Catarinense de Pouso Redondo, Francisco Novelletto Neto cumprirá em 31 de dezembro o seu último dia como presidente da Federação Gaúcha de Futebol. Deixará a centenária entidade após 16 temporadas no comando do futebol do Rio Grande do Sul. Em 2004, assumiu a gestão em sucessão à Emídio Perondi. Aos 65 anos, Novelletto foi empossado vice-presidente da CBF. Com bom trânsito entre dirigentes de diversas confederações, não esconde que sonha fazer de seu ingresso na CBF uma ponte para a eleição à Conmebol, em 2025.
— Estarei com 70 anos e cheio de vontade. A Conmebol nunca foi presidida por um brasileiro. Por que não eu? — questiona Novelletto.
Durante todo o seu mandato, Francisco Novelletto teve contra si críticas sobre ser colorado (hoje, é conselheiro licenciado do Inter). Pontua que jamais deixou o coração falar mais alto nestes anos de comando na FGF, e brinca:
— Desde 2017, quando não aceitei mudar o regulamento do Gauchão para que o Inter inscrevesse um quarto goleiro, passei a ser "gremista".
Na entrevista, Noveletto revela que quer ver Grêmio ou Inter vencendo o Campeonato Brasileiro em 2019. Alega que é o único título que falta à sua gestão, depois de ver a Dupla ganhar todos os outros grandes campeonatos: Mundial, Libertadores, Copa Sul-Americana, Recopa Sul-Americana e Copa do Brasil.
Quando perguntado sobre se deseja candidatar-se à presidência do Inter, Novelletto surpreende com a resposta:
— Eu tenho medo. Tenho medo de, em quatro ou cinco anos, transformar o Inter em um Barcelona.
Confira os principais trechos da entrevista:
O que lhe pareceu a final da Arena e o Gauchão como um todo?
Conheço o Gauchão como torcedor, desde 1975, como dirigente de clube (foi presidente do São José), e como presidente da FGF. De lá para cá, tivemos uma mudança da água para o vinho. Foi através do profissionalismo que conseguimos chegar até aqui. Vibro muito a cada final de campeonato porque deu certo. E a cada ano melhora. E fico triste. Como vou fazer para que o do ano que vem seja melhor? Tivemos um jogo que mais parecia uma final de Libertadores na Arena, tamanha alucinação e adrenalina. Tivemos 100 mil torcedores em dois Gre-Nais. Ano que vem, porém, as datas dos Estaduais serão ainda mais enxugadas. Brinquei, no começo do campeonato, que teríamos a Champions League aqui. E tivemos um grande Gauchão.
Para o ano que vem, a dupla Gre-Nal poderá entrar apenas nas finais do Gauchão?
A TV quer jogos mais emocionantes para renovar o contrato do Campeonato Gaúcho, e entende que a nossa fórmula atual é a pior do Brasil. Eles querem vender pay-per-view. Vou propor aos clubes que os times das Séries A e B entrem mais tarde no campeonato. Grêmio, Inter e Brasil-PEL seriam separados dos demais nove clubes. Estes nove clubes jogariam a partir do começo de fevereiro. Passariam cinco times, que se juntariam aos três. Teríamos duas chaves com quatro equipes, com os times de uma chave enfrentando os da outra em turno e returno. Daí, sairiam dois de cada chave para as semifinais. Teríamos, no mínimo, dois Gre-Nais já garantidos. Justamente o que a TV quer para ter um campeonato mais atrativo.
O que te pareceu a atitude do Inter de deixar a taça e as medalhas de segundo lugar no gramado?
Mandei uma mensagem pra o Melo (Roberto Melo, vice de futebol Inter). A gente briga, mas a gente se ama. Eu disse sobre isso: "Que feio, que feio, que feio, Melo". Mas isto não é algo inédito. Quem perde faz isto. O Grêmio já me deixou plantado com cara de tacho esperando para entregar taça de vice e ninguém apareceu. É lamentável, mas não é só culpa do Inter. Já aconteceu várias vezes.
