Assisti ao primeiro jogo da final da Libertadores na primeira fileira da cadeira gold da Arena no meio de vários homens. Eu nunca tinha testemunhado uma partida neste setor e me surpreendeu a pouca presença feminina perto daqueles tantos rostos masculinos. Como eu estava sozinha, comecei a reparar na forma e nos substantivos que aqueles homens usavam para xingar o juiz, o jogador, o rival e até a turma que resolveu brigar no setor abaixo. Qualquer pessoa que já tenha assistido a uma partida dentro de um estádio sabe que o árbitro é filho da p. Que o jogador é corno; se "fingir" uma falta e ficar mais de vinte segundos no chão, a torcida chama de viado, bicha ou guriazinha.
Não foi nada surpreendente constatar que todas as palavras proferidas eram, de alguma forma, machistas ou homofóbicas. Tentei ao máximo ignorar e seguir assistindo a meu jogo. Chorei quando, finalmente, o Cícero fez aquele gol e, depois de 60 minutos de partida, consegui convencer o cara do meu lado que, nossa, como pode, eu até entendia de futebol! Mas tudo aquilo ficou martelando na minha cabeça.
Nos últimos finais de semana, tive a chance de cobrir os dois jogos da final do Gauchão Feminino. Estava empolgada para ver jogadoras, árbitras, treinadoras. Todas mulheres, em campo. Na minha cabeça, aquele machismo todo que eu estava acostumada a presenciar nos estádios não ia se repetir. Deve existir um certo respeito àquelas 30 mulheres, certo? Mero engano. Continuava lá.
Jogadoras eram vagabundas, marias-chuteira, filhas da p. e por aí vai. Não podiam errar nada ou a torcida mandava sair do campo e ir lavar uma louça, afinal, é só isso que mulher sabe fazer, né? As árbitras eram chamadas de leitão, balofa ou estavam com os cartões perdidos no sutiã. Que enorme pecado é jogar futebol e não se encaixar no padrão de beleza absurdo da sociedade.
Por mais decepcionada que eu tenha ficado, ver aquelas meninas comemorando um título tão suado e desejado foi uma injeção de vida em mim. O quanto aquelas "vagabundas" batalharam com pouco investimento pra jogar bonito daquela forma deveria encher qualquer pessoa de orgulho. A nossa sociedade é muito machista e não está pronta para a grandeza dessas jogadoras. E é uma pena que o futebol, esse esporte tão bonito, seja o reflexo dessa sociedade doente.