Se a vontade do presidente da Fifa, Gianni Infantino, prevalecer, os Mundiais de Clubes se tornarão algo muito semelhante à Copa do Mundo. De quatro em quatro anos, vinte e quatro equipes se reuniriam em um país-sede para a disputa do torneio, que deve se tornar ainda mais difícil de conquistar para os sul-americanos. Na proposta de Infantino, a competição teria 12 dos superpoderosos clubes europeus (a América do Sul teria cinco equipes).
A ideia do dirigente é fazer com que o torneio substitua a Copa das Confederações, que seria extinta. Serviria como teste das instalações para a Copa do Mundo do ano seguinte. Seriam oito grupos de três, sendo que apenas o campeão iria adiante, para as quartas de final. A primeira edição do novo Mundial seria em 2021, mas devido ao calor sufocante do Catar no meio do ano, haveria uma exceção à regra de servir como evento-teste da Copa. Rumores apontam a possibilidade da China receber a competição. Quanto ao atual formato do Mundial, o de 2018 está garantido, já que os contratos comerciais já foram firmados. Não se pode falar o mesmo das temporadas seguintes.
— A busca de sedes e patrocínios para 2019 já havia iniciado e o Infantino pediu para que esse processo parasse — destaca Jamil Chade, correspondente do jornal Estadão na Suíça.
Curioso é que são justamente os europeus, beneficiados com metade das vagas do novo torneio, os mais ferrenhos opositores da nova fórmula. Os presidentes de federações nacionais e a Uefa, entidade que rege o esporte no Velho Continente, querem ter liberdade em seu calendário. Preferem o formato antigo do que se chamava de Copa Intercontinental, com apenas um jogo contra o adversário da América do Sul. Há, inclusive, uma movimentação para retomar o jogo único em 2019. Fora o aspecto esportivo, um componente político é outro empecilho.
As entidades temem que os gigantescos clubes estreitem relações ao conviverem nessas competições — imaginam que os participantes não variem tanto, dado que há uma elite bem estabelecida na hierarquia do futebol de lá. Assim, estaria aberto o caminho para a criação de uma liga de clubes do continente, o que poderia desbancar, por exemplo, a Uefa. Logo que Infantino deu declarações que davam ideia da nova fórmula do torneio, vieram os protestos.
— Os jogadores precisam de descanso e tempo de recuperação em junho. A Fifa deveria se focar nas competições de seleções — reclamou o presidente da Federação Alemã, Reinhard Grindel.
Diante da insistência de Infantino, porém, as negociações se iniciaram. Os donos dos maiores orçamentos do futebol mundial pensam em barganhar, em pedir vantagens à Fifa em troca da chancela ao novo Mundial. Uma das moedas poderia ser a flexibilização da necessidade dos clubes liberarem jogadores para a disputa dos Jogos Olímpicos. O consenso entre as partes é de que o Mundial tem de mudar.
— É uma competição que não tem audiência. Mais do que isso, não há interesse suficiente. À exceção dos sul-americanos, não há torcedores que viajam para acompanhar seu time no Mundial — lembra Chade.
A intenção de Infantino é incluir o Mundial em um amplo pacote de transformações do futebol que pretende anunciar em março. O dirigente não se conforma com o fato de que o esporte mais popular do mundo não consegue faturar tanto quanto ligas norte-americanas como a NFL, de futebol americano, e a NBA, de basquete. As mudanças agitam o cenário político do futebol, ao mesmo tempo em que expõem a fragilidade dos dirigentes sul-americanos após os escândalos de corrupção.
Recentemente, os europeus acenaram com a ideia de uma liga de seleções da Europa, que seria disputada nas datas hoje reservadas a amistosos. Os outros continentes, incluindo a América do Sul, chiaram. Como preparar suas seleções sem disputar jogos contra europeus durante quatro anos? Qual seria o interesse comercial de amistosos contra adversários de menor porte?
Os protestos abriram mais negociações, desta vez com a possibilidade de ampliar a liga europeia para uma liga mundial de nações. Os europeus fizeram a concessão de conversar, mas mostraram sua força ao indicar que, dada a oportunidade, fechariam-se dentro do próprio continente, com consequências possivelmente desastrosas para a Conmebol e suas filiadas. A debilidade política que se vê no episódio da liga de nações encontra eco na queda de braço do Mundial de Clubes.
— Os sul-americanos querem algum espaço nessa negociação. Que tenham mais clubes no novo formato, por exemplo. Mas é uma diferença gigantesca, que também é financeira. O Grêmio ganhou US$ 3 milhões (R$ 9,96 milhões) de premiação pelo título da Libertadores. O prêmio do Real pela Liga dos Campeões, sem contar os direitos de televisão, foi de 57 milhões de euros (R$ 224,67 milhões) — ressalta Chade.
O abismo nos orçamentos, que tem se mostrado em campo a cada edição do atual Mundial, tende a ficar ainda mais evidente. Para um sul-americano, não bastaria uma façanha de bater um dos gigantes europeus. Teria de passar por vários deles para conquistar o título. Seria uma missão quase impossível. Ainda assim, há quem veja com bons olhos a ideia de Infantino.
— Eu gosto do atual Mundial, acho uma fórmula interessante. Esta ideia da Fifa é de difícil execução por conta do calendário, mas não dá para negar que seria um baita evento — avalia Lédio Carmona, comentarista dos canais SporTV.
O NOVO MUNDIAL EM 2021
24 participantes
12 europeus
— Finalistas das quatro últimas edições da Liga dos Campeões
— Quatro melhores do ranking da Uefa
5 sul-americanos
— Campeões das quatro últimas edições da Copa Libertadores (o Grêmio estaria garantido)
— Melhor colocado no ranking da Conmebol
2 asiáticos
2 africanos
2 da Concacaf
1 representante do país-sede