Como o senhor avalia a utilização do VAR na final (o pênalti para o Grêmio, nos 90 minutos, defendido por Lomba, foi marcado pelo árbitro de vídeo)?
O futebol é mais emocionante e gera mais debate sem o VAR. O VAR torna o jogo artificial. Mandei mensagem puteando o Gaciba (o ex-árbitro Leonardo Gaciba, novo chefe de arbitragem da CBF): "Tem que reduzir este tempo de análise". Se dependesse de mim, não teria VAR. Sou anti-VAR. Achei que o VAR fosse um programa, que visse o lance e já o analisasse. Mas é a análise de um juiz. O que mudou? Seis por meia-dúzia. Segue sendo uma análise subjetiva, definida por um árbitro. Pode haver interesses. Sou contra o VAR.
Como é conviver com as crítica de ser ora "colorado", ora "anti-colorado", dependendo da fase e das reclamações de Grêmio ou de Inter?
Atualmente, dizem que sou gremista. Aqui, é oito ou 80. Ou se faz tudo ou não se faz nada. O que o Inter me pediu, retirar o julgamento do Nico López da pauta antes do Gre-Nal (da fase classificatória), nem a minha mãe se me pedisse levaria. Não tinha como fazer aquilo. Por outro lado, como tudo tem dado certo para o Grêmio nos últimos anos, ele não precisa do Novelletto para repassar as responsabilidades. A FGF é o bode expiatório. São todos iguais: Inter, Grêmio, São José, todos os clubes do Interior. Eles precisam repassar. E quando a coisa aperta, é pau na Federação. Já me disseram: "Novelletto, é muita pressão. Por isto, de vez em quando temos que dar uma 'botadinha' em ti". O único presidente de clube que nunca arrumou bronca com a Federação virou presidente da Federação Gaúcha de Futebol: eu. Quando presidi o São José.
A escalação do Jean Pierre Lima para apitar a final te preocupou?
Muito. Por justiça, ele foi para o sorteio. Fez um grande campeonato ano passado. Eu quis que ele fosse para o sorteio (com Vuaden e Daronco). Quando saiu ele, a imprensa começou a bater muito, que temos um árbitro Fifa (Daronco) e não será ele a apitar. Ainda quero saber, vou investigar se estas críticas foram lobby. Fiquei preocupado que se deixasse abalar pelas críticas, mas os quatro árbitros foram muito bem no clássico. Desci para cumprimentá-los antes das penalidades. Houve maldade de certas pessoas, me criticaram por ter feito isto. O que eu faria? Mandaria marcar impedimento no pênalti? .
Depois das penalidades, os quatro deixaram o campo chorando, pelas críticas injustas que sofreram antes do jogo, e pela pressão. Me arrepiei ao vê-los às lágrimas. Estavam emocionados.
FRANCISCO NOVELETTO
Presidente da FGF
Após o Gre-Nal, houve uma pergunta na coletiva do vice de futebol do Inter, Roberto Melo, na qual o repórter perguntou como ficaria a FGF em 2020, com a saída de um colorado (Novelletto) e o ingresso de um gremista (Luciano Hocsman) na presidência.
Em todas as áreas há gente sem noção. Foi uma pergunta sem noção alguma. O Roberto Melo voltou a reclamar que a FGF não permitiu a inscrição de um quarto goleiro no Gauchão. Dois anos depois! Como é que eu faria isto, rasgaria o regulamento? Só seu eu fosse um monstro se colocasse o coração na FGF. O ser humano que entra para trabalhar no futebol deixa de ser torcedor. Eu não conhecia o Romildo (presidente do Grêmio, Romildo Bolzan Júnior). Hoje, somos amigos. Mas, no começo de sua gestão, ele me deu muito pau. Muito mesmo. E disse que, lá atrás, em 2015, que me criticou severamente porque precisava dar uma justificativa para a torcida. No Barranco, após a conquista do Gauchão, ele me viu e gritou: "O Novelletto é um cara justo, é um cara justo". E diz que me leva de "rédeas curtas". É corneta, mas é um grande amigo. Eu olho no fundo do olho de qualquer gremista. A chance de eu ter feito algo contra o Grêmio é -1. Na minha família, me criticam porque dizem que deixei de ser colorado.
