uma contendo plantas de um continente diferente. "África ao sul, Ásia ao leste, Oceania ao norte e a estufa das Américas a oeste", listou Paul Guillou, diretor do jardim.
Sendo o tênis um esporte global, a ideia foi criar um tour mundial botânico ao redor da quadra. Aproximadamente 500 espécies diferentes foram plantadas. As estufas também receberam elementos ornamentais, como pontes de pedras para pedestres e cachoeiras em miniatura.
Com o intuito de preservar a flora, o público não poderá visitar as estufas durante o campeonato. Mas o interior delas é claramente visível através do vidro enquanto se caminha em direção às arquibancadas. Além disso, elas ficarão abertas a todos durante o restante do ano, de graça.
O cenário e o conceito impressionam, mesmo se dificilmente tivermos a sensação de estar assistindo a uma partida de tênis de dentro de uma floresta tropical após o início do jogo. Uma vez dentro do estádio, quase não se veem as estufas da maioria dos assentos, obstruídas, em grande parte, pelas fileiras superiores das arquibancadas e os bancos de madeira.
Desse ponto de vista, com jogadores deslizando e golpes de fundo voando, a Mathieu se parece com uma quadra convencional, o que não deixa de ser um pouco decepcionante.
Durante o torneio, os espectadores e o público em geral terão acesso às áreas históricas do Serres d'Auteuil, incluindo as estufas do século XIX, consideradas monumentos nacionais.
Por Christopher Clarey