O senhor é conselheiro licenciado do Inter. Agora, fora da FGF, não sonha ser presidente do clube?
Eu tenho medo. Medo de uma coisa. Sabe por que não está nos meus sonhos ser presidente do Inter? Tenho medo de, em quatro ou cinco anos, transformar o Inter em Barcelona. Eu consigo. Sou muito caxias com as coisas dos outros. Nem a minha mãe levaria vantagem.
Barcelona?
Exatamente. Tenho gestão. Sou um cara econômico, o dinheiro na minha mão rende, triplica, se quadruplica. Aí, comigo na presidência, eu transformaria o Inter num Barcelona mesmo. O jogador pede R$ 500 mil porque sabe que vão atrasar salário. Eu ofereceria R$ 250 na mão, em dia. É questão de ver a oportunidade e de se fazer bons negócios. Mas ser presidente do Inter não faz parte dos meus planos. Ser vice da CBF é uma grande chance.
Por quê?
Porque acho que, por questão de justiça, a Conmebol precisa ter um presidente brasileiro. Nunca houve um.
E o senhor pretende se candidatar?
Me relaciono muito bem com os três últimos presidentes da Conmebol. Converso toda a semana com Alejandro Domínguez (o atual presidente da entidade). Ele tem mais uma gestão, até 2025. Depois, com o aval da CBF, entendo que possa ser indicado à sucessão. A CBF é uma porta de entrada para isto. Estarei com 70 anos.
Quando o senhor vai indicar o vice Luciano Hocsman à sucessão?
Em maio. Pela lei, é até 30 de junho. Não acredito que haja oposição. Luciano está comigo há 16 anos, como vice. É um cara honesto e decente. Ninguém conhece tão bem a FGF como ele. Eu vou me afastar ao final do ano.
Como o senhor pode ajudar o futebol gaúcho como vice da CBF?
Eu trouxe a Copa América para o Rio Grande do Sul. Teremos jogando aqui a Seleção Brasileira, o Uruguai do Suárez, a Argentina do Messi, o Peru com Guerrero, além de Venezuela, Japão e Catar. E ainda teremos, antes da Copa América, um amistoso da Seleção. Por enquanto, não há adversário. Vou sugerir Brasil x Seleção Gaúcha, um combinado da dupla Gre-Nal com jogadores do Interior.
E quando teremos uma final única da Libertadores em Porto Alegre?
Se eu aperto o Alejandro, River x Boca tinha sido em Porto Alegre, e não em Madri (na final da Libertadores de 2018, disputada no estádio do Real Madrid). Mandei de sacanagem uma mensagem para ele, sugerindo trazer para cá. Agora, teremos a final única aqui, em algum momento. A primeira será no Chile e, acho que a do ano que vem será no Maracanã. Um dia ela vem. Mas moramos em uma aldeia, onde nem todos pensam grande.
O Grêmio terá mais uma decisão difícil pela frente na Libertadores, nessa terça-feira. O senhor acredita na classificação?
Ao final, os dois passarão. Inter e Grêmio. Mas eu só tenho um desejo: ganhar o Brasileirão. Ganhei todos na minha gestão na FGF: de Mundial à Recopa Sul-Americana, passando por Copa do Brasil e três Libertadores. Só me falta o Brasileiro. Agora, vou pegar os dois (Renato e Odair) e vou forçar a barra: quero o Brasileirão. Vou fazer uma pressãozinha: ou ganham o Brasileiro ou seco vocês na Libertadores e na Copa do Brasil. Vou pedir encarecidamente a eles. Preciso de um Campeonato Brasileiro para encerrar a gestão.
Nesta segunda-feira, Novelletto participou do programa Timeline, da Rádio Gaúcha, ouça a entrevista na íntegra: